BA – “Há um racismo claro no Brasil”, afirma professor de arte

Francisco: "Ser negro antes de tudo é ser lindo!"
Francisco: “Ser negro antes de tudo é ser lindo!”

Por Raul Castro e Vitor Gabriel, em Correio

O professor de arte Francisco Cruz do Nascimento, 54, desenvolve ações de valorização das tradições de comunidades quilombolas. Articulador cultural da Agir – Associação Guardiã da APA (área de preservação ambiental) do Pratigi, instrumento de integração social entre as comunidades do Baixo Sul da Bahia, e vice-diretor do Colégio Estadual Paulo César da Nova Almeida em Ibirapitanga, o educador tem sido reconhecido pelo seu trabalho. Em 2009, Nascimento conquistou o prêmio Referência Nacional em Gestão Escolar na categoria Destaque Brasil, pelo Colégio Estadual Casa Jovem II, localizado na zona rural de Igrapiúna. Três anos depois, e pelo mesmo colégio, venceu o Prêmio Escola Voluntária, com o projeto Teatro e Poesia, fortalecendo identidades em comunidades. Em entrevista a SOMOS, o educador nascido e criado no bairro de Pernanbués, em Salvador, falou sobre Comunidades quilombolas, Dia da Consciência Negra e racismo no Brasil.

História de Pernambués

Para falar sobre Pernambués é interessante dizer que o bairro, junto com Cabula, faz parte de um quilombo urbano. Eles abrigavam várias fazendas, dentre essas fazendas tinha a Santa Clara, que deu origem ao bairro. Pernambués é um quilombo urbano não reconhecido por decreto, mas, que se auto-reconhece nas pessoas no modo de viver. Na maneira de ser e nas histórias das pessoas da comunidade. Algumas histórias contam apenas da fazenda, mas esquece de dizer que lá é um quilombo urbano vivo, atuante e um foco de resistência da negritude baiana.

Ser negro
Ser negro antes de tudo é ser lindo! É ser diferente, ter uma alma livre. É ser liberto, é poder festejar, celebrar a ancestralidade a todo instante. É se reconhecer como um ser potencialmente capaz, que mesmo estando dentro de uma sociedade que o discrimina, ele tem poder sobre seu destino.

Consciência Negra

O dia 20 de novembro é hoje um marco representativo para que a gente possa discutir políticas públicas para a população negra do Brasil. É um momento para discutir e aprofundar a nossa participação, interação e principalmente o foco na educação e no projeto de vida social das comunidades negras. Hoje, com a Lei 10.639, que fala da obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Africana e Afro-Brasileira e a 2.288, que é o Estatuto da Igualdade Racial. Esses projetos têm entrado nas escolas ainda de uma maneira incipiente, não ganhou ainda a força necessária para que a gente possa ter na educação, de modo geral, um processo de conquista de espaço e conscientização da população negra. Para a revelação de um espírito que tá vivo e não morto. Porque Zumbi vive em cada um de nós que resiste que luta por igualdade e justiça dentro da sociedade.

Comunidades Quilombolas

Quando a gente fala de comunidade quilombola está se falando de um povo que é diferente, mas que não é exótico. É um povo simples que tem sua maneira própria de viver e de se relacionar com o mundo, principalmente respeitando a natureza. Os quilombos têm sofrido constantes abalos no seu domínio territorial. Hoje, eles estão conquistando uma política de diversidade que entende as comunidades quilombolas como diferenciadas, porém, que precisa ser assistida pela legislação brasileira. Hoje essa população remanescente de quilombo continua atuando, ela está viva e lutando cada vez mais pra garantir os seus direitos à terra.

Racismo no Brasil

Há um racismo claro no Brasil, não podemos negar. A Bahia é racista assim como o Brasil. Mas estamos superando isso, e parte dessa superação passa pelo poder de auto-reconhecimento das pessoas ao se identificarem como negras nesse país. Quem é negro sabe o que sofre e as dificuldades que têm para ingressar no mercado de trabalho. Ainda hoje a juventude negra não tem as oportunidades suficientes. Além de tudo, quando se fala de uma cultura negra no Brasil ainda há um olhar discriminatório, há pessoas que ainda acham que é uma cultura menor. E nós temos que lutar contra isso, porque não é um racismo oculto como se diz, é um racismo muito claro. Quem é negro sabe, sente, sofre e vive isso todo dia.

Cultura Afro-Brasileira

É bom que a gente conte a história do povo negro, fale da herança negra cultural da África para que os nossos estudantes possam se ver representados dentro dessa culturalidade. Não podemos esquecer que dentro da nossa multiculturalidade há a cultura negra, que está viva e precisa ser mostrada e discutida.

Igualdade e oportunidade

O Estado deve dar Igualdade de condições para todos. A diferença entre o jovem negro e um branco está nas oportunidades, que deveriam ser iguais. Então, se não oferece educação de qualidade para a juventude negra e pobre das periferias, como pode pôr fim à situação de extermínio que tem vitimizado muitos jovens negros nas periferias da nossa cidade? Há uma necessidade de luta e conscientização. Precisamos reagir de forma coletiva, para podermos sobreviver a esse extermínio perverso e brutal que estamos vivendo hoje.

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