Eduardo Sá – Articulação Nacional de Agroecologia (ANA)
Na manhã desta terça-feira (19), três representantes de movimentos das mulheres do campo fizeram uma análise, sob a perspectiva rural, da conjuntura nacional e internacional. A realidade latino-americana foi o principal tema em discussão. A mesa deu continuidade às atividades do I Encontro Nacional do Movimento das Mulheres Camponesas (MMC), que está ocorrendo em Brasília (DF) até a próxima quinta-feira (21).
De acordo com Eliane Martins, do movimento Consulta Popular, o Brasil vive um contexto especial com a ascensão do Partido dos Trabalhadores (PT) ao poder, graças a uma grande aliança com os setores conservadores do sistema capitalista. Segundo ela, sempre vivemos em crise, com pouca chance de estudos e dinheiro, mas é um momento para os movimentos sociais melhor que durante os governos anteriores.
“Vivemos a época do des: desemprego, desqualificado, desclassificado e desenvolver. Mas nós queremos nos envolver, disputar a economia, uma busca por outra lógica da vida e não do lucro. Estamos enxergando algumas brechas nesse governo para conquistas, mas são insuficientes. Está difícil de nos organizarmos, existe uma cultura dizendo que cada um tem que se virar por si. Estamos indo na contramão. Embora a mídia diga todos os dias que movimento social é algo desqualificado, querendo nos isolar, o que a gente faz tem fundamento: é a luta pela vida. Não desanimem, continuem na organização por um país melhor”, destacou.
A maioria das participantes do encontro está pela primeira vez vivenciado um evento nacional, o que corresponde a uma renovação do MMC desde seu congresso em 2004, constatou Noeli Welter, da coordenação do movimento. Ela criticou o modelo de produção do agronegócio, que funciona com base na monocultura de exportação defendida pela televisão todos os dias, levando em consideração que a agricultura camponesa é responsável por 75% da comida na mesa do brasileiro. Noeli questionou a plateia, e apenas um terço das mulheres disse ter titulação de suas terras, o que, segundo ela, significa a exclusão produzida pelo atual modelo.
“Quanto mais terra e possibilidades tivermos na mão, aumentaremos nossa produção apesar das dificuldades para vendermos nossos produtos. Produzimos com diversidade, mesmo com pouca terra e crédito, através da agroecologia. O agronegócio fica com os latifúndios e só produz 25% para o país. Provoca doenças pelo uso extensivo de venenos, principalmente o câncer. Dizem que esse modelo vai sustentar os povos, e a gente vê pessoas sem acesso à alimentação, sobretudo saudável. Sem falar na destruição da natureza e da biodiversidade. Trouxe a modernidade, mas está nos matando”, observou a militante.
Ela explicou ainda que as mulheres camponesas lutam por outro projeto de agricultura, com a recuperação das sementes crioulas para a fartura e alimentação saudável da sociedade. Welter ressaltou também que é preciso combater a violência contra mulher, com grande número de assassinadas, inclusive do ponto de vista patrimonial no que diz respeito à autonomia financeira.
“Construir novas relações entre homens e mulheres, e dividir as tarefas. Tudo é fruto do sistema capitalista, que só quer gerar o lucro. Precisamos continuar lutando por créditos subsidiados para produção, ser fortes e conquistar mais mulheres para nossa causa. Estudar, construir lideranças, unir as organizações para construir um projeto popular para o mundo. Assumir os espaços de decisão e poder para conquistar nossos direitos. Não queremos produzir alimento saudável para os ricos, e sim para o povo. Precisamos de crédito e reforma agrária para nos dar condições”, concluiu.
Para fazer uma contextualização do cenário mundial, sobretudo da América Latina, a colombiana Elza Nury, coordenadora da Via Campesina na América do Sul, analisou a crise mundial. Ela destacou a ascensão do neoliberalismo nos últimos anos como prejudicial aos povos, após o rompimento do modelo socialista da URSS.
“Isso tem gerado mais crises para os trabalhadores, estudantes e pessoas saindo às ruas contra a pobreza e a miséria. As mobilizações não tiveram êxito na Europa, pelo contrário, os governos de direita têm subido ao poder. Lá a organização social não tem a mesma força que na América latina, por isso o desemprego atinge mais de 70% na Espanha, principalmente jovens e mulheres. Acreditamos que não é só uma crise econômica, ela atinge o sistema político e social”, explicou a colombiana.
Nury descreveu os três modelos de governo em curso na nossa região, e sustentou que a América Latina vive hoje um momento diferente com desenvolvimento social e econômico popular. “Na América latina existe a direita, aliada ao imperialismo dos EUA, com a Colômbia, Chile e Panamá; o desenvolvimento nacionalista, que não enfrenta o modelo do capital, com Brasil, Argentina e Paraguai. Outros têm resistido mais, mas não pode se dizer que são revoluções, porque têm enfrentado dificuldades para mudança do sistema, como Equador, Bolívia e Venezuela. Para nós é um orgulho Cuba ter transformações estruturais, apesar do bloqueio há mais de 50 anos”, observou.
A seguir segue um panorama da região aos olhos da representante das mulheres camponesas na América do Sul: Rafael Corrêa se reelegeu com mais de 50% de votos no primeiro turno, é preciso que ele radicalize mais sua proposta para mudar seu país. Na Venezuela, embora o processo esteja concentrado no Chávez, a população está dedicada às mudanças no país: É possível que a revolução se mantenha sem seu comandante. É preciso que os movimentos sociais e políticos na América Latina deixem de lado suas diferenças para uma união democrática. Em Honduras e no Chile a oposição tem chance de vencer. A unidade entre nossos países tem se ampliado em busca de melhores condições, embora a criação de tratados de livre comércio com a Europa e EUA mostre a entrega de alguns países. Nos resta resistir e buscar a unidade dos movimentos, todo o povo latino-americano, por uma mesma causa pela necessidade de todos. “Mantemos solidariedade com Cuba contra o bloqueio, com Chávez pelo processo bolivariano, contra o golpe no Paraguai, e uma campanha mundial pela reforma agrária com condições para produzir. Vamos seguir resistindo contra a mercantilização do alimento, contra os agrotóxicos e transgênicos, em defesa da agroecologia nesses territórios”, apontou.
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Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.