As perspectivas para os povos indígenas não são boas no próximo mandato presidencial, independente do candidato que sair vitorioso das urnas no próximo domingo. Apesar de acenos às vésperas das eleições, tanto Aécio Neves (PSDB) quanto Dilma Rousseff (PT) vêm sinalizando com propostas que significam obstáculos à demarcação de novas Terras Indígenas (TI), principal reivindicação dos povos indígenas
Instituto Socioambiental – Isa
O tema dos direitos indígenas teve uma visibilidade inédita nesta campanha eleitoral. Ironicamente, acabou sendo pautado pelos ruralistas. A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) realizou uma sabatina com os presidenciáveis onde o assunto ganhou destaque, ainda em agosto (veja aqui).
Hoje, a três dias do segundo turno, a presidente divulgou uma carta endereçada aos povos indígenas em que promete aprovar, no Congresso, o Estatuto dos Povos Indígenas, parado na casa há mais de 20 anos, e a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), bandeiras do movimento indígena. Também promete regulamentar a consulta prévia, instrumento previsto pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O texto não assume nenhum compromisso objetivo com a demarcação de TIs, mas a divulgação da carta, às vésperas do 2º turno, reforça que a disputa por votos segue acirrada em um cenário de empate técnico entre Aécio e Dilma.
“Hoje, todos sabemos, existem desafios na esfera jurídica para podermos avançar na demarcação das terras indígenas no país, principalmente nas regiões centro-oeste, sul e nordeste. Temos que enfrentar e superar estes desafios respeitando a nossa Constituição”, diz o texto (leia o documento).
O histórico de Dilma no tema não a favorece. Ela tem o pior desempenho na demarcação de TIs desde a redemocratização (veja aqui). Em seu mandato, as demarcações foram paralisadas. De forma sintomática, o programa de governo que está no site oficial da petista não contém a palavra “indígena”.
O Ministério da Justiça guarda na gaveta uma proposta que pretende incluir nos processos de demarcação ministérios e órgãos como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o que deverá enfraquecer o papel da Fundação Nacional do Índio (Funai) e dificultar ainda mais a oficialização de novas TIs. Dilma recebeu os povos indígenas apenas uma vez, no ano passado, depois que os protestos tomaram o País, em junho.
Desde a administração Lula e também na atual, a Convenção 169 vem sendo desrespeitada, com populações indígenas e tradicionais não sendo consultadas sobre grandes obras e outras medidas que as afetam diretamente.
Compromisso com propostas ruralistas
Já o programa de governo de Aécio Neves tem muito mais menções aos povos indígenas, mas também não traz nenhum compromisso objetivo de destravar as demarcações. “Entendemos que o governo Dilma Roussef tem sido negligente na questão da demarcação das terras indígenas”, afirma o documento publicado pelo candidato do PSDB, em 12/10, em resposta às condições definidas por Marina Silva para apoiá-lo no segundo turno. O texto traz uma novidade: promete criar um “Fundo de Regularização Fundiária” para indenizar produtores rurais que ocupam TIs (leia o documento).
Em compensação, Aécio comprometeu-se com a mesma proposta ruralista, encampada pelo governo, de incluir outros órgãos públicos nos processos de demarcação. Também já declarou que as condicionantes definidas na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o caso da TI Raposa-Serra do Sol (RR) devem servir de orientação para outras demarcações. A proposta também é alvo de protestos do movimento indígena por significar restrições aos direitos territoriais indígenas.
“Para nós, a preocupação continua total. Sendo Aécio ou Dilma, o peso grande vem do Congresso”, analisa Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Ela lembra que a bancada ruralista fortaleceu-se nessas eleições e que muitos parlamentares indigenistas não conseguiram reeleger-se.
De acordo com Sônia, o foco do próximo governo, independente do candidato vencedor, será o crescimento econômico, o que deverá significar aumento das ameaças contra as terras e direitos indígenas. Pessoalmente, ela não acredita que Dilma Rousseff vai tirar do papel as promessas feitas agora e que um governo de Aécio traga avanços efetivos para os povos indígenas.
O movimento indígena bem que tentou, mas não conseguiu ser recebido num encontro formal nem por Aécio nem porDilma. Apenas Marina Silva recebeu as lideranças indígenas.
A Apib publicou e enviou aos dois candidatos, na semana passada, uma carta criticando as ações do governo para os povos indígenas nos últimos anos e cobrando compromissos de ambos, em especial com a demarcação das TIs.