Movimentos de moradia em longas jornadas por justiça e direitos

Assembleia Popular denuncia morosidade em políticas de regularização fundiária

Vista do bairro do Tatuquara, em Curitiba, destinado a programas de moradia (Foto: João Henrique Stahlke/Sanepar)

Pedro Carrano

A reportagem se aproxima e os moradores saem à beira da porta, temerosos. Vivem há 40 anos no bairro Santa Quitéria, em uma região valorizada da capital paranaense. Agora, a ansiedade é cotidiana diante de uma iminente ação de despejo concedida pela Justiça. A proposta da Prefeitura de Curitiba para as famílias? A realocação dos moradores para o bairro do Tatuquara, na periferia-extrema da cidade, destinada a programas de moradia.

Lideranças de seis áreas urbanas ameaçadas de despejo forçado, em más condições de realocação ou em longo processo de regularização fundiária, reuniram-se com a Companhia de Habitação de Curitiba (Cohab – CT), em 9 de novembro, como desdobramento de ato realizado em 4 de outubro – nos marcos da Semana Mundial dos Sem Teto.

Entre as áreas com representantes estavam aquelas ligadas ao processo de formação da Assembleia Popular: as Vilas Nova, Nina, Nova Esperança e Conquista, além de Moradias Camargo e Jardim Eldorado. A articulação dessas áreas em luta oferece um quadro da situação de falta de moradia adequada na capital paranaense. Em comum entre elas, a localização na zona sul, distantes do planejamento urbanístico e das regiões valorizadas.

Mais do que situações pontuais, cada grupo de moradores expressa uma situação comum a 254 ocupações irregulares na cidade, ao passo que, em contradição, 56.300 domicílios estão vagos (de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE), o que conforma 10% do total de unidades na cidade.

Curitiba, dessa forma, assume o posto de quinta cidade com maior porcentagem de favelas e aglomerados (8%), semelhante a São Paulo. Além de ser, desde 2010, considerada a 17ª cidade mais desigual do mundo, de acordo com informações da organização de direitos humanos Terra de Direitos.

Do mercado

A reunião em geral foi dispersa, embora tenha contado com a presença do presidente da Cohab, Ibson Campos e, sobretudo, do atual secretário de Habitação do Município, Osmar Bertoldi (DEM), empossado há três meses. Participaram também representantes de movimentos sociais no campo da moradia: a União Nacional de Moradia Popular (UNMP) e Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM).

No plano geral, ainda que a reunião tenha apontado encaminhar questões referentes às demandas das comunidades, e revelado informações importantes sobre a atual situação das áreas, a impressão é de dificuldade de implantação de uma política de moradia inclusiva por parte dos órgãos públicos. Como o próprio Secretário admitiu ao final da reunião, não há mecanismos de disponibilidade de casas na região central da cidade, onde o índice de imóveis vazios é alto. Na falta de ações no sentido de limitar a especulação imobiliária, a saída é retirar as comunidades para o extremo-sul de Curitiba. “É a última fronteira”, admitiu Bertoldi, em vista da valorização da terra nas regiões do centro. Na versão da Cohab, a questão se define pela falta de recursos junto ao Governo Federal – iniciada em 2009 – e a operacionalidade de programas como o “Minha Casa, Minha Vida” junto às empreiteiras do ramo, que fazem “operações tartaruga” para pressionar por um lucro maior nos projetos. “Estamos na tarefa de relicitar todas essas obras do PAC que estavam paradas. É bom deixar claro que para isso o município dispõe de R$25 milhões do Orçamento municipal para as obras do PAC e a Cohab dispõe de mais R$ 30 milhões, que ela não tem, para finalizar”, informou Bertoldi.

A situação fica ainda mais incontornável com a valorização imobiliária crescente e o aumento da demanda popular por habitação. De acordo com dados da Companhia, em Curitiba e Região Metropolitana (RMC), a demanda saltou de 2589 famílias inscritas na fila da Cohab, no ano de 2000, para 27189 famílias à espera de moradia em 2010. O total acumulado de inscritos, entretanto, alcança 85.516 famílias. Grande parte das inscrições atinge a faixa de renda de 01 a 02 salários mínimos (mais de 30%), ao passo que a faixa de 03 a 04 salários mínimos representa 20% das inscrições.

Porém, trabalhadores com menores salários, e que apresentam a maior demanda reprimida, em geral não são atendidos, de acordo com lideranças como Osmano Reis, da Assembleia Popular. Por sua vez, Hilma Lourdes dos Santos, dirigente nacional do MNLM, questionou a baixa criação de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). “Há a vulnerabilidade de quem ganha até 1 salário mínimo. Acredito que na faixa de 0 a 3 seja a que mais precisa, tem que ser integrada na cidade, e a gente não está tendo isso. Não tem terra em Curitiba? Tem, mas para o mercado. Temos que brigar para que se aprove mais áreas para serem Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)”, falou Hilma, para quem é urgente reformular as leis municipais no que se refere à habitação.

http://www.brasildefato.com.br/node/8537

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