Falsas e antigas promessas de desenvolvimento têm sido argumento para convencer a população a aceitar a construção do Complexo Hidrelétrico Tapajós. O projeto ameaça pelo menos 32 comunidades, além de dois mil quilômetros de território indígena.
Na região Oeste do Pará, povos, territórios, etnias e culturas diferentes enfrentam um problema em comum: o projeto do Complexo Hidrelétrico Tapajós. Os planos para construção de sete usinas hidrelétricas, a partir de barragens no rio Tapajós e Jamanxim, ameaçam pelo menos 32 comunidades, além de dois mil quilômetros de território indígena, principalmente da etnia Munduruku.
Para debater acerca das diversas violações de direitos causadas pelo avanço do projeto de construção das hidrelétricas, além da expansão do agronegócio e da exploração mineral na Amazônia, mais de 20 organizações, vindas de 10 diferentes municípios do Oeste do Pará, se reuniram no seminário regional “Desenvolvimento e Direitos Humanos na Amazônia”. A atividade foi realizada nos dias 22 e 23 de março, no município de Itaituba/PA, pela Terra de Direitos, em parceria com o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB e Comissão Pastoral da Terra – CPT.
Falsas e antigas promessas de desenvolvimento, oportunidades de trabalho e melhorias nas condições de vida têm sido utilizadas como argumento para convencer a população a aceitar a construção das hidrelétricas. “A barragem é anunciada como um processo de desenvolvimento e como a redenção dos problemas enfrentados pelas comunidades. As empresas se aproveitam da ausência de políticas públicas, utilizam isso como instrumento a seu favor”, afirma o integrante da coordenação nacional do MAB no Pará, Iury Paulino. Os responsáveis pelo projeto são Eletrobrás – Centrais Elétricas Brasileiras S/A, Construções e Comércio Camargo Côrrea S/A, Eletronorte – Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A, e EDF Consultoria em Projetos de Geração de Energia Ltda.
Os ribeirinhos da comunidade Pimental não aceitam o discurso de enaltecimento dos benefícios trazidos pelas hidrelétricas. Eles vivem na região onde se pretende cravar o canteiro de obras da São Luiz do Tapajós, a primeira das sete usinas previstas no complexo, e que já está em fase de estudos ambientais. Com potência prevista em 6.133 MW e 39 metros de altura, a usina formará um reservatório de 722,25 km2. “Não tem dinheiro que pague a convivência na nossa comunidade. O desenvolvimento que nós precisamos é energia, melhorias na saúde , na educação, mas não é preciso hidrelétrica no Tapajós para termos tudo isso”, garante Luiz Matos de Lima, liderança comunitária de Pimental.
Para a assessora jurídica da Terra de Direitos em Santarém/PA, Érina Gomes, um dos principais desafios da resistência à construção do complexo hidrelétrico é romper com a histórica prática da “troca do espelhinho”, que restringe os direitos da população a benesses do estado e das empresas. Segundo a advogada, a falta de diálogo e de informações concretas sobre as consequências das barragens às comunidades têm intensificado os conflitos. “Apesar de todo mundo saber que o governo e as empresas pretendem construir a barragem, que o licenciamento ambiental já está sendo feito, o espaço de diálogo e que proporcione a participação da comunidade não existe de uma forma democrática”.
A falta da consulta prévia e informada, direito previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, está entre as violações cometidas pelas empresas e pelo governo federal no processo de pesquisa para construção da usina São Luiz do Tapajós. Em novembro de 2012, a Justiça Federal proibiu a continuidade das pesquisas em território dos indígenas da etnia munduruku, do Alto Tapajós, pela falta de consulta prévia à população. Apesar da decisão, lideranças munduruku relatam a continuidade dos estudos na área.
Para além da garantia do direito à consulta prévia, as comunidades frisam a necessidade de que a opinião dos moradores seja respeitada, inclusive na posição de que as hidrelétricas não devem ser construídas. Outra reivindicação é sobre a ampliação das comunidades a serem consultadas. A decisão atual do governo brasileiro é de consultar apenas povos indígenas e quilombolas, excluindo os demais atingidos pelos projetos, como ribeirinhos, pescadores artesanais e pequenos agricultores.
João Tapajós, do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns – CITA, afirma a necessidade de que as consultas não sejam utilizadas como oportunidade de convencimento da população. “Nós temos que transformar todos os processos de consulta em espaço de mobilização. Precisamos utilizar a consulta como momento de luta.”.
Fortalecimento e articulação das lutas
Compartilhar a realidade local e debater sobre os problemas e possíveis ações comuns contribuiu para o processo de articulação entre as diversas comunidades que margeiam o rio Tapajós. Como resultado das reflexões, os movimentos e entidades presentes firmaram o compromisso de avançar na articulação de ações conjuntas e no esforço em mobilizar mais pessoas para defender o território onde vivem. “Todos nós temos que colocar os pés no chão e caminhar nessa luta. Nós somos agentes multiplicadores, é uma luta nossa, é do povo”, ressalta o pescador artesanal José Carlos Mota Feitosa, do município de Aveiro.
Também ficou encaminhada a construção de um documento para denunciar as violações de direitos humanos sofridas pelas comunidades em decorrência do projeto hidrelétrico para a região, especialmente sobre o descumprimento da decisão da Justiça Federal de suspender as pesquisas nas terras indígenas Munduruku.
Fotos: Ramon Santos e Ednubia Ghisi
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Compartilhada por Isabela Pacola.