Disputa pela terra vermelha desmata a floresta e maltrata a todos

Que futuro terá aquela criança que olha para a minha câmera com olhar assustado? Foto: Ana Helena Tavares

Por Ana Helena Tavares*

É vermelha a terra no Araguaia. Trago sapatos marcados para sempre. É vermelho o sangue de todos. Mas o dos índios sempre valeu menos. Desde 1500, “índio bom é índio morto”. E, assim, deixando um rastro de desmatamento, sobre o sangue dos verdadeiros donos, se construiu o Brasil.

“O primeiro grito dos conquistadores foi ‘Terra, terra!’” Ouvi isso de D. Pedro Casaldáliga, em recente ida à São Félix do Araguaia (MT). Antes de chegar lá, presenciei estradas serem fechadas por produtores rurais que disputam com a Funai a posse de terras declaradas como reserva indígena. É um drama para todos os lados.

Para os índios, que não vêem a terra como negócio, mas sim como casa. Índios estes que foram deportados de suas terras na década de 60 e até hoje, cada vez mais minguados, lutam para voltar. Dramático também para os “não índios”, muitos enganados pela promessa de ter um pedaço de terra. Terra comprada de invasores.

É um drama até para os invasores. Latifundiários que desmataram tudo, usando e abusando de agrotóxicos, envenenando a si próprios e às futuras gerações. Não pensam no futuro. Como pontificou Casaldáliga, o lema deles é: “Amanhã vamos ver, atrás de mim é dilúvio”.

Já de volta ao Rio de Janeiro que, se remontarmos a 1500, também é terra indígena invadida, conversei sobre assunto com a antropóloga Valderez Laroche, minha querida ex-professora, que garantiu serem mínimas as chances de os índios ganharem uma briga que eles vêm perdendo há séculos.

“A ideia sempre foi que, se for índio, pode matar que não tem problema”, garantiu Valderez. “Eles têm uma forma de organizar sua vida muito dependente do espaço onde estão instalados. Fauna, flora, tudo é como se fosse parte deles. O céu é o relógio deles. A terra é o mapa deles. Tirá-los dali e levá-los para um parque (como propõe o governo do Mato Grosso) é matá-los”, lamentou.

Tudo indica que é o que irá acontecer. “No Brasil, se faz as coisas sentados lá na capital. De erro em erro, o tempo vai passando… Como os posseiros estão lá há décadas, é usucapião no duro para eles”, assegurou Valderez, que também é formada em direito. Pena que os índios não sabem o que é usucapião, senão tudo neste país seria deles.

É vasta e criminosamente improdutiva a terra no Brasil. Trago os meus olhos marejados de tudo que vi. São vastos os problemas de todos. Mas os dos índios não foram criados por eles.

*Editora do site “Quem tem medo da democracia?”

http://quemtemmedodademocracia.com/2012/09/15/disputa-pela-terra-vermelha-desmata-a-floresta-e-maltrata-a-todos/

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