Rio On Watch – Terça-feira, 18 de março, a Associação de Moradores do Vidigal, o Fórum Intersetorial do Vidigal, o Albergue da Comunidade, e a Comunidades Catalisadoras realizaram o primeiro debate inaugurando um ciclo de quatro debates que compõem o evento Fala Vidigal, discutindo o processo de gentrificação em andamento na comunidade. Como os preços continuam a subir, muitos moradores estão enfrentando a difícil questão de saber se eles podem ou não continuar a viver nas suas casas, bem como, o que significa este processo na composição social, econômica e cultural da comunidade.
Iniciado às 19:00 hs, no anfiteatro, lotado na entrada do Vidigal, o primeiro evento “Fala Vidigal” reuniu cerca de 250 moradores, tanto do Vidigal quanto de outras comunidades do Rio, para discutir as questões envolvidas na gentrificação. Marcelo da Silva, presidente da Associação de Moradores do Vidigal, anfitrião do evento, apresentou lideranças de várias organizações e comunidades que fizeram apresentações e falaram sobre o processo de gentrificação por vários ângulos.
A primeira metade do debate consistiu em apresentações destinadas a preparar o terreno para o debate aberto que se seguiu. Paulo Muniz, um morador de longa data e músico envolvido nas lutas contra as remoções na comunidade em 1970, iniciou o evento com a apresentação desta importante história do Vidigal. Ele foi seguido por Dora Figueiredo, socióloga e moradora há 30 anos, que explicou a origem histórica das favelas como habitação a preços acessíveis. Theresa Williamson, urbanista e diretora executiva da Comunidades Catalisadoras, em seguida, explicou o conceito e processo de gentrificação e como, tradicionalmente, se desenrola em outros contextos, e em seguida, aplicou ao contexto carioca. Na seqüência, o jornalista e doutorando Pedro Barreto discutiu o papel da mídia no processo. E, finalmente, Sara Junger, moradora e fundadora do Albergue da Comunidade, apresentou sua organização, que é responsável por oferecer estadias em casas na favela, com a intenção de salvaguardar a capacidade dos moradores de permanecer em suas casas e preservar a cultura local, assegurando que os moradores de longa data estejam fazendo a hospedagem para visitantes, ao invés de especuladores externos. Sara falou sobre o papel e iniciativa dos moradores do Vidigal.
Após estas apresentações, o debate foi aberto ao público, com moradores e lideranças de outras comunidades dando depoimentos eloquentes e profundamente preocupantes. Os primeiros palestrantes foram lideranças de várias comunidades do Rio, que discutiram a natureza similar dos problemas em suas comunidades, empolgando o público. André Constantino, morador da Babilônia e membro do movimento Favela Não Se Cala, definiu o clima do debate, falando com paixão: “Já estamos vivendo a gentrificação… precisamos nos unir. Acorda morador! Acorda Vidigal! Acorda favelas! Não podemos deixar isso acontecer, e deixar ir embora quem faz parte de nossa história”. Ao final de seu discurso, o público inteiro estava animado, com muitos prontos para falarem sobre os problemas que estão enfrentando. O debate prosseguiu com depoimentos de lideranças de Indiana, Vila Autódromo, e a vizinha Chácara do Céu.
Uma série de moradores do Vidigal veio para frente e fizeram discursos acalorados. Aline Fernandes, presidente da Associação de Mulheres de Ação e Reação (AMAR), pegou o microfone e logo declarou: “Eu não vejo nada de bom na gentrificação”, e falou sobre como o processo, em curso na comunidade, tem afetado negativamente moradores do sexo feminino que foram excluídos do recente desenvolvimento econômico na comunidade, e também aos jovens que não sabem se serão capazes de crescer na comunidade em que os seus antepassados ?foram criados.
Danilo, cuja esposa é nascida e criada no Vidigal, foi retirado de sua casa em 2010, devido ao risco de deslizamento declarado pelas autoridades. Ele foi dado um aluguel social de R$400,00. Danilo falou sobre como o aluguel no Vidigal tem aumentado e que o valor mínimo é de R$800,00. Portanto, mais recentemente, ele viveu com sua esposa e quatro filhos em um porão, antes de desistir da vida em sua comunidade, tendo que mudar-se para a Baixada Fluminense, a duas horas de distância. Danilo descreve sua angústia: “[Meus filhos] perderam os seus amigos, porque a prefeitura nos enganou. Com R$400,00 eu não posso viver em lugar nenhum… Eu não aguento mais. O aluguel é muito caro. Eu não tenho condições de pagar R$800,00 aqui no Vidigal. Eu tenho um trabalho, assim como minha esposa. Mas não podíamos nos dar ao luxo de ficar mais no Vidigal…Minha casa ainda está lá! Por que eles não constroem um muro de contenção que beneficiaria vários moradores da comunidade?”. Outros moradores falaram sobre as suas preocupações e frustrações, envolvendo a praça em um debate vivo e preparando o terreno para os próximos eventos a serem realizados no Vidigal.
O próximo debate está agendado para 08 de abril, e irá se concentrar no que os moradores do Vidigal desejam para o futuro de sua comunidade, definindo quais são as qualidades que eles não querem perder no processo em andamento. As qualidades existentes na comunidade que os moradores querem preservar serão detalhadas, bem como os desafios que os moradores querem que sejam abordados. O “Fala Vidigal” terá o seu terceiro debate no dia 06 de maio, onde os novos empresários que entraram na comunidade, terão a oportunidade de partilhar as suas intenções para a comunidade, e o debate final, no dia 03 de junho, irá convidar as autoridades públicas para discutir os seus planos para a comunidade e ouvir os moradores.
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