“Cidade desigual” – Editorial do Observatório de Favelas

Operários trabalham em ponte no Morro da Grota, no conjunto de favelas do Alemão. Foto: Gerson Miranda / Memórias do PAC
Operários trabalham em ponte no Morro da Grota, no conjunto de favelas do Alemão. Foto: Gerson Miranda / Memórias do PAC
Em declaração publicada no jornal Extra de 20 de junho, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, disse que pela primeira vez os governos entram nas favelas para transformar a vida dos moradores e oferecer aquilo que lhes foi negado ao longo de décadas. Com isso, afirmou o governador, “a cidade partida está se acabando”. A frase faz referência às obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) nas favelas e à instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em algumas comunidades cariocas.

A afirmação de que existe uma “cidade partida” oculta o fato de que, na verdade, vivemos em uma realidade de profunda desigualdade social, materializada na forma como a cidade se desenvolveu. Por isso, a declaração do governador traz esperança de que uma postura voltada para a superação deste cenário seja um compromisso baseado na implantação de políticas públicas contínuas que garantam de forma efetiva os direitos de todos os cidadãos.

As obras do PAC não são suficientes para resolver os anos de ausência do Estado. A continuidade deste tipo de política, portanto, se coloca como uma demanda urgente. No caso das UPPs, a certeza é a mesma. Uma política de segurança não pode ter a polícia como protagonista, mas é preciso que atue garantindo os direitos da população. Se a intenção é superar a violência, é necessário agregar políticas sociais de saúde, educação, lazer, habitação.

É inegável que as iniciativas atuais têm um papel relevante para o início de um novo direcionamento dos investimentos na cidade, uma vez que têm os espaços populares como nova centralidade das políticas públicas. Se as favelas e periferias são expressões claras das desigualdades que marcam a sociedade brasileira – em especial nos grandes centros urbanos –, precisamos agora criar um conjunto de proposições e práticas de transformação da sociedade que as levem em conta. É necessário integrar definitivamente as favelas na agenda de superação de contradições, conflitos e tensões presentes no espaço urbano.

Distinções espaciais, econômicas ou culturais não são suficientes para determinar uma suposta cidade partida. Não é partida uma cidade que construiu e constrói os vínculos históricos, econômicos, políticos e culturais que existem no Rio de Janeiro. A cidade é uma, ainda que plural em sua unidade, fruto das variadas formas de encontros e distanciamentos estabelecidos no cotidiano dos cariocas.

No interior deste processo, o surgimento, expansão e consolidação das favelas contribuíram para constituir o Rio de Janeiro em seu formato atual, para o bem e para o mal. As ações do Estado neste momento são importantes, mas é preciso ter em mente que este é um primeiro passo depois de um século do surgimento das primeiras comunidades. Portanto, ainda é muito cedo para dizer que o PAC e as UPPs representam o fim da desigualdade e da violência.

http://www.observatoriodefavelas.org.br/observatoriodefavelas/noticias/mostraNoticia.php?id_content=850

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