O que você precisa saber sobre a Lei de Cotas

As cotas raciais são uma demanda antiga do movimento negro, mas o debate mais generalizado na sociedade sobre ações afirmativas no Brasil se fortaleceu com a participação ativa do país na III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, ocorrida em 2001, em Durban, na África do Sul. A partir desse período, diversas universidades estaduais e federais brasileiras passaram a adotar cotas sociais ou raciais, mas não havia uma lei que regulamentasse nem tornasse esse tipo de ação afirmativa uma política de Estado. Com a Lei 12.711, sancionada pela presidente Dilma Rousseff no último dia 29 de agosto, este instrumento de promoção da igualdade racial e social deve se fortalecer, além de provocar instituições estaduais e privadas a adotarem também medidas correlatas.

As ações afirmativas são medidas discriminatórias positivas: na realidade elas discriminam para integrar, ao contrário das medidas discriminatórias negativas (como o apartheid foi na África do Sul), que servem para segregar. As ações afirmativas favorecem alguém que foi historicamente discriminado e desfavorecido em conseqüência de políticas e formas de dominação que são consideradas injustas e desumanas pelos acordos e tratados internacionais de direitos humanos. Elas existem para que essas pessoas possam competir no mercado de trabalho e exercer seus direitos plenamente, em igualdade com aqueles outros indivíduos que, ao contrário, foram historicamente favorecidos e hoje possuem uma vantagem muito grande em relação aos primeiros.

Essa desigualdade é que separa as pessoas tanto espacialmente (em consequência da desigualdade, as pessoas moram em lugares distintos), profissionalmente (os privilegiados ficam com os melhores empregos e profissões), e simbolicamente (as pessoas privilegiadas são consideradas melhores na sociedade porque possuem aquelas características desejadas por todos). O problema é que essa desigualdade não acontece por falta de mérito dos que estão em desvantagem, mas são resultado do ponto de partida de cada um, pois um parte de uma situação em que tudo conspira a seu favor (condições ideais de ensino, moradia, saúde, autoestima), enquanto o outro parte de condições contrárias (falta de tudo aquilo, acrescida à violência racial, que é tanto simbólica quanto situacional). 

As cotas são um instrumento de ação afirmativa que tenta corrigir essa desigualdade de oportunidades, pois, para Estado Brasileiro, em seus Três Poderes, não é possível esperar que todos os problemas da educação básica brasileira sejam resolvidos para tornar mais justa a participação da população negra e pobre na universidade pública. Isso seria permitir que toda uma geração seja prejudicada, seus talentos desperdiçados e suas possibilidades de realização pessoal frustradas, por causa de erros do passado que nunca foram revistos pela nossa sociedade, mas, ao contrário, foram reforçados por mais de cem anos de negação da existência do racismo no Brasil.

1. Que são as instituições que deverão adotar as cotas?
A Lei 12.711 de 2012, chamada Lei das Cotas, define que as Instituições de Ensino Superior vinculadas ao Ministério da Educação e as instituições federais de ensino técnico de nível médio devem reservar 50% de suas vagas para as cotas. A lei não atinge as instituições de ensino estaduais ou privadas.

2. Que instituições são essas?
As Instituições de Ensino Superior vinculadas ao MEC são as 59 universidades federais e a Rede Federal de Educação Profissional, Científica  e Tecnológica, com 354 unidades em todos os Estado e no Distrito Federal (http://emec.mec.gov.br). A lei incide também sobre as instituições federais de ensino técnico de nível médio, que fazem parte da Rede Federal desde 2008 e seguem as mesmas regras, com a diferença de que os alunos devem ter cursado integralmente o ensino fundamental em escola pública (pois são cursos de nível médio).

3. Quando começa a valer a lei?
A lei deve começar a ser implementada imediatamente, ou seja, no próximo vestibular as universidades e a Rede Federal de Educação, Ciência e Tecnologia devem aplicar todos os critérios, mas a norma dá um prazo para a implementação integral. As instituições têm o prazo de 4 anos para a implementação integral da lei, e o mínimo de 25% por ano. Ou seja: nos vestibulares de 2013, as instituições devem ter reservado no mínimo 12,5% do total de vagas; em 2014, 25%; em 2015, 37,5%, e, em 2016, a metade das vagas (50%), como prevê a lei. Assim, em 2016 todas as instituições terão reservadas 50% de suas vagas para as cotas.

4. As cotas vão existir para sempre?
Não. O Poder Executivo deve implementar no prazo de dez anos um programa de acompanhamento que vai avaliar a necessidade de continuação da política.

5. Como serão distribuídas as cotas?
Ao todo, 50% de todas as vagas (por curso e turno) das instituições serão reservadas às cotas.
=> Origem em escola pública: Todos esses candidatos devem ser oriundos de escolas públicas (ensino médio integral no caso de instituições de ensino superior, e fundamental para as escolas técnicas de nível médio).
=> Renda: Metade desse total de vagas é reservada a alunos com renda familiar per capta igual ou inferior a 1,5 salário mínimo.
=> Critério étnico-racial: As cotas raciais serão diferentes em cada Estado, pois são proporcionais à composição étnico-racial verificada pelo IBGE, e devem incidir sobre a totalidade das vagas reservadas às cotas (50%). Essa proporção étnico-racial é dividida entre pretos, pardos e indígenas.

6. Como ficam as instituições que já têm cotas?
As instituições de ensino que já têm algum tipo de cota devem adaptar suas regras às determinações da lei. Quando a reserva de vagas existente (seja para escola pública, de renda ou racial) for menor do que a lei, a instituição precisa elevar o número de vagas até os percentuais legais. Se for maior, fica a critério da instituição diminuir ou não.

7. A seleção será feita por vestibular ou pelo Enem?
A forma de seleção dos alunos cotistas (vestibular, Enem, Programa de Avaliação Seriada, etc.) fica a critério da instituição de ensino.

8. Com as cotas, o nível das universidades vai baixar em consequência de os alunos cotistas serem despreparados?
Nenhum estudante vai entrar na universidade sem ter os conhecimentos mínimos necessários, de acordo com os critérios da instituição. Os estudantes ainda serão aprovados pelo processo seletivo, seja vestibular ou outro método, só não se classificariam em condições normais de competição. Idealmente, se o Estado tivesse capacidade de fornecer uma quantidade muito maior de vagas, mais alunos entrariam e a competição seria menor. Assim, as exigências de notas para ingresso na universidade não seriam tão grandes, mas isso não quer dizer que o nível da universidade pioraria. O que interessa para elevar a qualidade da instituição é ensino, pesquisa, extensão, responsabilidade social, gestão da instituição e corpo docente, que é o que o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) do MEC analisa. Nada indica que a nota dos alunos no vestibular é um critério determinante da qualidade de uma instituição de ensino. Ao contrário, a exigência de nota do vestibular sobe por causa da competição entre os alunos para entrar numa instituição de qualidade, mas não é a dificuldade dessa prova que vai fazer com que a instituição seja melhor ou pior. Os estudantes cotistas (que têm nota mais baixa no vestibular) têm desempenho acadêmico igual ou superior aos outros em todas as experiências existentes no Brasil.

Fonte: Lei 12.711/2012 e SEPPIR.

Compartilhada por Margaret Pereira.

http://www.seppir.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2012/09/o-que-voce-precisa-saber-sobre-a-lei-de-cotas

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