Um levantamento realizado pela CPT de Marabá, junto à Justiça federal de Belém no Pará, aponta que tramitam 33 ações penais envolvendo terras públicas federais ocupadas por sem-terras no sul e sudeste paraense que poderiam ter desapropriação imediata
Aproximadamente 5.500 famílias poderiam ser assentadas em mais de 242.809 mil hectares de terras. Porém, vários desses processos, conforme revela a CPT, sofrem com a morosidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) por mais de cinco anos. Um dos principais entraves revelados pela pesquisa seria as relações políticas entre o Incra regional de Marabá e os fazendeiros da região.
“O Incra sofre muita pressão para desapropriar essas áreas por parte dos fazendeiros que exerce um poderio econômico e político muito grande sobre o órgão”, diz José Batista Afonso, advogado da CPT, que acompanha a maioria dos casos em litígio. Um dos mais poderosos, o grupo Santa Barbara do banqueiro Daniel Dantas estranhamente não consta na lista das fazendas envolvidas judicialmente.
Sem vistoria
Essas são apenas as áreas vistoriadas pelo Incra e verificadas com diversas irregularidades, entre elas, a grilagem de terra.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) denuncia que outro montante de terras, sobretudo numa extensão que liga Curionópolis a Parauapebas, pela PA 250, teriam sido apropriadas indevidamente pelos fazendeiros. “Já pedimos a vistoria nessas terras às margens da rodovia em agosto de 2011, mas até agora a entidade não nos apresentou resultado nenhum”, reclama Tito Moura da coordenação estadual do MST-Pará.
Para José Batista, o Incra sabe perfeitamente da situação, mas não tem interesse de atender a demanda das famílias por terra. “O instituto sabe que no sudeste e sul do Pará tem terras públicas griladas, improdutivas, com trabalho escravo, com crime ambiental, aptas juridicamente para fins de reforma agrária, mas não faz a vistoria para não comprar briga com os latifundiários”, protesta.
O caso emblemático
Um dos casos mais exemplares da conivência do poder legislativo do Pará, Incra e fazendeiros é a Fazenda Fazendinha. Desde agosto de 2010, 200 famílias ocupam 350 hectares da área com o acampamento Frei Henri. “Essas terras da Fazenda Fazendinha era umas dessas áreas griladas, que tivemos que ocupar para ter alguma reação dos órgãos públicos competentes e chamar atenção da opinião pública sobre a questão”, conta Tito Moura.
Assim, como já relatou o Brasil de Fato em edições anteriores, os acampados sofrem há pouco mais de um ano com as repetidas investidas violentas de pistoleiros a mando do fazendeiro Darlam Lopes, grileiro da terra.
Com duas vitórias na Justiça contra o latifundiário, as famílias não entendem porque o juiz não dá o veredito fi nal. “Já ganhamos a terra, mas a Justiça parece demorar de propósito”, percebe o senhor Baiano, acampado no acampamento Frei Henri.
O juiz responsável pelo processo é Ricardo Beckeraeh da Silva Leitão da 1ª Vara Agrária Federal de Marabá. A reportagem do Brasil de Fato não conseguiu encontrá-lo até o fechamento dessa edição. A primeira ação penal vencida pelos acampados foi contra o despejo e a segunda foi a decisão do programa Terra Legal que negou a regularização da área a pedido de Darlam Lopes, sendo destinada para fi ns de reforma agrária.
“O juiz Ricardo somente teria que juntar todas as partes das ações penais favoráveis aos sem terra e dar a sentença final desapropriando parte da fazenda”, explica Batista. Tito Moura acusa o Incra de ter virado “um grande balcão de negócios para os grupos empresariais nacionais e internacionais que grilam terras no Pará”.
Alta produção de orgânicos
Se a reforma agrária é benéfica às famílias necessitadas de áreas agrícolas para viver, na atual conjuntura onde o Brasil é o maior consumidor de venenos do mundo, a distribuição de terras também poderia sanar tal problemática.
É o que já ocorre no acampamento Frei Henri. “Hoje somos os únicos produtores de hortaliças orgânicas do mercado de Parauapebas, numa terra que há dois anos não produzia nada. Então por que não dar a terra para gente, que estamos dando uma função social para ela?”, indaga seu Baiano, um dos produtores.
O potencial de produção de produtos orgânicos no acampamento já abastece as grandes redes de supermercado da cidade. São 500 mil kits vendidos de cebolinha, cheiro-verde, além de a mesma quantidade ser escoada para a cidade de alface, maxixe, pimentão e jiló. Ainda, feijão, milho e macaxeira garantem na mesma proporção, em dadas épocas próprias para o plantio, o abastecimento do mercado de Parauapebas.
“Tudo orgânico e sem cobrança adicional por conta disso, como muitos produtores já fazem nas grandes feiras e supermercados”, chama atenção o acampado Alberto Costa. As roças do Frei Henri são organizadas de maneira comunitária. Dessa forma, todas as famílias precisam produzir e consequentemente tiram o seu sustento da atividade agrícola.