Terreiros contra o preconceito

Adeptos de religiões de matriz africana iniciam movimento para conscientizar a sociedade de que não são seitas que cultuam o mal e reivindicam mais respeito

Luciana Passos

Mesmo sendo legais no Brasil, as religiões de matriz africana ainda sofrem preconceito de outros segmentos religiosos. De acordo com a representante da Associação Cultural de Preservação do Patrimônio Bantu (Acbantu), em Juazeiro, Ioná Pereira, o preconceito maior é por parte dos evangélicos que segundo ela ainda possuem a mente muito fechada. “Eles veem as religiões afrodescendentes como seitas que trabalham buscando o mal”, declarou.

De acordo com Ioná, que é adepta do candomblé, esse preconceito é demonstrado no dia a dia através de gestos, palavras e ações. “As pessoas se recusam a ficar perto da gente quando percebem somos do candomblé, outros não deixam que seus filhos se aproximem ou convivam conosco, alguns se benzem quando passamos, além disso, ouvimos muitas indiretas com comentários maldosos”, informou.

A mãe de santo Euzinha confirma as atitudes preconceituosas citadas por Ioná, mas destaca que elas já foram bem mais intensas alguns anos atrás. Segundo a mãe de santo, quando ela entrou no candomblé, precisava esconder sua identidade para ser aceita nas casas. “Para muitas pessoas eu era conhecida como a filha da lavadeira, para comprar velas em grande quantidade era preciso encontrar uma forma de não chamar atenção, além disso, tinha que realizar meus rituais de portas fechadas”, desabafa.

Segundo Ioná, algumas conquistas já foram garantidas pelo grupo, entre elas o direito de realizar as suas festas sem restrições de horários. “Hoje também já não precisamos nos esconder de ninguém, podemos comprar nossos objetos a qualquer momento. Muitos já saem nas ruas usando roupas apropriadas, suas contas, já assumem a sua religião”, destacou.

Com o objetivo de unir pessoas e grupos afrodescendentes, a Acbantu está promovendo um trabalho de resgate dos terreiros em Juazeiro. Segundo Ioná, o trabalho inicial está sendo dificultoso devido à resistência dos povos de terreiro. “Há muito tempo o candomblé foi tido como uma coisa ruim, uma coisa do mal e isso ainda se repete. Então, é muito difícil fazer uma pessoa que tem 50, 60 anos de santo entender que tudo que ela fez foi para o bem e que ela precisa tomar o seu lugar. É um processo muito doloroso.”

Mesmo diante dos obstáculos Ioná afirma que o grupo está buscando políticas públicas, visando melhorias para esse grupo religioso. “Temos experiências hoje no Brasil de terreiros formando cooperativas, ganhando dinheiro, gente investindo em formação. Com esses exemplos, queremos incentivar e mostrar para as pessoas daqui que elas podem e precisam despertar para as oportunidades e buscar melhorias para sua vida.”

Entre as bandeiras de luta do movimento estão a busca pela conscientização da sociedade de que os rituais fazem parte de uma religião e não de uma seita, a busca pela segurança alimentar nos terreiros e a implementação da Lei 10.639, que torna obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira no ensino fundamental e médio.

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