O Ministério de Minas e Energia (MME) decidiu entrar diretamente nas discussões sobre o polêmico projeto de mineração de ouro que a empresa canadense Belo Sun Mining pretende instalar na região de Volta Grande do Xingu, mesmo local onde está sendo erguida a hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.
O Valor apurou que uma reunião fechada foi convocada para hoje no ministério. Na mesma mesa estarão presentes a diretoria do consórcio Norte Energia, responsável pela construção da usina, e representantes da empresa Belo Sun. O encontro foi estendido a membros da Casa Civil e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). As discussões deverão ser acompanhadas por Telton Elber Correa, diretor do departamento de geologia e produção mineral da Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do MME.
A reportagem é de André Borges e publicada pelo jornal Valor, 19-09-2012.
O objetivo da reunião é discutir de que forma o governo atuará nos dois empreendimentos – hidrelétrica e lavra de ouro – e como esses se relacionam, uma questão que, ao menos no relatório de impacto ambiental elaborado pela Belo Sun, foi absolutamente ignorada. A única citação sobre Belo Monte nas 62 páginas do relatório apresentado pela companhia canadense refere-se à possibilidade de a mineradora utilizar energia elétrica da usina para extrair ouro, quando a hidrelétrica iniciar a sua operação a partir de 2015.
Reportagem publicada pelo Valor na segunda-feira revelou que a Belo Sun pretende extrair 4,6 mil quilos de ouro por ano em uma área que fica a apenas 15 km de distância da barragem principal de Belo Monte. Para isso, investiria US$ 1,076 bilhão na extração e beneficiamento do metal. O processo de licenciamento ambiental do empreendimento corre a passos largos na Secretaria de Meio Ambiente (Sema) do Estado Pará, e não pelo Ibama, como acontece com a hidrelétrica da Norte Energia.
Uma fonte que participa diretamente das discussões sobre os dois empreendimentos revelou que o governo fez uma avaliação negativa sobre o processo de licenciamento da mineração da Belo Sun. Nas margens do Xingu, no município de Senador José Porfírio, onde está prevista a lavra do ouro, ribeirinhos foram informados por representantes da empresa que terão de sair da região por conta da mineração. Os pescadores chegaram a escrever uma carta sobre o assunto, a qual acabou chegando a representantes do governo. “Soubemos do empreendimento dessa forma absolutamente informal”, disse essa fonte.
Outro ponto de conflito no empreendimento de mineração diz respeito ao impacto que a lavra poderá gerar às aldeias indígenas da região. A hidrelétrica de Belo Monte se vê envolvida há décadas em discussões sem fim sobre os reflexos que a usina trará às terras e vidas indígenas, tendo realizado dezenas de audiências públicas sobre o assunto nos últimos anos. Outras audiências ainda estão por vir. O projeto da Belo Sun, no entanto, não menciona nenhum impacto indígena.
O Ibama alega que, por lei, é atribuição sua licenciar projetos de mineração apenas quando esta ocorre entre dois ou mais Estados, em áreas que atingem unidades de conservação federal ou em caso de lavras de minerais radioativos. O licenciamento da lavra no Xingu, portanto, seria de competência da Sema do Pará.
“Não há condições de um empreendimento ignorar totalmente o outro. É isso que iremos avaliar”, disse uma fonte do governo.
Em termos práticos, o MME quer analisar uma forma de atuar mais diretamente nos empreendimentos. O Ministério Público Federal (MPF) em Altamira já encontrou inconsistências no relatório de impacto ambiental apresentado pela Belo Sun Mining e iniciou uma investigação sobre o projeto. As preocupações incluem, por exemplo, eventuais riscos atrelados à utilização de explosivos na mina, bem ao lado da barragem da hidrelétrica.
Para o advogado especialista em direito ambiental do Instituto Sócio Ambiental (ISA), Raul do Valle, o MME já tem controle sobre o empreendimento. “O ministério pode agir por meio do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), responsável pelas autorizações”, disse.
A Belo Sun possui 42 processos de licenciamento no DNPM, segundo informações da autarquia vinculada ao MME. Destes, 27 estão em fase de autorização de pesquisa. Além da área do Xingu, a companhia analisa explorações nas proximidades do rio Tapajós, também no Pará, e no Tocantins.
Informações da Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa Mineral (ABPM) apontam que, só na Volta Grande do Xingu, há 489 processos protocolados no DNPM, dos quais 228 são destinados à extração de ouro.
Pelo cronograma da Belo Sun, a licença de instalação da mina em Volta Grande é aguardada para o primeiro semestre do ano que vem, com início do empreendimento a partir de junho de 2013.
–
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/513724-governo-quer-avaliar-mina-da-belo-sun