No evento realizado em 26 de maio, SPU confirmou a posse do terreno pela comunidade cigana no bairro São Gabriel e se comprometeu a estudar aumento da área para 35.000m²
Belo Horizonte. Foi publicada nesta sexta-feira, 13, ata da audiência pública realizada pelo Ministério Público Federal (MPF) no último dia 26 de maio, em que autoridades e representantes de órgãos públicos municipais, estaduais e federais discutiram a situação de invisibilidade dos povos ciganos que vivem em Minas Gerais, bem como a implementação de políticas públicas para reverter esse quadro.
O evento, realizado no acampamento Calon, no bairro São Gabriel, em Belo Horizonte, foi aberto pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão, Edmundo Antônio Dias, com a afirmação de que os povos ciganos vêm sendo alvo de preconceitos históricos, que acabam resultando na sua exclusão de diversas políticas públicas.
Dias ressaltou a necessidade de inclusão escolar de membros da comunidade cigana, destacando a importância de preservação das línguas faladas pelas diversas etnias, bem como da disponibilização de ensino bilíngue. O ensino na língua materna é uma garantia prevista na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, o que inclusive motivou Recomendação expedida em 2013 pelo MPF/MG às Secretarias de Educação do Estado de Minas Gerais e do município de Belo Horizonte, relatou.
A representante da Secretaria Municipal de Educação, Mara Evaristo, informou que as demandas da comunidade cigana são muitas, e que as crianças do acampamento estão sendo bem acompanhadas. De acordo com Mara Evaristo, já foi dado início à alfabetização de jovens e adultos, mas ressaltou a necessidade de se conhecer melhor a cultura cigana, para poder ensinar todas as crianças, promovendo-se o respeito às crianças ciganas nas escolas.
Em seguida, o presidente da Associação Guiemos Kalons (AGK), Carlos Amaral, disse que o apoio à causa cigana vem crescendo e que cada dia mais portas se abrem para a comunidade, mas afirmou que a comunidade ainda sofre com o preconceito. Relatou também a falta de diálogo com a Administração municipal. “O governo tem uma dívida com os ciganos, e para pagar essa dívida só com ação”, afirmou o presidente da AGK.
O preconceito também foi citado pela presidente da Associação Internacional Maylê Sara Kali (ASMK), Elisa Costa, como fator de destruição de culturas. Ela defendeu que as comunidades ciganas têm de se fazer ouvir, para impedir seu extermínio cultural. “O povo cigano, queiram ou não, fez e faz parte da história brasileira. O povo cigano não busca favoritismo ou privilégios, mas apenas o reconhecimento de seus direitos”, afirmou.
Patrimônio cultural
A invisibilidade dos ciganos também foi citada pela defensora pública da União, Giêdra Pinto Moreira, que ressaltou a importância da liderança exercida pelo presidente da Associação Kalon, Carlos Amaral, para a superação desse problema.
De acordo com a juíza Federal Dayse Starling, da 7ª Vara Federal de Belo Horizonte, é preciso garantir os direitos básicos e o direito à moradia dos povos ciganos, assim como de todas as comunidades do entorno. Ela também ressaltou a importância da cultura cigana e o direito do povo brasileiro à multiplicidade cultural e à preservação das culturas tradicionais.
A Coordenadora Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Belo Horizonte, Rosângela da Silva, reforçou a necessidade de se combater o racismo contra a população cigana. Ela disse que, em parceria com a AGK, protocolou um pedido na Secretaria Municipal de Patrimônio Cultural para reconhecimento da comunidade cigana como patrimônio cultural de Belo Horizonte. Informou também que o órgão irá realizar eventos nas comunidades ciganas de BH para prestar informações sobre programas sociais relativos a temas como saúde, casamento coletivo, registro civil e esportes, de modo a possibilitar a inclusão dos ciganos em tais programas.
Também compareceram à audiência pública outros representantes de secretarias estaduais e municipais, bem como da Polícia Civil.
Reconhecimento territorial
A Secretaria de Patrimônio da União (SPU/MG), que está promovendo a regularização patrimonial do terreno em que vive a comunidade Calon, foi representada por Osmar Lins. Ele explicou que, embora o processo ainda não esteja concluído do ponto de vista formal, a área já pertence à comunidade. “A SPU está empenhada em resolver a questão. O problema é que a concessão de direito real de uso coletivo não pode ser assinada neste momento, porque há um parecer da consultoria jurídica proibindo a formalização de tal ato em ano eleitoral”, disse.
Estudo realizado pelo Núcleo de Estudos de Populações Tradicionais da UFMG (Nuq/UFMG) apontou a necessidade de uma área de 35 mil metros quadrados como necessária à preservação do modo de vida dos ciganos Calon, como vem sendo defendido pelo MPF. Posteriormente, laudo técnico elaborado pelo grupo de estudos Morar de Outras Maneiras, da Escola de Arquitetura da Universidade Federal, ratificou a necessidade de ampliação da área já certificada pela SPU, de 21.745m², ao sustentar que parte significativa dela não é edificável.
Clique aqui para ler a ata da audiência pública.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.