Por Bruno Pavan
Do Brasil de Fato
Milhares foram às ruas em junho e julho do ano passado levantando as mais variadas bandeiras. O resultado, à primeira vista, foi satisfatório e os aumentos no transporte público foram revogados em praticamente todas as capitais do Brasil.
Nada disso, porém, evitou que o brasileiro elegesse o Congresso Nacional mais conservador desde 1964, segundo estudo do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). A renovação na câmara chegou a 40%, mas houve aumento significativo de militares, religiosos, ruralistas e empresários nas cadeiras. Isso significa que o próximo presidente terá dificuldades em fazer avançar pautas progressistas no legislativo a partir do ano que vem.
Guilherme Boulos, do MTST, argumenta que a fadiga da população com o PT vem produzindo alternativas à direita e não à esquerda. “Não foi só a elite que votou nos conservadores, senão não teriam tido tantos votos. Os trabalhadores, o povo das periferias urbanas também faz parte desta onda”.
O professor Pablo Ortellado aponta que a esquerda precisa de uma reorientação em seu discurso. Ele entende que essa ascensão conservadora acontece porque o debate entre direita e esquerda não acontece mais no ramo social e econômico, mas sim, nas questões morais.
“Ao invés da oposição entre liberais que defendem a livre-iniciativa e socialistas que defendem a justiça social, temos uma oposição entre conservadores e progressistas em assuntos morais. Essa segunda clivagem não é a mesma que a que opõem liberais e socialistas, mas normalmente se articula com ela”, avalia.
Segundo ele, o que aconteceu é que, há alguns anos, os conservadores foram bem-sucedidos em migrar o debate público para essa chave moral e com isso avançaram politicamente com uma agenda preconceituosa e punitiva. “A esquerda, ao meu ver, não entendeu ainda essa mudança que altera os termos do campo discursivo e exige que reorientemos a nossa retórica, só que numa moralidade oposta, compreensiva e tolerante”, explicou Ortellado.
Após a confirmação desse cenário nada otimista para as lutas progressistas no legislativo, muitos começaram a se perguntar qual teria sido, afinal de contas, o saldo das “jornadas de junho” em 2013. O desejo difuso de mudança manifestada nas ruas, para muitos, atrapalhou um possível avanço progressista.
O irmão Marcelo Barros entende que o recado de mudanças das ruas chegou às urnas, mas não houve a preocupação de mudar para melhor. Thiago Pará, do Levante, considerou frágeis as referências políticas e organizativas dos envolvidos, mas reconheceu que elas abriram uma nova conjuntura para as lutas sociais.
A importância da reforma política
Na outra ponta da corda, cresceu muito pouco a representatividade das mulheres, negros e indígenas na política nacional. De acordo com estudo do professor da UERJ Luis Augusto Campos, 71% dos deputados eleitos se declararam homens e brancos para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 15% são pardos e 3,5% pretos. As mulheres representarão quase 10% da Câmara. Somente 1,6% delas são pardas e 0,6% pretas.
A única forma de corrigir essa diferença, de acordo com Nalu Farias, seria que se convocasse um plebiscito pela Constituinte exclusiva para a reforma política, proposta que já foi encampada por dezenas de movimentos e contou com mais de 7 milhões de votos favoráveis.
“Precisamos de um sistema que garanta a inversão da representação hoje, ainda muito marcada pelos privilégios econômicos e de exclusão da classe trabalhadora e de setores comprometidos com as mudanças. Mas também consideramos que nessa representação deverá incluir as mulheres, os negros/as, jovens, indígenas, camponeses”, disse.
Além da desigualdade econômica, a falta de espaço na mídia também alerta os movimentos para a importância da democratização da imprensa no Brasil. Para Thiago Pará, a falta de democracia no processo eleitoral brasileiro transfere a decisão para a grande mídia e os empresários, e acaba favorecendo a eleição de congressistas com perfil conservador.