Raquel Rolnik*
Pesquisadores do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) divulgaram um estudo no qual apontam para a possibilidade de existência de uma bolha no mercado imobiliário brasileiro. Autores da pesquisa, Mário Jorge Mendonça e Adolfo Sachsida calculam que, no período de janeiro de 2008 até fevereiro deste ano, enquanto a alta nos preços dos imóveis chegou a 165%, caso do Rio de Janeiro, a inflação foi de 25%. Impulsionado por programas e incentivos do governo federal que ampliaram a oferta de crédito no mercado, este aumento dos preços é insustentável de acordo com o estudo.
Entretanto, em seu boletim institucional, a diretoria do Ipea contesta essa conclusão, argumentando que o volume de crédito imobiliário em relação ao PIB no país ainda é baixo para se falar em bolha. Nos EUA, por exemplo, o volume de crédito chegou a representar 65% do Produto Interno Bruto. O boletim mostra que no Brasil houve uma rápida expansão – de 1,5% do PIB, em 2007, para mais 5,5% este ano – mas sustenta que este valor ainda é baixo.
O fato é que, quando os preços dos imóveis aumentam 160% e a renda da população cresce 20, 30%, isso significa que, cada vez mais, menos gente vai poder pagar para adquirir um imóvel. Está em jogo, portanto, os efeitos dessa política no direito à moradia da população. Além do mais, existe uma tendência de alta também dos preços dos alugueis. Com os preços dos imóveis e alugueis cada vez mais caros, o acesso à moradia adequada ficará cada vez mais restrito.
O que incomoda no debate dos economistas é que a sustentabilidade do crescimento do crédito habitacional é tratada apenas do ponto de vista do equilíbrio financeiro do país, sem considerar o que significam essas altas de preços dos imóveis na vida das pessoas. Uma família que compromete parte considerável de sua renda no pagamento de um imóvel corre o risco de ter que rebaixar suas condições de vida – alimentação, saúde e educação, por exemplo – para conseguir pagar as prestações.
Outra importante questão que os economistas não levam em conta é como o aumento da oferta de crédito no mercado imobiliário tem afetado as cidades brasileiras, implicando numa realocação dos grupos sociais no espaço e, no limite, pode levar a um aumento da segregação. Isso porque, para os grupos de menor renda, diante da bolha dos preços, resta morar nas localizações mais periféricas da cidade.
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*Urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada.