Adrimauro Gemaque* – EcoDebate
Os primeiros registros de práticas de ilegalidade no Brasil datam do século XVI no período da colonização portuguesa. O caso mais frequente era de funcionários públicos, encarregados de fiscalizar o contrabando e outras transgressões contra a coroa portuguesa e ao invés de cumprirem suas funções, acabavam praticando o comércio ilegal de produtos brasileiros como pau-brasil, especiarias, tabaco, ouro e diamante. Outro momento, refere-se a extensa utilização da mão de obra escrava, na agricultura brasileira, na produção do açúcar. De 1580 até 1850 a escravidão foi considerada necessária e, mesmo com a proibição do tráfico, o governo brasileiro mantinha-se tolerante e conivente com os traficantes que burlavam a lei. Com advento da independência em 1822 e a instauração do Brasil República, outras formas de corrupção, como a eleitoral e a de concessão de obras públicas, surgem no cenário nacional. O Visconde de Mauá, por exemplo, recebeu licença para a exploração de cabo submarino e a transferiu a uma companhia inglesa da qual se tornou diretor.
Nos dias atuais, ser corrupto no Brasil já deixou de ser uma vergonha para se tornar algo comum. Mais que isso, a corrupção brasileira está se tornando um valor, uma atividade normal. A análise pessimista do modelo de administração do Brasil é do advogado Modesto Carvalhosa autor de O Livro Negro da Corrupção (1995). A obra analisa as revelações que levaram à queda, em 1992, do ex-presidente e atual senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL). De acordo com Carvalhosa, a corrupção no Brasil só fez crescer em corpo e em especialização, enquanto as instituições que tanto lutaram pela democracia, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), “assistem a tudo sem absolutamente nenhum movimento”.
Diariamente, a imprensa apresenta casos de atividades ilícitas nos serviços públicos. Algumas vezes, grandes escândalos, como o “Mensalão” e agora as fraudes na Petrobras, investigadas pela operação “Lava Jato”, da Polícia Federal. Talvez por focar o desvio de grandes quantias, o cidadão deixe de notar pequenos atos de corrupção cometidos cotidianamente. Furar fila, não devolver o troco que recebeu a mais, instalar TV a cabo pirata, comprar produtos falsificados. São atitudes tão “naturais” que não parecem denunciar uma deficiência moral da sociedade brasileira. Segundo o jornalista e mestre em ciência política Nelson Freire Penteado, “a corrupção está impregnada na cultura brasileira”.
Ação Penal 470, que ficou conhecida como “Mensalão”, levou ao banco da mais alta Corte de Justiça do País, o Supremo Tribunal Federal as figuras mais proeminentes do Partido dos Trabalhadores (PT), que governa o Brasil há13 anos. Agora a operação “Lava Jato”, também levou políticos influentes do PT e grandes empresários todos senhores com mais de 60 anos.
Como a população vai cobrar equidade e honestidade nas gestões públicas se ela não possui uma ética- moral consolidada? Para esta pergunta a resposta pode ser: a educação. Um ensino público politizado e de qualidade pode sanar essa deficiência estrutural, é o que afirma o cientista político Nelson Freire. No entanto, a prática criminosa nos governos deteriora os serviços públicos, incluindo a educação. Nessa roda viva de degradação nacional, a possibilidade de salvar a administração pública está na boa governança. Um fator que favorece a prática de irregularidades nos órgãos públicos, quaisquer que sejam eles, é a ausência de uma administração profissionalizada.
A participação da população no controle das contas públicas contribuiu em parte para a diminuição dos índices de dispêndios de recursos públicos, fazendo com que estes sejam destinados a atenderem as políticas públicas em áreas que a população mais necessita, tais como: educação, saúde, saneamento básico, segurança pública entre outros. Na área privada, o controle para prevenção de corrupção e fraudes também ocorre. Acionistas, empregados e os fornecedores são partes interessadas na gestão da empresa, preocupam-se com a continuidade da mesma. Os acionistas têm o intuito de fazer com que seu dinheiro renda mais em uma organização do que em outro tipo de investimento financeiro.
A corrupção não é um problema só do Brasil ou que ocorre apenas em regiões periféricas. Trata-se de um problema internacional, e que nos últimos anos ganhou mais possibilidades para o seu controle, devido ao maior acesso a informação, incremento tecnológico e revolução digital. Neste sentido, os cidadãos passaram também a exigir um maior controle e transparência na utilização dos recursos públicos.
O controle sobre a corrupção pode ser feito pela sociedade, pelo livre acesso às contas públicas, a possibilidade de conferir, comparar os dados e analisar se os recursos públicos foram utilizados de forma responsável (RAUSCH; SOARES, 2010).
Não há uma única forma de conceituar corrupção e nem um único método para que esta seja delimitada. Segundo os autores Fonseca e Sanchez (2001) a corrupção é como um fenômeno flexível que pode ocorrer de diversas formas serem ocasionada por diversos fatores e em diversos países, o que dispensa ser uma causa cultural.
Estudo divulgado em maio de 2014, denominado de Ranking de corrupção e fraudes ocorridas no Brasil entre 1999 e 2012, por ocasião do 5º Congresso da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), de Controladoria e Finanças & Iniciação Científica em Contabilidade com base nas reportagens da Revista IstoÉ publicadas neste período. Mostra que na área pública, nos últimos anos a população passou a ser mais questionadora de seus governantes sobre a efetiva destinação e utilização do dinheiro público, exigindo uma prestação de contas de forma transparente e de mais fácil entendimento.
A pesquisa mostra as Regiões do Brasil em que ocorreu a fraude e/ou corrupção, bem como a frequência em que ocorreram. Os resultados desse aspecto podem ser observados no gráfico:
Regiões do Brasil em que ocorreu a fraude e/ou corrupção
Fonte: Dados da Pesquisa
As temáticas corrupção e fraude podem ocorrer em diversos setores da economia, como por exemplo, em organizações do terceiro setor, em empresas, órgãos públicos e etc. Em vista disso, quando ocorrem estas práticas na economia mundial há efeitos negativos para o desenvolvimento dos mercados e da economia. Este fato, por sua vez, impede a concorrência leal, os preços justos, provoca perda de oportunidades de negócios e fere a saúde pública (BURGOA, 2010). Os setores da economia que foram abalados pelos escândalos de corrupção e fraudes, no período pesquisado, são apresentados no Gráfico:
Setores da economia abalados pela corrupção e/ou fraude
Fonte: Dados da Pesquisa
Por sua vez, é possível verificar que existe uma maior frequência de ocorrência de atos ilícitos no setor público (75%). Segundo Rausch e Soares (2010) “os recursos públicos, sejam financeiros, humanos ou de outra natureza, devem ser utilizados para desenvolver políticas públicas adequadas ás necessidades dos cidadãos.” No entanto, como visto no Gráfico, estas práticas não estão ocorrendo, e uma maneira de contornar esta situação seria a sociedade manter um controle das finanças públicas e por outro lado a transparência das informações para sociedade, muito embora exista um instrumento legal.
Mesmo que algumas providências têm sido tomadas para que este índice de corrupção regrida. Um bom exemplo consiste na criação da Lei de Responsabilidade Fiscal, que tem o objetivo de “prevenir e corrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas.” (PLATT, 2013). A derrubada da PEC 37, que limitava as investigações apenas para as policias Federal e Civil, que por consequência restringe o Ministério Público de atuar nas investigações contra as malversações de usos dos recursos públicos, também foi um avanço.
Para Modesto Cavarlhosa (1995), “estamos diante de uma sociedade individualista e consumista, sem nenhuma preocupação com a política. Hoje vemos as pessoas apenas preocupadas com seus bens individuais, seus interesses. Esse, evidentemente, é um fenômeno ocidental geral. O grande problema disso é que deixamos de lado nossos sonhos de mudar a sociedade para melhor. Deixamos de lado nossas utopias, nossas inquietações sociais”.
Referências:
Breve história da corrupção no Brasil, Disponível em: http://www.contracorrupcao.org/2013/10/breve-historia-da-corrupcao-no-brasil.html, Acesso dia 07 de julho de 2015, 14:22 hs.
Corrupção, uma atividade como outra qualquer no Brasil, Disponível em: <http://www.muco.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3005:corrupcao-uma-atividade-como-outra-qualquer-no-brasil&catid=36:em-exibicao&Itemid=55>, Acesso dia 07 de julho de 2015 hs.
ISILVA, Kelly da e FLACH, Leonardo, Ranking de corrupção e fraudes ocorridas no Brasil entre 1999 e 2012 (2014). Disponível em: <http://dvl.ccn.ufsc.br/congresso_internacional/anais/5CCF/20140423124535.pdf> Acesso dia 07 de julho de 2015, às 16:30 hs.
*Articulista e Analista do IBGE, apresenta seus pontos vista em caráter pessoal. E-mail: [email protected]