Por Gustavo Marinho, da Página do MST
Antes de raiar o sol, 2000 camponeses já estavam de pé prontos para dar início à Marcha em defesa da Reforma Agrária, em Alagoas, nesta segunda-feira (4). Com destino à Maceió, os movimentos sociais do campo se concentraram no acampamento Sede, em Murici, palco de grandes conflitos agrários do estado.
A Marcha por Terra e Justiça é uma iniciativa do MST, Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST), Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL) e Comissão Pastoral da Terra (CPT), e cobra do governo federal e estadual a democratização da terra.
“Dilma parou a Reforma Agrária. E quando chega essa época do ano o presente que o governador quer nos dar é botar a polícia para expulsar as famílias das terras, passar o natal na rua”, afirmou Zé Roberto, coordenação nacional do MST.
Há mais de 10 anos cerca de 400 famílias acampadas vivem nas fazendas São Sebastião (Atalaia), Cavaleiro, São Simeão ou Sede e Bota Velha (Murici). Entretanto, estão sofrendo o medo de um despejo a qualquer momento.
“O governo federal e estadual e o Incra fecham os olhos para a situação dessas pessoas e de mais 8 mil famílias que vivem às margens das BRs em Alagoas. Ao mesmo tempo, cedem aos caprichos dos usineiros e latifundiários que devem bilhões aos cofres públicos”, afirmou Carlos Lima, coordenador da CPT.
Para Débora Nunes, do MST, atualmente a luta pela terra enfrenta uma forte ofensiva, “pois ela vai no central da riqueza das elites do nosso país. E nós, trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra, cumprimos um papel muito importante, que é o de recuperar a dignidade sugada por essas elites”, afirmou.
Débora também destacou a importância da marcha, já que “mais de 80% dos assentamentos que temos hoje só foram conquistados por conta das marchas e das lutas dos trabalhadores”.
Só com pressão
Frei Betto, durante sua vinda à Maceió na Bienal Internacional do Livro, fez críticas a falta de investimentos na Reforma Agrária e defendeu à luta camponesa. “Era uma promessa de todas as quatro campanhas do PT e os resultados são pífios frente às necessidades e as urgências do Brasil”.
Frei Betto ainda lembrou do fato de termos “um crescimento do latifúndio e do agronegócio, invasão da Amazônia, devastação de muitas áreas do Brasil, de modo que creio que todos nós, brasileiros e brasileiras, temos que fortalecer esses movimentos que lutam pela terra. As marchas precisam ser fortalecidas porque governo é que nem feijão, só funciona na panela de pressão”.
Questionado sobre a possibilidade de despejo das antigas Fazendas em Alagoas, completou: “Penso que os governos têm que agir para evitar despejos, afinal são pessoas pobres, estão no direito de receber uma terra e na expectativa de uma Reforma Agrária. E não tem sentido favelizar essas pessoas e levá-las para debaixo da ponte com uma expulsão sumária a base do tacão policial”.
Os movimentos sociais do campo convocam toda sociedade para apoiar e marchar com os trabalhadores, juntos por um futuro de igualdade e fraternidade. “Precisamos unificar as lutas dos trabalhadores da cidade e do campo para repartir a terra e seus frutos. Assim será possível acabar com a fome e as desigualdades”, afirmou Josival de Oliveira, do MLST.
Histórico das áreas
Fazenda São Sebastião – Atalaia
Parte da massa falida da antiga Usina Ouricuri, a área é ocupada por 120 famílias e coordenada pelo MST. Além da produção dos trabalhadores rurais, o acampamento conta com a Escola Itinerante Rosa Luxemburgo. Nessa área foi assassinado, em 2005, o dirigente estadual do MST, Jaelson Melquíades, tombado pelas mãos dos latifundiários da região.
Em 12 de dezembro de 2012 as famílias foram despejadas pela Policia Militar de Alagoas, e no dia 8 de março de 2013 foi reocupada. O clima na região é bastante tenso e já foi expedida outra ordem de despejo, inclusive com pedido de prisão de lideranças.
Fazenda Cavaleiro ou Bulangi – Murici
O imóvel foi ocupado em 18 de setembro de 2003 por 75 famílias Sem Terra, coordenadas pelo MTL. As famílias foram despejadas, em fevereiro de 2011 de forma violenta pela policia militar de Alagoas com uso de bombas e balas de borrachas, vários camponeses foram feridas. Atualmente vivem de forma precária em barracas de lonas na BR 104.
O imóvel faz parte da massa falida da usina São Simeão, atualmente a usina Santa Clotilde explora o imóvel e foi a autora do pedido de reintegração de posse.
Fazenda São Simeão/Sede – Murici
Ocupada por 120 famílias sem terra e coordenadas pelo MLST, as famílias construíram casas de taipas, escolas para crianças, jovens e adultos, salão de reunião, conquistaram energia elétrica e cultivam Macaxeira, banana, feijão, milho, batata, abacaxi, abobora, hortaliças.
Quando as famílias ocuparam a propriedade as terras improdutivas estavam abandonadas pela Usina São Simeão pertencente às famílias Omena e Nogueira que são devedoras do INSS, impostos federais e estaduais, companhia energética, passivo trabalhista. O INSS estava adquirido por conta de dívidas trabalhistas, estranhamente foi arrendada pela Usina Santa Clotilde S/A, que entrou com o pedido de reintegração de posse na Vara Agrária que concedeu liminar favorável à usina. O despejo pode acontecer a qualquer momento.
Bota Velha – Murici
Ocupada em 2002 por 102 famílias Sem Terra, coordenada pela CPT, as famílias que moram e plantam nas terras, possuem produção agroecológica (hortaliças, macaxeira, inhame, abóbora, melancia, feijão, etc) e uma pequena criação de animais (galinhas, ovelhas, patos), ocupam 60 hectares do total da fazenda. No local, existe energia elétrica, as casas algumas são de alvenaria e uma casa de farinha.
Nos últimos três anos a Usina Santa Clotilde vem ameaçando as famílias de despejos, destruição das lavouras, das casas e de outras benfeitorias construídas nos últimos 11 anos.
Confira a nota da Marcha pela Terra e por Justiça:
Marchamos por Terra e Justiça
A nossa marcha é uma denúncia pública do descaso dos governos Federal e Estadual para com as famílias Sem Terra e Assentadas no Estado de Alagoas.
O governo da presidente Dilma, retirou a reforma agrária da pauta – não atualizou os índices de produtividades, não limitou o tamanho da propriedade da terra, não investiu na infraestrutura dos assentamentos. Quando o tema é Reforma Agrária, a presidente Dilma detém a marca de pior desempenho, desde a redemocratização do país.
O afastamento do governo da luta histórica das famílias camponesas é resultado da opção pela aliança estabelecida com a bancada ruralista em nome da “governabilidade”. Esta aliança vai custar aos cofres públicos, em 2013, aproximadamente 13 bilhões de reais em renúncia fiscal; em 2003, a renúncia foi de 684 milhões de reais (fonte: site da SRF). Outro fato gritante é a abertura do governo brasileiro para a compra de terra por parte de estrangeiros: 2,6 milhões de hectares estão nas mãos de não brasileiros, colocando em risco a soberania alimentar e hídrica.
Quanto mais o governo Dilma se aproxima do agronegócio exportador, mais se distancia da reforma agrária e, consequentemente, das famílias camponesas que historicamente foram excluídas do uso da terra. Condenando os assentamentos ao esquecimento e colocando os acampamentos sem terra na invisibilidade.
Em Alagoas, o monocultivo da cana de açúcar e a força do “poder econômico” dos usineiros se constituíram num obstáculo político à realização da Reforma Agrária. Os usineiros além de explorarem os canavieiros, inclusive com prática de trabalho escravo, devem a previdência pública, aos bancos públicos, a Eletrobrás, aos cortadores de cana, aos fornecedores… “a Deus e ao mundo”. Devem e não pagam.
Na rota de ignorar as oito mil famílias sem terras que vivem as margens das BRs ou em fazendas, o governo Teotônio Vilela pretende destinar cerca de 30 mil hectares de terra para o plantio de eucalipto destinado a produção de celulose e energia. Perpetuando Alagoas na condição de importadora de 75% alimentos consumidos pelos alagoanos.
O cenário contrário criado pelas elites que capturaram o ESTADO brasileiro e alagoano impõe aos que lutam pela reforma agrária e aos apoiadores, um processo intenso de mobilização contra as ofensivas do modelo econômico e político e ações organizativas de superação da realidade imposta. A correlação de força não será alterada no processo eleitoral, mas nas ruas, nas praças, nas ocupações.
Acreditando nas iniciativas que nascem do povo, nas organizações de bases que desejam transformar a estrutura agrária de Alagoas, decidimos marchar 60 km, saindo de Murici, mata norte de Alagoas, em direção à Maceió.
Especificamente, marchamos em defesa de cerca de 400 famílias que reivindicam, há mais de dez anos, os imóveis São Sebastião (Atalaia), Bota Velha, Sede e Cavaleiros (Murici), com a exceção de Cavaleiros, que as famílias foram vítimas de um despejo violento promovido pela Polícia Militar em 12 de dezembro de 2012, as famílias moram e plantam nas terras. Possuem uma boa produção agroecológica (hortaliças, macaxeira, inhame, abóbora, melancia, feijão, etc.), criação de animais, energia elétrica, algumas casas de alvenaria, escolas, casas de farinha. No entanto vivem sob ameaça constante de despejos.
Marchamos porque queremos denunciar o silêncio do ESTADO com essas famílias. A presidente Dilma, o Ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas; o Presidente do INCRA, Carlos Guedes; a Superintendente do INCRA/AL, Lenilda Lima e o governador de Alagoas, Teotônio Vilela, todos foram informados da situação e negligenciam, se recusam e tomarem uma posição de ESTADO em defesa das famílias e cedem aos caprichos econômicos da Usina Santa Clotilde que insiste nos despejos das áreas localizadas em Murici. Aliás, a Usina Santa Clotilde em 2011 foi incluída na lista suja do trabalho escravo, quando 401 trabalhadores foram libertos.(fonte: http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/governo-federal-adiciona).
Insistiremos na tese de que essas famílias devem continuar nas terras ocupadas e que o Estado tem a obrigação de garantir a terra e condições de vidas dignas no campo.
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST), Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL) e Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Murici/Alagoas, 04 de novembro de 2013
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.