O sertão nordestino vai virar deserto. Pelo menos esse é o cenário mais pessimista que pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) preveem caso não sejam tomadas medidas contra o aquecimento na região. Nos últimos 40 anos, os termômetros registraram um aumento de mais de 3°C em cidades como Vitória de Santo Antão (PE), enquanto o resto do planeta esquentou em torno de 0,4°C. O fenômeno se deve em parte às mudanças climáticas decorrentes da emissão de gases estufa, mas também à urbanização crescente da região. Ao mesmo tempo, as chuvas estão se tornando raras, mas chegam com intensidade capaz de destruir cidades inteiras.
Os estudos que comprovam o fato, há muito observado pelos moradores locais, serão apresentados na 62ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), entre 25 e 30 de julho, em Natal (RN), e na Segunda Conferência Internacional: Clima, Sustentabilidade e Desenvolvimento em Regiões Semiá ridas, entre 16 e 20 de agosto, em Fortaleza (CE).
As altas temperaturas prejudicam sobretudo os pequenos produtores rurais. Eles fazem a chamada agricultura de sequeiro, que depende da chuva para manter lavouras de subsistência como feijão e milho. Segundo especialistas, essa prática agrícola – que tem alta demanda do recurso natural – já se tornou inviável em várias regiões do semiárido.
Por outro lado, o aumento da temperatura está fazendo com que a água presente no solo evapore mais rapidamente e forme nuvens maiores e mais carregadas – que resultam em chuvas intensas. “Como as cidades não terem infraestrutura, essas precipitações se transformam em tragédias, como as ocorridas em Alagoas e Pernambuco no mês de junho”, explica José Antônio Marengo, meteorologista e pesquisador do Inpe.
Segundo ele, no entanto, a desertificação pode ser contida com o fim dos desmatamentos. “A cobertura vegetal é importante para manter o solo úmido. Se ele ficar totalmente exposto ao sol, a tendência é de que se torne um deserto”, diz. Outro fator responsável pelo fenômeno, o assoreamento dos rios, também pode ser evitado com a manutenção da vegetação.
Os pesquisadores estimam que 31,6 milhões de pessoas, em dez Estados, estejam vulneráveis aos efeitos do aquecimento no Brasil, o que corresponde a 19% da população. Além de prejudicar a agricultura, ele pode gerar uma alta no preço dos alimentos, migração para centros urbanos, desemprego e aumento nos gastos públicos com programas de emergência. Por isso, os cientistas defendem políticas de prevenção. “É preciso fazer um planejamento para quatro, cinco anos, e não as medidas paliativas de sempre”, defende Marengo.
Uma dessas alternativas seria tornar viável aos pequenos agricultores a irrigação por gotejamento. Essa tecnologia, criada em Israel, já é uma realidade para grandes produtores de cidades como Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), exportadoras de manga e uva. O investimento, porém, só tem retorno em três ou quatro anos. “Antes de tudo, é preciso educar as pessoas para que elas entendam que o aquecimento global é uma realidade”, conclui Marengo.
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