CE – Uma saída para quem vive na zona costeira

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Sem energia elétrica, comunidade Xavier, no Município de Camocim, abriga uma usina eólica FOTO: DIVULGAÇÃO
Especialistas defendem que políticas públicas devem contemplar o “direito natural” dos povos

Fortaleza – O sol nasceu para todos, mas o mar é de quem tem o privilégio. O mar é de quem chegou primeiro ou de quem tem mais dinheiro. Em todos os casos há investimento. Pode ser econômico, cultural, político e social. Quando há discordância sobre qual desses investimentos deve ser prioritário, está lançada em terra e mar a divergência, que pode virar conflito e até uma guerra, com alguns capítulos escritos em documentos judiciais – e páginas de jornal. Em toda a zona costeira do Ceará, etnias indígenas, grupos remanescentes de quilombos e mesmo gente “misturada”, que vive da pesca, do turismo, do artesanato, tentam garantir o direito social da terra. De outro modo, o potencial econômico dessa região do Ceará, seja na indústria, no turismo ou na pesca, tem bandeira fincada por governos e empresários. Apresenta-se mais uma complexa questão: como garantir o mar para todos, como um direito natural e, também econômico, que gere um desenvolvimento qual seja cultural, econômico, político ou social, tenha principalmente sustentabilidade.

Sobre os vários conflitos com os povos, o advogado Cláudio Silva Filho, assessor do Instituto Terramar e membro da Rede Nacional de Advogados Populares (Renap), coloca como prioridade a manutenção dos direitos fundamentais de moradia, trabalho, alimentação e equilíbrio ambiental. “É fundamental o reconhecimento da posse tradicional que as diversas comunidades exercem na zona costeira. Porém, essa posse deve ser percebida na sua relação com outros aspectos, como o meio ambiente, o trabalho e a cultura. A garantia da posse tradicional supera o sentido da mera propriedade, pois significa a própria reprodução social da vida”, defende ele.

Licença ambiental

Nos últimos 20 anos, dezenas de documentos jurídicos, movidos por Ministério Público, Justiça, ambientalistas, comunidades nativas, empresários e governos formam uma pilha de papel sobre o mar. Vai e vem com as ondas. Ora a Justiça decide favorável a um grupo, ora a outro. Há muitos anos acompanhando os embates em torno da zona costeira, o doutor Jeovah Meireles, professor do curso de pós-graduação da Universidade Federal do Ceará (UFC), propõe que os projetos tenham alternativas locacionais. “A melhor saída é aquela associada a um rígido controle social do licenciamento dos empreendimentos e estudos fundamentados em equidade ambiental. Uma profunda análise dos projetos pautada em alternativas locacionais e tecnológicas e os sistemas ambientais tratados como bens coletivos. E identificação e delimitação dos territórios tradicionais dos povos do mar e das terras indígenas”.

Agrotóxicos

Haverá um meio termo, uma compensação? “Não vejo como os povos do mar possam ser ´recompensados´ quando submetidos os projetos que arrasam seus lugares, contaminam suas águas por agrotóxicos e promovem o colapso da pesca; o modo de vida e a biodiversidade que emana dos ecossistemas. Há na zona costeira do Ceará um conjunto de impactos socioambientais sem precedentes – diante inclusive do ´esforço´ que as nações estão depreendendo para o ´desenvolvimento´ nos últimos 20 anos ao longo do litoral e na maioria dos rios de nossas bacias hidrográficas”.

Em termos de preocupação com as mudanças climáticas, Meireles pontua que os projetos preconizem a defesa dos ecossistemas como a melhor saída.

“Os territórios onde os povos do mar mantêm suas atividades de subsistência são aqueles que resguardam melhor qualidade dos sistemas ambientais e, portanto, fornecem as bases ecossistêmicas e de manutenção dos sistemas costeiros em pleno funcionamento: são áreas que capturam dióxido de carbono, induzem a biodiversidade e diversificam a paisagem litorânea. Quando suprimidas pela mercantilização – impermeabilizadas, desmatadas, contaminadas e degradadas pela especulação imobiliária -, entram em decadência e promovem externalidades ambientais relacionadas, por exemplo, com o colapso da produtividade marinha”, afirma. (MJ)

http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=869088

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