Pelo banimento do amianto em todo Brasil. Entrevista especial com Edson Duarte

O amianto é uma fibra natural muito utilizada em telhas e caixas d’água. No entanto, o contato, tanto por parte do produtor quanto do consumidor, com esse recurso pode trazer inúmeras e sérias doenças, principalmente respiratórias. O problema é tão grande que o amianto é totalmente proibido na Europa, além de Argentina e Chile. O Brasil é um dos principais produtores de materiais com amianto, mas está começando a discutir o banimento dele. Nesse sentido, depois de dois anos de estudos, a Câmara dos Deputados, através do Grupo de Trabalho do Amianto, da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, apresentou, recentemente, o relatório do amianto e propôs o banimento de todas as formas da fibra em todo o território nacional.


A IHU On-Line entrevistou, por telefone, o relator do dossiê, o deputado federal Edson Duarte (PV-BA). Ele falou sobre o conteúdo do documento, explicou os impactos que o banimento pode trazer ao país e analisou a cadeia de produção do amianto e os principais problemas que ele tem causado aos trabalhadores. “É preciso, também, que o governo brasileiro acompanhe todos aqueles que trabalharam ou que tiveram contato com a produção ou produtos feitos a partir desse mineral. Essas pessoas precisam de acompanhamento e tratamento. E o governo deve exigir que isso seja bancado pelas empresas”, disse Duarte.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que diz o dossiê do amianto?

Edson Duarte – Esse relatório tem mais de 700 páginas e é um estudo profundo sobre a situação do amianto no Brasil. Nós temos diversos projetos tramitando na Câmara dos Deputados e no Senado a respeito do amianto e este relatório é o resultado de um grupo de trabalho que foi formado na Câmara dos Deputados para garantir subsídios em relação ao tema. Esse assunto é extremamente relevante e, no Brasil, foi motivado pelo banimento do amianto em toda a Europa e em alguns países da América do Sul.

Alguns estados, como São Paulo, já proibiram o uso do amianto.  Há, portanto, um debate intenso, mas que não tinha subsídios para ir adiante. Desta forma, o grupo de trabalho elaborou este relatório de modo que pudesse garantir conteúdo para a realização do debate em torno das conseqüências do uso do amianto. Creio que, a partir de agora, vamos ter as condições e subsídios necessários para fazer um debate profundo e, com isso, espero que o Brasil tenha coragem de tomar a decisão de proibir o amianto de uma vez por todas em todo o país.

IHU On-Line – Há impactos sociais caso a lei seja aprovada?

Edson Duarte – Há. Isso porque temos, logicamente, empregos ligados à cadeia do amianto, desde a mina até o comércio. Mas não teremos grandes impactos com a proibição do uso desse recurso, porque a partir do momento em que o amianto seja banido, teremos outras matérias diversas que podem substituí-lo. Não haverá impacto significativo, até porque a cadeia do amianto é hoje uma cadeia bastante restrita. O único local que poderia sofrer um impacto maior é a cidade de Minas Sul, no interior de Goiás, onde está localizada a única mina de amianto do mineral no Brasil.

De qualquer forma, independente do banimento, o amianto é um mineral não renovável, então não tem como a cidade de Minas Sul ficar dependendo deste mineral como única fonte de renda, como acontece hoje. O que temos percebido é que em Goiás não há uma preocupação das autoridades em fazer uma transição necessária e inadiável.

IHU On-Line – É verdade que as doenças do amianto não ocorrem mais no Brasil?

Edson Duarte – Não é verdade. Há uma invisibilidade das doenças do amianto no Brasil. Há uma precariedade nos diagnósticos das doenças. Hoje, o acompanhamento das pessoas é feito quase que exclusivamente pelos médicos das empresas. Os trabalhadores não têm a quem recorrer porque o sindicato do setor é comprometido também com as empresas. É um sindicato que faz parte do movimento de lobby pró-amianto. Assim, estes trabalhadores não tem como receber outra avaliação, não há estrutura pública que ofereça tanto exames quanto diagnósticos que possam associar os problemas de saúde com o amianto.

O que nós sabemos é que algumas das doenças que são associadas ao amianto só aparecem depois de 30, 40 anos que o trabalhador teve contato com a fibra. Hoje não podemos dizer de forma segura que não há doentes no Brasil. É claro que os processos industrial e de mineração mudaram muito no país, mas  não conseguiram garantir que o trabalho com amianto seja seguro e sem riscos. Todas as formas de amianto são agressivas e prejudiciais à saúde em todos os níveis de exposições e em todos os níveis em relação ao número de partículas em suspensão no ar. Isso é consenso médico e científico.

IHU On-Line – Antes mesmo da elaboração do dossiê, o senhor já havia tomado posição contrária ao uso do amianto. Por quê?

Edson Duarte – Eu encontrei tantos doentes em função do amianto no Brasil e isso me preocupou muito. Quando visitei as cidades Poções e Bom Jesus da Serra, no interior da Bahia, fiquei assustado com o número de doentes com problemas respiratórios que trabalharam na mina de amianto da região ou tiveram algum contato com ela. Acredito que precisamos conhecer esse assunto com profundidade e, definitivamente, tomarmos a decisão de proibir o amianto no Brasil.

Não há razão econômica, científica, tecnológica e comercial que justifique a continuidade do uso desta fibra. Se Europa, Argentina, Chile, Uruguai baniram, é preciso que o Brasil faça isso logo. É preciso, também, que o governo brasileiro acompanhe todos aqueles que trabalharam ou que tiveram contato com a produção ou produtos feitos a partir do amianto. Essas pessoas precisam de acompanhamento e tratamento e o governo deve exigir que isso seja bancado pelas empresas.

IHU On-Line – Como é a cadeia de produção do amianto no Brasil?

Edson Duarte – A cadeia de produção do amianto hoje no Brasil se restringe a uma mina que é uma das maiores do mundo. Ela é de propriedade da SAMA S.A. – Minerações Associadas que, por sua vez, pertence ao Grupo Eternit. Este é o maior grupo econômico que transforma amianto em produtos como telhas. Das novas empresas do Brasil, apenas três ainda usam filtros a base de amianto, sendo que duas delas já anunciaram o interesse de fazer a substituição. No setor de telhas já temos uma série de produtos similares, feito com outros recursos e com preços compatíveis. A própria Eternit já oferece telhas sem o amianto.

IHU On-Line – Como é feito o controle social na vigilância dos trabalhadores expostos ao amianto e qual a efetividade dessa regulação?

Edson Duarte – Não há controle, porque não existe estrutura pública para fiscalização e acompanhamento. No Ministério do Trabalho nós contamos apenas com uma profissional, que é uma das maiores especialistas no Brasil em relação ao amianto. A Fundacentro, que deveria acompanhar a questão da saúde, tem uma estrutura muito limitada de profissionais para dar atenção a um problema como o do amianto.

IHU On-Line – Há alternativas, portanto, para o uso do amianto?

Edson Duarte – Existem muitas alternativas. Os produtos que eram feitos com fibra do amianto já estão utilizado recursos à base do petróleo, fibras naturais e celulose. Há no mercado hoje material disponível e não há necessidade de continuarmos explorando o amianto. O Brasil deveria investir e financiar pesquisas para o aprimoramento das alternativas, não só para o amianto, mas para toda e qualquer produto que ofereça risco à saúde para a população. Hoje, utilizando o amianto, estamos tendo dois custos: 1) com o uso de uma tecnologia inadequada; e 2) com a saúde pública daqueles que estão ficando doentes.

http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=34487

Comments (4)

  1. Quando se fala em segurança rigida, deve-se atentar para fatos isolados. Por exemplo: A população da cidade sabe que quando há lançamento de particulados na atmosfera, toca-se a famosa sirene que informa sobre o fato. Entretanto, os responsáveis pela avaliação do tamanho do extrago da poluição lançada, não realiza tais procedimentos a contento. Falo isso por que sei como é isso nas empresas. Elas ocultam muitos fatos e atos. Afinal de contas, é assim mesmo. O processo de extraição do mineral, acredito que todas as pessoas de bens e que se preocupam com o meio ambiente, bem como com a saúde dos trabalhadores o conhecem, e pode-se dizer que é bastante intrigante. Pois como pode se trabalhar com alguma coisa prejudicial? Somente pela única e exclusiva razão. “Sustentabilidade familiar!” Nenhum ser em sua legitima razão, deixará de sustentar filhos, filhas, pais, mães, e esposas. Mesmo correndo altos riscos.
    Quanto a questão levantada pelo nobre, sobre como a cidade se sustentaria sem o mineral, tenho plenas certezas de que isso não será dificuldade, pois a região é bastante promissora. como todas as regiões do nosso pais. Basta se ter iniciativas politicas e empreendedoras. De fato, como diz um velho conhecido: “Só vai lá quem tem algo por lá. Pois a estrada acaba por lá.”

  2. Respondendo ao Marcelino: não são 170.000 empregos gerados pela cadeia produtiva do amianto. Na verdade, são 3.500, sendo 600 diretos e 300 indiretos na SAMA; o restante na indústria de cimento-amianto. Esta conta fantasiosa e inflada defendida pelo lobby do amianto tenta incutir a idéia de que o setor emprega muita gente, incluindo aí os trabalhadores da construção civil, do comércio, transporte, que não são efetivamente postos de trabalho criados pela indústria do amianto, já que podem trabalhar com outros materiais. Não é correta a afirmação de que não há riscos em extrair ou usar produtos contendo o cancerígeno amianto, já que a Organização Mundial da Saúde não estabelece qualquer limite seguro abaixo do qual não haja riscos de adoecimento. Quanto às perguntas feitas por Gustavo, se ele conhecesse melhor a empresa em que trabalha saberia que o deputado Edson Duarte esteve em Minaçu e se encontrou com trabalhadores, políticos, sindicalistas e visitou a mina de amianto. Todos nós de há muito tempo vimos defendendo alternativas econômicas para a cidade de Minaçu, para diminuir sua dependência econômica do amianto porque um dia ele vai ser banido ou se esgotará como “bem mineral” finito que é. O então ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, chegou a sugerir que o BNDES financiasse alternativas viáveis para a região e foi duramente criticado pelo pelego sindicato dos mineradores de Minaçu. Nós estamos verdadeiramente preocupados com o futuro de Minaçu, mas nos parece que nem os moradores, nem os políticos, muito menos os sindicalistas estão e continuam a defender a indefensável e insustentável indústria da mineração do amianto. Se não se prepararem para o futuro o mais rapidamente possível, a população de Minaçu poderá ficar numa situação muito difícil. Não digam que não avisamos.

  3. O Sr. Edson Duarte fala que a cadeia do amianto é muito restrita, porém, a verdade é que a cadeia do amianto gera mais de 170000 empregos no Brasil. A mineradora trabalha com total segurança e não há riscos à saùde em extrair o amianto crisotila e muito menos em usar produtos feitos com o mineral, como telhas e caixas d’água.

  4. Primeiramente, a cidade chama Minaçu.

    Estou na cidade faz duas semanas e discordo plenamente com a posição do impacto, economicamente falando, se por exemplo cogitar a hipótese de fechar a mineradora. Aqui geram mais de 1000 empregos direta e indiretamente falando. O processo que analisei aqui relacionado a segurança dos trabalhadores é bastante rigido, principalmente relacionado a poeira. Eu sou terceirizado da Sama e não vi o que estão falando aqui na reportagem.

    Pergunta:
    O Sr. Edson Duarte conheceu o processo da mineradora?
    O Sr. Edson já calculou o impacto economico que geraria à cidade?
    Qual a outra alternativa de renda para os colaboradores da cidade de Minaçu?

    Pelo conteúdo da entrevista, está bastante claro, na minha opinião, há interesse politico como também economico.

    Att.

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