Acusados de assassinar Zé Maria do Tomé vão à Júri Popular

No dia 19 de agosto de 2015, a Justiça estadual de Limoeiro do Norte (CE) decidiu que os acusados do assassinato do líder comunitário e ambientalista José Maria Filho, o Zé Maria do Tomé, deverão ser levados à Júri Popular.

Um dos réus é João Teixeira Júnior, proprietário da Frutacor e um dos mais importantes empresários do agronegócio brasileiro. Também são réus e vão ao Tribunal do Júri: José Aldair Gomes Costa (gerente da empresa Frutacor, que teria intermediado o homicídio) e Francisco Marcos Lima Barros (morador da comunidade de Tomé, que teria dado suporte ao assassino).

Além desses acusados, outros três estariam envolvidos na morte de Zé Maria do Tomé: Westilly Hytler Raulino Maia, (pistoleiro que teria cometido o homicídio, morto em operação policial em 2010), Sebastião Dantas de Barros, (morador da comunidade de Tomé, que teria cometido suicídio em 2012) e Antônio Wellington Ferreira Lima, (também morador de Tomé, assassinado em agosto deste ano, em uma ação da Polícia Militar).

A decisão de pronunciar os réus, levando a julgamento pelo Tribunal do Júri, ocorre mais de cinco anos após a morte do líder comunitário, morto em 21 de abril de 2010, com mais de 20 tiros, depois de sofrer ameaças de morte. O assassinato ocorreu depois de Zé Maria denunciar as ilegalidades e violações de direitos cometidas pelas empresas do agronegócio instaladas na região da Chapada do Apodi, como a grilagem de terras, poluição das águas e principalmente a pulverização aérea de agrotóxicos.

O caso Zé Maria é emblemático no contexto dos crimes, assassinatos e violência no campo brasileiro. José Maria Filho foi assassinado por defender direitos humanos: direito ao meio ambiente, à terra e ao território, à saúde e à vida.

Nós, integrantes de organizações de direitos humanos, movimentos populares, pesquisadores/as que atuam na região, organismos da Igreja e militantes sociais, continuamos cada vez mais firmes em defesa da Chapada do Apodi, do meio ambiente, e da agricultura familiar e camponesa. Seguimos na denúncia dos males causados pelo agronegócio, que envenena e mata o povo brasileiro.

Esperamos que os réus sejam julgados pelo Tribunal do Júri o mais rápido e finalmente condenados. O poder político e econômico não pode se sobrepor à vida. A Justiça prevalecerá, com a condenação e punição dos responsáveis pela morte de Zé Maria.

José Maria Filho, presente!

Cáritas Brasileira Regional Ceará
Cáritas Diocesana de Limoeiro do Norte
Comissão Pastoral da Terra (CPT – Nacional)
CSP Conlutas
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Movimento 21
Núcleo Tramas/Universidade Federal do Ceará
Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (RENAP/CE)
Via Campesina Brasil

Um breve histórico:

José Maria Filho foi assassinado no dia 21 de abril de 2010, com mais de vinte tiros, à queima roupa, próximo a sua residência, na comunidade de Tomé, zona rural de Limoeiro do Norte (CE). Destacou-se na luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos, na Chapada do Apodi, Ceará. Essa atividade, promovida por grandes empresas do agronegócio, causa a contaminação da água, plantações e solo das comunidades da região. Além disso, provoca diversas doenças nos trabalhadores das empresas e moradores. Essas denúncias encontraram repercussões em ações judiciais, procedimentos do Ministério Público (Estadual, Federal e Trabalhista) e em inúmeras pesquisas acadêmicas.

Além das denúncias sobre as consequências do uso de agrotóxicos, Zé Maria do Tomé enfrentou diretamente as grandes empresas do agronegócio e denunciou irregularidades na concessão de terras nos perímetros irrigados da região. Esses perímetros provocam um processo de desapropriação (e mesmo expulsão) de pequenos trabalhadores rurais e concedem as terras para grandes empresas exportadoras de frutas. Enquanto o estado do Ceará passa por uma de suas maiores secas, essas empresas têm acesso à água em abundâncias e condições facilitadas.
Na região da Chapada do Apodi estão instaladas empresas como Del Monte, BANESA, Fyffes, Agrícola Famosa e Frutacor, esta última cujo proprietário é acusado de autoria intelectual (mandante) de Zé Maria.

A luta de José Maria, em conjunto com as organizações comunitárias, pesquisadores/as, movimentos populares e diversos apoiadores/as, gerou uma pressão social sobre a Câmara Municipal de Limoeiro do Norte. Em 20 de novembro de 2009 foi promulgada a Lei 1.278/2009 que proibia a pulverização aérea no município. Essa iniciativa legislativa foi considera inédita no Brasil e ganhou repercussão internacional, ao banir a pulverização aérea de agrotóxicos.

As empresas do agronegócio da região não cumpriam o disposto na Lei 1.278/2009. Então, José Maria Filho torna-se referência nas denúncias sobre as ilegalidades das empresas do agronegócio.

Além disso, Zé Maria continuou, em conjunto com diversas organizações, denunciando a contaminação das águas, do solo e ilegalidades, como grilagens de terras, cometidas pelas empresas do agronegócio. Todas essas denúncias são respaldadas por diversos procedimentos judiciais e administrativos, como uma Ação Civil Pública que obrigou a prefeitura de Limoeiro do Norte a construir um sistema de abastecimento de água alternativo, pois a rede pública estava contaminada pelos agrotóxicos. Outro procedimento do Ministério Público Federal demonstrou a grilagem de terras das empresas do agronegócio em terras da União.

No dia 21 de abril de 2010, o defensor de direitos humanos foi assassinado, a poucos metros da sua casa, em típica ação de pistolagem.

A lei que proibia a pulverização aérea foi revogada em dia 20 de maio de 2010, um mês após o assassinato de Zé Maria.

O processo nº 7659-18.2010.8.06.0115, que tramita 1ª Vara da Comarca de Limoeiro do Norte, é o que trata do homicídio de José Maria Filho. Da decisão de pronúncia cabe recurso ao Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

Imagem: José Maria Filho: líder se tornou símbolo da luta contra os agrotóxicos na Chapada do Apodi, Ceará. (Melquíades Júnior)

Enviada por Cláudio Filho.

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