Um projeto de resolução do Senado Federal (PRS nº 84/2007), da maior gravidade para a democracia brasileira, pode ser aprovado brevemente, sem qualquer debate público. O senador José Serra é o responsável por emenda a esse projeto que pretende definir limites draconianos para a dívida pública da União, de modo a forçar a obtenção de superávit fiscais primários em torno de 3% do PIB por vários anos.
A manobra regulamenta a Lei de Responsabilidade Fiscal sem discussão pública e passa por cima das leis orçamentárias futuras, inutilizando o debate democrático sobre o valor dos recursos que devem ser transferidos dos impostos dos brasileiros para os portadores da dívida pública. Tais credores assegurariam, por pelo menos os próximos quinze anos, uma política econômica caracterizada por uma austeridade ainda mais profunda do que a realizada em 2015.
As consequências sobre o crescimento econômico, a justiça social e a própria arrecadação de impostos são deletérias. Significaria perenizar a crise econômica por que hoje passamos.
O próprio impacto recessivo da austeridade atual já obrigou a uma mudança no projeto de resolução. Há apenas um mês, propôs-se a definição de um limite muito menor para a dívida pública do que o valor verificado atualmente: uma razão de 4 vezes entre a Dívida Consolidada Bruta e a Receita Corrente Líquida, que estava, em julho de 2015, em cerca de 5,6 vezes. A diferença exigiria, considerando o valor da arrecadação tributária atual, a realização de um esforço fiscal de R$ 1,05 trilhão (um pouco mais de um trilhão e cinquenta bilhões de reais) ou 18% do PIB!
Em 15 de outubro, o projeto passou a admitir que a razão entre a Dívida Consolidada Bruta e a Receita Corrente Líquida deve subir a 7,1 nos próximos cinco anos. No entanto, exige que se reduza a 4,4 nos dez anos seguintes até 2030. Apenas para dar uma ideia do esforço em valores atuais, a redução envolveria cerca de 30% do PIB em apenas dez anos!
A enormidade desse valor representaria um peso insuportável para a política fiscal e para a própria economia: a elevação abrupta da meta de superávit primário impediria o crescimento econômico. De nada adianta diluir o esforço fiscal em 15 ou 10 anos como propõe o projeto. Um esforço fiscal bastante inferior a esse valor foi planejado para 2015, o que agravou a recessão e levou a uma queda da arrecadação tributária em termos reais.
O pior é que o projeto se fundamenta em argumentos tecnicamente equivocados. O projeto acusa o Banco Central de financiar o déficit público, cometendo crime de responsabilidade através de uma “pedalada” proibida pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso supostamente ocorreria através das operações compromissadas realizadas pelo Banco Central para garantir o alcance da meta para os juros SELIC definida pelo Comitê de Política Monetária, o COPOM.
Isso é uma acusação grave, que repete equívoco de estudo feito pela Tendências Consultoria em 2013, já cabalmente refutado em nota pública do Banco Central. Se a justificativa técnica envolve uma denúncia de crime de responsabilidade, ela não deveria estar melhor fundamentada tecnicamente e envolver amplas audiências públicas sobre o tema?
Como o projeto inclui os títulos públicos usados pela política monetária e pela política de aquisição de reservas cambiais na definição do limite da dívida pública, sua aprovação forçaria o Banco Central a resgatar os títulos públicos com emissão de moeda, e vender reservas cambiais, com consequências tenebrosas sobre a inflação e a taxa de câmbio.
Em suma, o projeto engessaria as políticas fiscal, monetária e cambial do país, a partir de uma compreensão tecnicamente equivocada das relações entre o Tesouro Nacional e o Banco Central. Muito provavelmente engessaria o crescimento econômico necessário não apenas para gerar os empregos de que a sociedade brasileira carece, mas até mesmo para pagar a dívida pública.
Tamanha irresponsabilidade não pode resultar de um simples projeto de resolução que não será discutido pela Câmara dos Deputados nem poderá ser vetado pela Presidência da República, e que não foi sequer debatido pela sociedade brasileira. É urgente realizar esse debate para evitar a tragédia anunciada.
Maria da Conceição Tavares – UNICAMP/UFRJ
Carlos Lessa – Economista – UFRJ
Theotonio dos Santos – Pesquisador Visitante da UERJ e Prêmio Mundial da Associação Mundial de Economia Política (WAPE).
Vagner Freitas – Presidente da CUT
João Pedro Stédile – MST
Guilherme Boulos – MTST
Paul Israel Singer – Economista – USP
Marcio Pochmann – Economista – UNICAMP, Presidente da Fundação Perseu Abramo e membro do Fórum21
Niemeyer Almeida Filho – UFU – Presidente da Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP)
Pedro Paulo Zahluth Bastos – Economista – UNICAMP e membro do Fórum 21
Ricardo Bielschowsky – Economista – UFRJ
Eduardo Fagnani – Economista – UNICAMP e membro do Fórum21
Ceci Vieira Juruá – Economista e membro do Fórum21
Pedro Rossi – UNICAMP e membro do Fórum21
Carlos Pinkusfeld Monteiro Bastos Economista – UFRJ
Mayra Juruá – Economista e membro do Fórum21
Paulo Kliass – Economista – EPPGG e membro do Fórum21
Julio Gomes de Almeida – Economista – UNICAMP
Raul Pont – Economista e membro do Fórum 21
Hildete Pereira de Melo – Economista – UFF
Celia de Andrade Lessa Kerstenetzky – Economista – UFF
Jaques Kerstenetzky – Economista – UFRJ
Maria de Lourdes Rollemberg Mollo – Economista – UNB
Esther Bemerguy de Albuquerque – Economista e membro do Fórum21
Francisco Lopreato – Economista – UNICAMP
Fernando Monteiro Rugitsky – Economista – USP
Carlos Aguiar de Medeiros – Economista – UFRJ
Lena Lavinas – Economista – UFRJ
Valéria Moraes – economista e Jornal Brasil Popular
Rodrigo Octávio Orair – Economista e pesquisador do IPEA e PNUD
Alfredo Saad Filho – Economista – SOAS – Universidade de Londres
João Sicsú – Economista – UFRJ
José Carlos de Assis – Economista UFRJ
Ladislau Dowbor – Economista – PUC/SP e membro do Fórum 21
Jorge Mattoso – Economista – Unicam
Róber Itturiet Ávila – Economista – UNISINOS/RS e membro do Fórum 21
André Biancarelli – Economista UNICAMP
Wilson Cano – Economista – UNICAMP
Rosa Maria Marques – Economista PUC-SP
Leda Paulani – Economista USP e membro do Fórum 21
Laura Carvalho – Economista – USP
José Luís Fiori – Cientista Político, Pesquisador e Professor – UFRJ
Venicio A. de Lima – UNB e CEBRAS-UFMG e membro do Fórum 21
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Fernando Morais – Escritor e jornalista
José Carvalho de Noronha – Médico Sanitarista, consultor do CEBES – RJ
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Ecléa Bosi – Doutora em Psicologia – USP
Marilena Chauí – Universidade de São Paulo
Celso Amorim – Embaixador
Andre Singer – USP
Emir Sader – Sociólogo – UERJ – UFRJ e USP
Maria Victoria de Mesquita Benevides – Socióloga e professora da USP
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Gilberto Bercovici – advogado – USP
Jacques Távora Alfonsin – Advogado – UNISINOS/RS
Sebastiao Velasco e Cruz – UNICAMP e membro do Fórum21
Juarez Tavares – Professor Titular da UERJ, Professor Visitante de Frankfurt e Subprocurador-Geral da República
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Francisco Carlos Teixeira da Silva – Professor titular da UFRJ
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