A defesa de camponeses acusados por massacre de Curuguaty, no Paraguai, quer afastamento de juízes do caso. Deverá ser retomado em uma semana
Do OperaMundi / MST
“Não confio neste Tribunal de Sentença. Sabemos dos antecedentes de quem o preside. Não têm a coerência, nem a decência para levar adiante este julgamento tão sensível e simbólico para o país”. Assim o advogado de defesa de 11, dos 12 camponeses acusados pelo massacre de Curuguaty, Víctor Azuaga, justificou a recusa por ele apresentada com relação aos juízes que atuam no caso.
O julgamento foi retomado nesta quarta-feira (26/08), mas, pela sexta vez, o processo foi adiado. Os trabalhos deverão recomeçar em 2 de setembro.
O adiamento ocorreu após a camponesa Lucía Agüero renunciar à sua defesa, a exemplo do que foi feito pelos demais acusados em julho e o novo advogado, Pablo Aguayo, pediu tempo para se inteirar do processo. Azuaga também pediu a participação de três tradutores do idioma guarani, já que os acusados não dominam o castelhano.
Soma-se a isso o fato de Azuaga ter questionado, na Suprema Corte de Justiça, a participação dos juízes Ramón Trinidad Zelaya, que preside o Tribunal, Benito Ramón González e Samuel Silvero, alegando “falta de confiança”. Por considerar que o Poder Judiciário não justificou adequadamente a confirmação dos juízes, que foram recusados pela defesa, Azuaga pediu a suspensão do julgamento.
Massacre e golpe
No chamado massacre de Curuguaty, morreram 17 pessoas, sendo 11 camponeses e seis policiais. Somente os trabalhadores rurais, no entanto, estão sendo processados pela Justiça. Dez deles respondem por associação criminosa, invasão de terras e tentativa de homicídio. Dois são acusados de invasão de terras e outro de frustração da perseguição e execução penal, que no código penal paraguaio, significa impedir que outra pessoa seja condenada ou submetida a punição por atos ilegais que tenha cometido.
O fato foi utilizado pela oposição paraguaia para justificar o julgamento político, ou impeachment, do então presidente Fernando Lugo, em 22 de junho de 2012. À jornalista Natalia Viana, o ex-mandatário confessaria dois meses depois: “Eu sabia que iria terminar assim”. “O poder, mesmo, nunca foi meu”, como consta no livro da Agência Pública “O Bispo e Seus Tubarões”, que pode ser acessado aqui.
No processo, a Promotoria se baseia nos testemunhos dos agentes que participaram da operação e defende que os policiais foram vítimas de uma emboscada feita pelos ocupantes da terra.
Por outro lado, a defesa denuncia as diversas irregularidades existentes na causa, entre elas o fato de que o promotor do caso, Jalil Rachid, decidiu investigar apenas a morte dos seis policiais, deixando de lado os 11 camponeses que perderam a vida no episódio. Ela diz ainda que os ocupantes não eram mais do que 50, enquanto foram enviados mais de 300 policiais.
O julgamento dos camponeses, a maioria deles acusados por invasão de terras, ocorrerá sem que a titularidade das mesmas tenha sido resolvida na Justiça. Essa é uma das denúncias feitas pelos advogados de defesa e observadores internacionais. As terras onde ocorreu o massacre são chamadas de Marina Cue, que em guarani significa terras da marinha.
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Foto: Ativistas criticam fato de apenas camponeses serem julgados e nenhum policial, sendo que 11 trabalhadores morreram