Passando pelo Centro de São Paulo com alguns amigos jornalistas, na madrugada deste domingo (5), presenciamos uma cena que, provavelmente, se repetiu em muitos dos locais que estão hospedando as 530 mil urnas eleitorais do país. Pessoas contratadas pela campanha de um deputado cobriam a calçada em frente a um dos postos de votação com milhares de santinhos numa sanha de como se não houvesse amanhã.
A tática é velha conhecida dos cabos eleitorais e, pelo que apurei, adotada por todos os partidos políticos, sem preconceito ideológico ou fisiológico, desde que a repressão à campanha de boca de urna se fez presente. Sua função vai além de um “lembrete” para reforçar o número para os esquecidos. Há eleitores que seguem para o local de votação sem candidato ou candidata definidos, principalmente para deputado federal ou estadual. Parte deles tem vergonha de não contar com um número para digitar naquele momento de orgasmo da democracia. Não sabem o que é voto na legenda e, talvez, mesmo se soubessem não faria muita diferença. Muitos preferem apelar para um santinho pego no chão.
Sim, há quem ache que está fazendo algo de errado ao votar branco ou nulo.
Apesar do bombardeio no rádio e na TV, não fixaram um candidato ou candidata. Sintoma de uma campanha parlamentar que não consegue chegar a quem não costuma participar ativamente da vida pública de seu país, não possui acesso a fontes de informação nem está em um ambiente propício ao debate e à discussão públicos. Próprio de uma estrutura eleitoral que, através da injeção de recursos financeiros, se aproveita da alienação para manter tudo como está.
Sei que a maior parte dos leitores e leitoras deste blog não decidiu seu candidato ou candidata (ou um voto nulo consciente) com base em um santinho jogado no chão.
Mas gostaria de pedir que refletissem uma última vez sobre sua escolha para representantes no Legislativo. Pois o “santinho jogado no chão” pode assumir diversas formas – um pedido do marido da filha de um amigo que está trabalhando na campanha, uma propaganda simpática na TV, a promessa de algum favor futuro ou presentinho dado de forma indevida, o efeito “eu voto em quem ganha, não voto em perdedor”, a inércia do tipo “sempre votei nela/nele, por que mudar?” e o pior: “não faz diferença mesmo”.
Acabamos tão preocupados com os cargos para a Presidência e os governos estaduais ou distrital que esquecemos que esses outros três votos vão falar por nós no dia a dia dos parlamentos, fazer ou barrar leis e, pasmem, zelar pelo funcionamento do Executivo. Reclamamos de um Congresso corrupto e incompetente, mas somos nós que colocamos eles lá.
De certa forma, o Congresso é o reflexo da população. Talvez não daquilo que ela gostaria de ser, mas daquilo que ela efetivamente é.
Se quiserem mostrar que podemos ser melhor do que aquilo que está lá hoje, ajudem a garantir isso, neste domingo. Há boas pessoas fazendo um bom trabalho, independente do partido. Pessoas que já estão no parlamento e honraram a função que exerceram e outras disputando pela primeira vez, cheias de gás e de ideias. Ainda dá tempo de pesquisar, conversar, discutir.
“Mas isso vai atrasar o frango assado do almoço de domingo, japonês!” Sim, que atrase. Pois, depois, serão quatro ou oito anos em que você ficará como corresponsável pelo monstrinho que ajudou a criar. Afinal, jabuti não sobe em poste sozinho.