Por Manoela Vianna*, Fundação Heinrich Böll
Cerca de 200 indígenas de 13 povos do Baixo Tapajós ocuparam hoje (13) pela manhã a sede do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em Santarém (PA).
A ocupação acontece por diversas reivindicações das comunidades indígenas, principalmente em protesto a um projeto de comercialização de créditos de carbono florestal na Resex Tapajós-Arapiuns, promovido por uma articulação formada por ICMBio, FUNBIO, Biofílica e financiamento da ICCO Cooperation. O projeto vem sendo implementado sem a realização das consultas prévias com as comunidades indígenas, obrigatórias, de acordo com a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.
“Uma das pautas que a gente tem com essa ocupação é repudiar o projeto de crédito de carbono e o projeto de manejo florestal dentro do Arapiuns tanto na Resex quanto na Flona [Floresta Nacional do Tapajós] e pedir que o ICMBIO mostre para a gente que não há nenhuma contestação [à demarcação] dentro da terra indígena Bragança, Taquara e Marituba,” explicou Iannuzy Tapajós Mota, coordenadora do Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns.
Para Mota, o projeto Carbono Florestal da Resex Tapajós-Arapiuns deve ser interrompido: “A gente tá esperando que parem […] Porque a gente precisa saber qual é o modelo que este programa quer adentrar nas terras indígenas. Nós não temos conversa, nós não temos diálogo, chamamos para conversar, criar a metodologia, a oficina, mas nós fomos recusados por várias vezes.”
Em reunião na mesma sede do ICMBio, realizada no dia 5 de agosto, com a presença do Ministério Público Federal do Pará, servidores do instituto e representantes das comunidades, foi colocado que no caso desta proposta do ICMBIO, como em outros projetos que afetam populações tradicionais, a Convenção 169 está sendo relativizada: “Se apresenta como necessário um recomeço do processo de diálogo e informação, dessa vez com base na Convenção, sobretudo levando em consideração o ineditismo e complexidade do tema”, afirmou o procurador da República Camões Boaventura, que esteve na reunião, de acordo com as informações publicadas pelo MPF. “É preciso desconstituir a ideia de que a execução do projeto é inevitável, o que viciaria o caráter livre da consulta”, declarou o procurador.
Outra reivindicação colocada pelo grupo na ocupação é o reconhecimento de territórios indígenas no Baixo Tapajós que estão com os processos interrompidos: “a Funai até o momento silencia, não dá nenhuma resposta para a gente, não tem os GTs [grupos de trabalho], os grupos de técnicos para vir fazer os estudos antropológicos, delimitar as nossas terras que a gente está precisando.” A biodiversidade e os povos das cercanias do rio Tapajós estão ameaçados com a construção de uma hidrelétrica e a demarcação de terras indígenas poderia ser um entrave para as obras. O leilão da usina chamada de São Luiz do Tapajó estava previsto para este ano, mas acabou sendo adiado para 2016, com a justificativa de problemas no licenciamento ambiental.
Segundo Pedro Martins, advogado da Terra de Direitos que está acompanhando a ação, trata-se de uma ocupação legítima dos indígenas que demandam o direto de participação e consulta e querem falar diretamente com os gestores da Resex. “Entre as reivindicações, estão a demarcação das terras indígenas de Taquara e Bragança dentro da Flona e, além disso, há projeto de transformar a região de Alter do Chão em uma unidade de conservação, mas os Borari também reivindicam a demarcação de suas terra no local,” explicou Pedro.
Até o momento não houve violação ao direito de ocupação do prédio público, e os indígenas permanecerão no local até que sejam ouvidos por representantes da FUNAI e do ICMBIO de Brasília.
Sobre a convenção 169 e as consultas: A consulta prévia está prevista na Convenção 169 da OIT para qualquer medida que afete comunidades tradicionais, como indígenas, ribeirinhos, quilombolas, agroextrativistas e diversas outras populações que mantêm relação diferenciada com o território onde vivem. O objetivo é o de respeitar o direito dessas comunidades à autodeterminação, à escolha do próprio futuro e à manutenção de modos de vida que atravessam gerações, de acordo com o site do MPF do Pará. Megaempreendimentose como Belo Monte e outros projetos são acusados de descumprimento da convenção, trazendo danos irreversíveis para as populações tradicionais.
*Com informações de Pedro Martins da Terra de Direitos
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Imagem: ICMBIO, o carbono é dos indígenas, mas o crédito é seu? Diz faixa de protesto.. Photo: Pedro Martins. All rights reserved.