Criminalização dos Movimentos Sociais: A reação do Estado contra o Povo

J. Rosha

O extremo ocidente do Estado do Amazonas, na fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, tem sido palco de tensões e conflitos dos quais pouco temos notícia em razão da distância, do isolamento ou porque os meios de comunicação, tanto lá quanto cá, priorizam os fatos pitorescos que em termos de informação pouco ou nada acrescentam à opinião pública. A esses meios, de um modo geral, só interessa o que vende jornal, garanta a audiência ou que não afete os interesses dos veículos, de seus patrocinadores e nem represente riscos ao poder político e econômico local.

Há cerca de um ano repercutiu na imprensa mundial o massacre em Bágua, na Amazônia Peruana. Na ocasião foram mortas 50 pessoas, entre indígenas e campesinos, além de dois policiais, de acordo com dados oficiais. No entanto, essas informações podem ser fictícias, pois moradores da localidade falam em mais de cem mortos.

Conflitos de menor intensidade acontecem com freqüência. A maioria deles está relacionada à política do governo peruano de aprovar leis beneficiando empresas multinacionais ansiosas em tomar posse de toda parte do território onde tenha algo para ser explorado – petróleo, minérios, recursos da biodiversidade, etc. No caso da ação policial em Bágua, o governo de Allan Garcia alegou que os decretos contra os quais se rebelavam indígenas e camponeses eram parte do acordo de livre comércio entre Peru e os Estados Unidos. Ou seja, o massacre foi feito em nome de interesses dos EUA.

Na Colômbia, de acordo com informação divulgada pela Organização Nacional Indígena da Colômbia – Onic, 64 indígenas, de povos distintos, em 2009. A maioria caiu sob o fogo das armas das forças estatais, também a serviço da defesa de interesses alheios.

No início deste mês o governo peruano, por meio do Ministério do Interior, determinou, com base na Portaria Ministerial 0571-2010-IN, a expulsão do país do missionário Paul Mc Auley, presidente da Rede Ambiental Loretana – RAL, residente naquele país há cerca de 20 anos. Além de atuar como educador ambiental, apoiando projetos de sustentabilidade econômica de comunidades indígenas e ribeirinhas da região, irmão Paul, como é conhecido, há alguns dias atrás acionou o Organismo Supervisor de la Inversión Privada en Energía y Minería (OSINERGMIN), para que fosse realizada fiscalização na base da empresa Pluspetrol, a fim de investigar o derramamento de 400 barris de óleo cru no rio Marañon (O rio Marañon é o que dá origem ao Solimões, no lado brasileiro. A notícia confirmada pela própria empresa.

A expulsão, portanto, ganha contornos de retaliação. E retaliação feita pelo próprio estado peruano que não considera o apelo das populações tradicionais para que sejam consultados antes da implantação de empreendimentos em seus territórios e busca legitimar, por meio da criação de novas leis, por um lado, a ação das empresas estrangeiras e, por outro, criminalizar as ações das lideranças indígenas e camponesas contrárias a tais empreendimentos. Em meados do ano passado, logo após as declarações do líder Alberto Pizango, contra os decretos governamentais em prol da exploração dos recursos da selva peruana, o governo agiu prontamente tentando dissolver a Asociación Interétnica de Desarrollo de la Selva Peruana (Aidesep). Pizango teve foi obrigado a fugir para a Nicarágua, pois estava ameaçado em seu país.

No Brasil, nos últimos anos, setores que defendem o grande capital e o latifúndio, têm promovido sistemática campanha de criminalização dos movimentos sociais pelos meios de comunicação ou através de pronunciamentos de autoridades e personalidades públicas.

Dois fatos ilustram os resultados dessa campanha, conforme denúncias encaminhadas a Organização das Nações Unidas – ONU.

Primeiro: “Na madrugada do dia 10 de março de 2010, cinco policiais federais, fortemente armados, arrombaram e invadiram a casa de Rosivaldo Ferreira da Silva, o Cacique Babau, na comunidade Tupinambá da Serra do Padeiro, estado da Bahia”.

Segundo: “A Polícia Federal prendeu no dia 3 de junho, a liderança indígena índia GLICÉRIA TUPINAMBÁ e seu filho de apenas dois meses de idade, ERÚTHAWÃ JESUS DA SILVA. Glicéria é liderança de seu povo e membro da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI)”. Glicéria desembarcava na pista de pouso de Ilhéus, na Bahia, chegando de uma viagem a Brasília, onde havia se encontrado com o presidente Luis Inácio Lula da Silva.

Esses fatos revelam o quanto o brasileiro – da mesma maneira o estado peruano e o colombiano-, está empenhado em defender interesses externos em detrimento dos direitos e interesses de seus cidadãos. É de se supor que alguém ou algum setor está sendo amplamente privilegiado na contrapartida dessas medidas impopulares e antinacionais – e certamente não são os povos desses países.

Entra governo, sai governo e algumas situações não mudam. Neste caso é a natureza autoritária do estado e a subserviência dos governantes ao poder econômico, como bem demonstra a prática de governos ditos “de esquerda” na América Latina, eleitos com discurso inovador e nos quais muitas esperanças foram depositadas.

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