Katja Majcen – Rio On Watch
No dia 18 de junho, a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto (CDURP) do Rio de Janeiro sediou a segunda audiência pública sobre o Plano Habitacional Participativo para a área do Porto, na sequência de uma reunião introdutória no dia 10 de junho.
O evento teve uma platéia de cerca de 150 pessoas e foi iniciada pelo presidente da CDURP, Alberto Gomes Silva, que apresentou uma versão resumida do diagnóstico da semana anterior referente a uma série de mapas e tabelas desenvolvidas pelo Instituto Pereira Passos (IPP) e o IBGE.
Enquanto apontava para um mapa comparando a densidade demográfica nos diferentes bairros da Região Portuária (mapa abaixo), Silva destacou que “a densidade demográfica e a quantidade de pessoas que moram nessa região, em relação com o tamanho da região, é pequena, e por isso é possível trazer mais pessoas para morarem aqui”.
O mapa mostra a densidade populacional na Área Portuária. As linhas vermelhas representam as favelas, as linhas azuis representam os complexos de apartamentos e as linhas roxas delineiam o projeto do Porto Maravilha.
Ele apresentou diferentes faixas de renda (veja abaixo) dizendo que “a população predominante é de 0 à 6 salários mínimos”, com a faixa de maior renda localizada na área mais ao sudeste, no encontro das avenidas Presidente Vargas e Rio Branco. Embora, como mostrado pelo mapa de uso da terra apresentado na mesma reunião, esta área é principalmente uma pequena zona comercial e a grande maioria das residências na região portuária se encontram na faixa mais baixa, entre 0 e 3 salários mínimos.
O mapa mostra a distribuição das diferentes faixas de renda na região portuária. As linhas vermelhas representam as favelas, as azuis representam os complexos de apartamentos e as roxas delineiam o projeto Porto Maravilha.
Em resposta a tabela apresentada pelo IBGE no começo da reunião, constatando que quase metade da população da região portuária vive em casas alugadas, enquanto a maioria do restante possui casa própria, um morador da Pedra Lisa salientou que: “Por muitos anos o bairro ficou sem obras, não tinha nada. Agora sim e estamos preocupados. Nós que somos moradores de muitos anos. O que será feito de nós? Pagamos aluguel, todo mundo paga aluguel e ninguém é proprietário. Depois que tudo fica maravilhoso vai ser uma área para rico. Ao mesmo tempo não temos um posto de saúde”.
Este encontro, o segundo do tipo para decidir sobre um plano participativo para habitação social na área, foi menos bem recebido que o primeiro. Isto se tornou notável quando o encontro foi aberto para questões e comentários do público, e vários pontos críticos foram trazidos a tona. Muitos moradores expressaram suas preocupações com a crescente pressão para deixar a área, quer diretamente, devido as notificações de remoções inesperadas, ou indiretamente, através de incontroláveis aumentos no aluguel, os quais, em um certo momento se tornam inacessíveis para as famílias predominantemente de baixa renda, levando a expulsão de moradores para periferias distantes.
Pedra Lisa é a área mais vulnerável do Morro da Providência, economicamente e em termos de qualidade de habitação. As comunidades foram oficialmente declaradas Áreas de Especial Interesse Social (AEIS), destinado ao desenvolvimento de programas habitacionais de interesse social para as famílias de baixa renda (com renda inferior a seis salários mínimos). Suas terras são reguladas por uma legislação especial criada no âmbito do decreto inicial para o projeto Porto Maravilha de reurbanização do Porto.
Orlando Santos Junior, professor de planejamento urbano da UFRJ, revela que “por lei, a operação urbana foi criada com a justificativa de produção de habitação de interesse social e por isso é fundamental que a gente conte os projetos de habitação de interesse social”. Ele ainda menciona que um amplo número de ocupações “de construções públicas e prédios privados vazios” na área portuária, poderiam ser usados como moradias sociais, como pode ser visto em alguns casos de sucesso desenvolvidos pelo programa municipal Novas Alternativas.
Ele continua dizendo: “Além dos dados do IBGE, a gente precisa trabalhar com outros indicadores, coletados e compartilhadas com o público. A vida do dia-a-dia é importante para entendermos as necessidades da moradia e não é só construir quatro paredes. Precisamos de informações fundiárias da área. A maioria das famílias na área vive em condições precárias e é fundamental ter acesso as informações e saber sobre a situação, a fim de desenvolver uma habitação condigna para todos”.
Outro professor mencionou o caso de 2013 onde somente 1% de todo o programa de desenvolvimento habitacional do Minha Casa Minha Vida na Região Metropolitana do Rio de Janeiro–que consistia em 73.000 unidades–eram para ser construída na região portuária. “Essas 60 unidades foram licenciadas de uma forma muito fragmentada, dividida. A gente precisa ter a possibilidade de discutir a terra pública vazia ou abandonada, para reduzir essa fragmentação”.
A região portuária parece estar diante de uma luta sem fim para garantir os direitos à terra para seus ocupantes, fazendo o caminho de volta a história da escravidão e a criação dos quilombos urbanos. Hoje, o CDURP e a Prefeitura parecem estar se movendo em direção a um plano participativo para a área, muito aguardado, que tem sido uma exigência legal para a reconstrução da região portuária desde o início do projeto. Os resultados do processo serão anunciados depois de uma série de seis audiências públicas quando, em agosto, o documento final da consulta pública será apresentado para a Secretaria Municipal de Habitação (SMH).
As reuniões acontecem nos escritórios da CDURP na Rua Sacadura Cabral na região portuária. Já houveram mais duas reuniões nos dias 2, 9 julho e a próxima será no dia 30 deste mês.