Na Argentina, elas foram reprimidas por baionetas quando indagaram, em 1977, pelos filhos presos. Os generais golpistas debocharam: “son las locas de Plaza de Mayo”. Obstinadas, não desistiram, continuaram ocupando a Praça de Maio, desfilando o seu protesto semanal diante da Casa Rosada e da catedral até que, finamente, reconhecidas pela sociedade, contribuíram para o fim da ditadura e a prisão dos torturadores.
No Brasil, vários movimentos nos fizeram ouvir a voz de quem foi silenciado. No entanto, como ninguém entende línguas indígenas, nem se interessa por aprendê-las, não se escuta o clamor dos índios, seja de mães indígenas por seus filhos ou de índios por seus pais desaparecidos. Desta forma, os índios, sempre invisíveis na historia do Brasil, ficaram de fora das narrativas e não figuram nas estatísticas dos desaparecidos políticos. Na floresta, não há praças de maio.
Mas agora isso começa a mudar. Relatório do Comitê Estadual da Verdade do Amazonas, que será em breve publicado pela Editora Curt Nimuendajú, de Campinas (SP), começou a mapear os estragos, comprovando que na Amazônia, mais do que militantes de esquerda, a ditadura eliminou índios, entre outros, Cinta-Larga e Surui (RO/MT), Krenhakarore na rodovia Cuiabá-Santarém, Kanê ou Beiços-de-Pau do Rio Arinos (MT), Avá-Canoeiro (GO), Parakanã e Arara (PA), Kaxinawa e Madiha (AC), Juma, Yanomami e Waimiri-Atroari (AM/RR).
O foco do primeiro relatório, de 92 páginas, já encaminhado à Comissão Nacional da Verdade (CNV), incide sobre os Kiña, denominados também como Waimiri-Atroari, cujos desaparecidos são conhecidos hoje por seus nomes, graças a um trabalho cuidadoso que ouviu índios em suas línguas, consultou pesquisadores e indigenistas, fuçou arquivos e examinou documentos, incluindo desenhos que mostram índios metralhados por homens armados com revólver, fuzil, rifles, granadas e cartucheira, jogando bombas sobre malocas incendiadas. (mais…)