Triste título

[Adital] – Egon Dionísio Heck *

“No contexto político e econômico brasileiro e, em particular do Estado do Mato Grosso do Sul, pode-se dizer que o foco é fazer viver os grandes proprietários, o grande capital e deixar morrer os povos indígenas” (Relatório de Violência contra os Povos Indígenas 2009, pg17)”Mato Grosso do Sul, campeão de violências contra os povos indígenas. Até Quando?”

Assim, há quatro anos atrás, anunciava uma faixa num debate promovido pela CNBB regional, sobre a violência contra os povos indígenas deste estado. De lá para cá todos os anos a faixa continua sendo ostentada, ano após ano, o triste título.

Neste ano, uma vez mais, a faixa vai ser desfraldada para dizer ao Brasil e ao mundo que o Mato Grosso do Sul continua sendo o campeão disparado de violências contra os povos indígenas.



Iara Bonin, no artigo do Relatório de Violência contra os Povos Indignas, que está sendo lançado hoje, com o título “Racismo institucional no Mato Grosso do Sul”, faz uma análise sobre o estarrecedor quadro de violência contra os povos indígenas neste Estado. Em sua análise afirma que “O ato de deixar morrer os povos indígenas, considerados sob um prisma racista, como improdutivos e descartáveis, é praticado pelo Estado brasileiro de muitas maneiras: através de ações e omissões que os expõem à morte, através da burocracia e da morosidade que multiplica os riscos para a vida das pessoas, expressa em situações de confinamento em terras ínfimas ou em acampamentos provisórios, sem garantias mínimas de segurança e de sobrevivência”. Após analisar o que Michel Foucault chama de racismo do estado, expressa o pensamento do autor com relação às “múltiplas formas de tirar a vida”, que não se expressa apenas no assassinato direto, mas também, – e principalmente – no fato de expor à morte e multiplicar os riscos para esses grupos “inferiores”, ou, ainda, em estratégias de morte política, materializadas em expulsão, de rejeição, de confinamento, de assédio moral”.

No mesmo artigo Iara afirma que “Em relação aos Kaiowá Guarani, pode-se dizer que o Estado também tem decretado um tipo de morte política, na medida em que não controla, não fiscaliza, não coíbe a violência praticada contra eles, de forma cada vez mais incisiva e contundente… Tomando como base os dados deste relatório, apresentado pelo Cimi, é possível identificar uma tendência de intensificação da violência contra os povos indígenas em Mato Grosso do Sul, expresso tanto pela quantidade, quanto pela brutalidade das agressões praticadas” (idem pg. 18)

O agravamento da situação

Na medida em que não avança o processo de reconhecimento das terras indígenas no Mato Grosso do Sul, o cenário da violência, infelizmente, tende a se agravar. A oposição sistemática e virulenta, por parte dos setores políticos e econômicos regionais, ao reconhecimento e demarcação das terras indígenas, aliado às decisões judiciais contrarias aos direitos dos índios e a complacência e omissão do governo com a impunidade e violência, configuram hoje esse quadro genocida retratado no Relatório de Violência. Neste primeiro semestre já se tem o registro de pelo menos 15 assassinatos no Mato Grosso do Sul, várias mortes por atropelamento e suicídios. Dificilmente o Estado começara a reverter essa gravíssima situação de violência e morte, que indica que provavelmente ainda o Mato Grosso do Sul ostentará o triste título de campeão de violência contra os povos indígenas por muitos anos.

Na medida em que avança a concentração da terra e do capital, que cada vez mais vai passando para um pequeno grupo nacional e multinacional, especialmente com a expansão rápida do setor sucro-alcooleiro, nessa mesma proporção aumentam os conflitos no campo, especialmente com os povos indígenas que vêem o seu sagrado direito à terra cada vez mais distante. Aumentam igualmente os graves e destruidores impactos sobre o meio ambiente, já combalido por décadas de monocultura que lança anualmente toneladas de agrotóxicos ao solo e que vão afetar de forma direta os rios e o pouco de mata nativa que resta.

O grito de socorro

Vem dos povos indígenas, vem das beiras das estradas onde aumentam cada vez mais os acampamentos de indígenas e dos sem terra. Já passaram pelos acampamentos e retomas, áreas de conflito, inúmeras delegações nacionais e internacionais. Será preciso que sempre mais gente no Brasil e no mundo se some a esse gripo para exigir justiça e paz, terra e vida para os povos indígenas do Mato Grosso do Sul, em especial os Kaiowá Guarani.

Apesar do sofrimento e morte rondando diariamente seus barracos, os indígenas, tem uma esperança inquebrantável de que um dia, e esperam que não tarde, voltarão a viver em paz em suas terras, na terra sem males.

Campanha-movimento Povo Guarani Grande Povo

Brasília, 9 de julho de 2010

* Assessor do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Mato Grosso do Sul

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=49283

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