J. Rosha, do Cimi Norte I (AM/RR)
Funcionários da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Tapauá, no Amazonas, juntamente com policiais da delegacia local estão sendo acusados de espancar e torturar o indígena M. P., de 16 anos de idade, para que ele confessassasse o suposto assassinato de seu primo de 10 anos, que ficou desaparecido por oito dias e foi encontrado perdido na floresta.
A denúncia foi encaminhada ao Ministério Público Federal (MPF) em Manaus. M. P. é indígena do povo Palmari, morador da comunidade indígena Castanheira, localizada às margens do Rio Itaparanã, em Tapauá, município localizado no sul do Amazonas, distante de Manaus cerca de 450 quilômetros em linha reta.
Depois da tortura ao menor, o pai dele, R. G., teria encontrado dificuldades para registrar a ocorrência na delegacia e para fazer exame de corpo de delito no hospital da cidade. Além disso, as testemunhas do caso estariam sendo ameaçadas pelos agressores.
De acordo com relato da vítima, o fato aconteceu entre os dias 1 e 3 de julho passado, ocasião em que se realizava naquela cidade a Conferência Local de Política Indigenista. M. P. disse ter sido vítima de intimidação por parte de policiais. Depois, teria sido preso e torturado como forma de pressão para que ele levasse três funcionários da Funai ao local onde supostamente teria enterrado a vítima.
Os fatos
No dia 26 de junho, o jovem indígena foi tirar patauá (fruta típica da região amazônica) na floresta em companhia de seu primo C. F., de 10 anos de idade, a pedido da mãe deste. Eles saíram e M. P. levou uma espingarda e então se deslocaram até onde pretendiam tirar patauá. No retorno para casa, eles se depararam com um bando de queixadas (porco da mata). M. P.resolveu correr atrás dos animais para tentar matar algum e deixou o primo para trás, pedindo para que ele o esperasse no mesmo local. Quando voltou não encontrou mais o garoto. Voltou para casa preocupado, e ao saber que C. F. não tinha chegado em casa, ele e toda a família passaram seis dias procurando o menino desaparecido na floresta.
No dia 2 de julho, sem terem encontrado C. F., que todos os membros da família consideraram que provavelmente estivesse morto, M. P., seu pai e seu tio, recebendo conselhos de familiares da criança desaparecida, decidiram se deslocar para a sede do município de Tapauá voluntariamente para prestar depoimento na delegacia de polícia civil e assim colaborar com as investigações.
Os policiais já esperavam o grupo no porto de Tapauá. Dali, foram até a delegacia, onde os policiais mandaram o pai de M. P.e seu concunhado, responsável pela criança desaparecida, voltarem para casa. Eles retiveram o menor na delegacia e o interrogaram sobre o desaparecimento do seu primo na presença do conselheiro tutelar, com a promessa deste de que não deixaria ninguém maltratar M. P.. No entanto, um dos policiais teria sugerido que M. P. havia assassinado Cláudio Antônio e ameaçou agredi-lo fisicamente se não confessasse ter matado a criança. M. P., intimidado, acabou confessando.
Ele passou a noite preso. No dia seguinte sofreu agressão física com chutes, sob ameaça de sofrer mutilação e ficou algemado numa árvore. O presidente do Conselho Tutelar, Roni da Silva Costa, teria acompanhado a ação dos funcionários da Funai e da polícia, mas nega ter presenciado a tortura. “Se aconteceu foi longe da minha presença”, disse Roni da Silva.
C.F. foi localizado na tarde do dia 3 de julho. Ele ficou perdido na mata durante oito dias e estava desnutrido e muito enfraquecido. Ele foi internado durante seis dias na unidade de saúde de Tapauá e passa bem.
A família de M. P. quer justiça e punição para os seus agressores, mas tem sido dissuadida pelas autoridades locais e pressionada a não levar o caso adiante. Porém, já relatou o ocorrido ao Ministério Público Federal em Manaus. O representante da Coordenação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (Coipam), Fidelis Baniwa, e dirigentes da Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp), enviaram carta de repúdio à Funai em Brasília cobrando averiguação dos fatos e exigindo punição dos envolvidos nas agressões ao jovem indígena.