Sem seleção brasileira, primeira Copa América de futebol indígena começa no Chile

Ideia inicial era sediar no Brasil, em 2014, mas dirigente diz que não houve apoio de Brasília; equipe chilena tem jogadores de quatro povos indígenas diferentes

Victor Farinelli – Opera Mundi

Depois de organizar (e conquistar) a Copa América, o Chile volta a sediar um evento esportivo continental: a Copa América de Povos Indígenas terá sua rodada inaugural nesta quinta-feira (16/07), no Estádio Municipal de Peñalolén, na periferia de Santiago. Primeira competição esportiva continental dedicada à população indígena, a copa terá a presença de oito seleções latino-americanas, mas não contará com a participação do Brasil.

A organização da competição é dividida entre o governo chileno, através do Ministério de Desenvolvimento Social, a ANPO (Associação Nacional Esportiva, Cultural e Social dos Povos Originários do Chile) e a Fundação Gol Iluminado, do ex-jogador Elías Figueroa — que foi zagueiro do Internacional de Porto Alegre durante os anos setenta.

A iniciativa surgiu em 2012, numa reunião da FIDPO (Federação Internacional Desportiva dos Povos Originários), em Medellín, na Colômbia. “A ideia inicial era que o primeiro evento fosse no Brasil, em 2014, aproveitando a Copa do Mundo, mas não contou com o apoio suficiente do governo brasileiro, então nós apresentamos nossa proposta de fazer este ano, pegando carona na Copa América, e o governo chileno nos deu o apoio que era necessário”, contou o presidente da ANPO, Nelson Coliñir.

A competição reúne seleções de oito países latino-americanos, divididos em dois grupos. O Grupo A, com sede em Peñalolén (comuna localizada na Zona Leste da região metropolitana de Santiago), reúne Chile, Peru, Paraguai e México, e terá sua primeira rodada nesta quinta-feira. O Grupo B tem como sede a cidade de Arica, no extremo norte do país, está conformado por Argentina, Colômbia, Equador e Bolívia, e começará a ser disputado na sexta-feira (17/07).

A final do torneio está programada para o dia 25 de julho, em Peñalolén. Vale destacar que a comuna foi escolhida para sediar os jogos na capital já que possui uma das maiores populações de indígenas urbanos do país: cerca de 12% dos moradores são mapuches, e eles representam 4% da população de origem indígena do país.

Chile: quatro povos diferentes

Outra razão importante para que o Chile fosse escolhido como sede da primeira Copa Americana de Povos Indígenas é o fato de que o país já vem desenvolvendo uma intensa agenda esportiva entre as comunidades indígenas nos últimos anos.

Em 2012, o Chile organizou seu primeiro campeonato nacional de futebol indígena, reunindo seis diferentes comunidades. O torneio já teve três edições, com três campeões diferentes: em 2012, o título ficou com os índios Rapa Nui (da Ilha de Páscoa), em 2013 com os Huilliche (da ilha de Chiloé) e em 2014 com os Mapuche (do centro-sul do Chile, região pré-patagônica). A atual seleção chilena é conformada por atletas dessas três comunidades, e também por jogadores da nação Aymara (do norte do país).

“Essa experiência de três torneios já disputados, e um já programado para o segundo semestre deste ano, nos dá a esperança de que possamos conquistar também este torneio, como o país fez com a Copa América”, comenta Coliñir, que utiliza o mesmo fator para apontar Argentina, Colômbia e México como os outros favoritos do torneio.

A comissão técnica da equipe chilena é comandada por um ex-jogador de descendência mapuche — Francisco Huaiquipán, meia que jogou no Colo-Colo entre 2002 e 2004. Além disso, a delegação já recebeu o apoio de outras figuras do futebol local, como os ex-atletas Elías Figueroa e Marcelo Salas, além do lateral-esquerdo Jean Beausejour, jogador chileno de paí haitiano e mãe mapuche, que foi campeão da Copa América no início deste mês. Em declaração durante a cerimônia de sorteio dos grupos para a Copa Americana, em junho, Beausejour disse que gostaria de encerrar sua carreira jogando em algum clube que representasse a nação mapuche, e que não descarta participar futuramente do campeonato de futebol das comunidades indígenas.

Entre os destaques da seleção chilena está o zagueiro mapuche Carlos Catribil, capitão do time, e o meia-atacante aymara Jaime Araya. Porém, o jogador mais popular da equipe é o centroavante rapa nui Koro Pate Tuki, que é professor de educação física e realiza um trabalho na ilha com esportes típicos. “Minha família trabalha há anos na organização de esportes nossos, como o haka pei [espécie de trenó rapa nui] e o tau’a [corrida levando cachos de banana pendurados no pescoço]”, conta ele.

Projetos futuros

A ANPO espera contar com o sucesso da Copa Americana para impulsar um novo projeto: o dos Jogos Olímpicos dos Povos Indígenas. Pelo menos no âmbito das organizações locais, os projetos da entidade ANPO deverão continuar contando com o apoio do governamental. Segundo Marcos Barraza, ministro do Desenvolvimento Social, “as boas ideias que busquem, não resgatar, mas vitalizar as culturas ancestrais do país, terão a nossa ajuda, para que o país possa conviver melhor com a sua diversidade”.

Entretanto, no futuro, a ideia de Coliñir é a de fazer algo mais ousado a nível internacional. “Vamos fazer o mesmo caminho do futebol, organizando primeiro os nossos eventos aqui no Chile, misturando alguns esportes olímpicos convencionais e os esportes típicos de cada comunidade, e depois vamos levar essa experiência até a FIDPO, para que possamos organizar um evento com países das Américas, África e Oceania”.

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SERVIÇO
Copa Americana de Povos Indígenas – primeira rodada:
Grupo A – Peñalolén, 16/07: Chile x Peru; e Paraguai x México
Grupo B – Arica, 17/07: Argentina x Colômbia; e Equador x Bolívia
A tabela completa da Copa Americana de Povos Indígenas está disponível no endereço oficial.

Foto: Presidente Michelle Bachelet recebeu os atletas da seleção de futebol indígena chilena no Palácio de La Moneda, na segunda (13/07)

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