Sem representação parlamentar desde 1986 e diante de um Congresso mais conservador, suas reivindicações terão ainda menos chances de serem ouvidas
por Karina Gomes, Deutsche Welle
O índio Daniel Leme Vasquez e outras 39 lideranças guaranis-kaiowás passaram a madrugada de quinta-feira 16 acampados em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. Sem terras demarcadas, eles pedem proteção federal às centenas de famílias que vivem em barracas de lona à beira da estrada em Mato Grosso do Sul.
“Viemos reivindicar nossos direitos, que têm sido continuamente violados. Só queremos viver dignamente. Sempre recebemos ameaças de fazendeiros, não temos água potável”, conta Vasquez.
Sem uma representação de fato no Congresso Nacional, os índios tentam ter voz se articulando em entidades de classe, mas encontram diversas barreiras para ingressar na política. Nestas eleições, apenas 80 indígenas se candidataram aos cargos de deputado estadual e federal, e três pleitearam vagas no Senado. Nenhum foi eleito.
Os povos indígenas, que somam 817 mil pessoas, representam 0,4% da população brasileira, de acordo com o IBGE. O único índio que se tornou parlamentar na história do país foi o cacique xavante Mário Juruna. Eleito em 1986, o ex-deputado federal pelo PDT do Rio de Janeiro foi responsável pela criação da Comissão Permanente do Índio na Câmara dos Deputados.
“São candidaturas difíceis de serem construídas. E, se eleitos, eles teriam dificuldades para enfrentar a agenda do Congresso. Eles também são minoria entre a população em termos estatísticos”, diz Carmela Zigoni, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), que fez um levantamento sobre a composição parlamentar da próxima legislatura.
Segundo Carmen Junqueira, professora titular do Departamento de Antropologia da Faculdade de Ciências Sociais da PUC/SP, a falta de representação indígena no Congresso não faz muita diferença no âmbito da política institucional, já que as ações federais no setor são de atribuição do Executivo.
“Com o Congresso dominado por ruralistas e partidos mais à direita, é difícil articular demandas indígenas. Seria bom que eles pudessem participar, mas não pensando que vão alcançar maiores direitos”, avalia. “Eles vão conseguir muito mais por meio das suas próprias associações do que com o Congresso Nacional.”
Para entidades de defesa de direitos dos índios, a representação parlamentar é desequilibrada em favor dos setores contrários às demandas dessa parcela da população. E o financiamento privado de campanha é um dos principais fatores.
“Grupos de madeireiros, mineradoras e empreiteiras financiam e conseguem eleger parlamentares que vão usar seus mandatos para defender os interesses desses conglomerados econômicos”, afirma o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto. “Candidatos que se comprometem com as causas indígenas não encontram esse apoio e têm dificuldade em se eleger.”
Além disso, as lideranças indígenas enfrentam barreiras para entrar em partidos e participar de jogos políticos de aliança, rompimento e troca. “Há muito preconceito contra nós dentro das legendas. É muito difícil conseguirmos entrar na política”, afirma o índio Daniel Vasquez, que pretende se candidatar a vereador para as eleições municipais, em 2016.
A pesquisadora Marta Maria do Amaral Azevedo, do Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Unicamp, avalia que, apesar dos entraves, os povos indígenas avançaram na questão da representatividade no Poder Executivo, estando presentes em vários conselhos de saúde, educação e de política indigenista.
“Por outro lado, temos verificado uma diminuição do apoio da sociedade às causas indígenas devido à luta pela terra e, sobretudo, por causa do preconceito existente dentro dos partidos contra a presença de indígenas”, opina.