Resquícios da escravidão

Joelmir Tavares

Mandos e desmandos de patrões, episódios de assédio moral e desrespeito aos direitos trabalhistas, alvos de queixas de trabalhadores nas grandes obras em andamento no Brasil, carregam para os dias atuais uma sombra da lógica escravagista, oficialmente abolida no país em 1888.

Por questões culturais, a prática sobrevive na sexta maior economia do mundo. “É a escravidão moderna, reflexo de costumes passados de geração a geração”, afirmou o coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Escravo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Luiz Machado.

A análise é endossada por pessoas que lidam com a questão. “É muito fácil sair do Nordeste, encontrar uma cama para dormir e achar que está no céu”, disse o presidente da Força Sindical em Rondônia, Antônio Amaral. Muitos dos trabalhadores das usinas de Jirau e Santo Antônio, em Porto Velho, são nordestinos.

Procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Porto Velho, Francisco Cruz contou já ter libertado pessoas em condição análoga à de escravos que acreditavam ser tratadas de forma “normal”. “Como muitos operários saem de regiões pobres, não se dão conta de que estão em condição desumana, imprópria”.

A solução, apontam os especialistas, é intensificar as fiscalizações. Um dos entraves é o número insuficiente de auditores fiscais do trabalho – são 3.013 no Brasil. “É uma quantidade baixa para o tamanho do país. Está aquém do ideal”, avaliou Luiz Machado, da OIT.

Dignidade

Defensora de discussões mais aprofundadas sobre a construção de usinas hidrelétricas na Amazônia – casos de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte -, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva diz que é necessário conciliar desenvolvimento econômico com respeito aos direitos humanos.

Para ela, se o Brasil investisse em fontes alternativas de energia, como eólica, solar e biomassa, a qualidade dos empregos no setor elevaria, por “induzirem a processos de desenvolvimento científico e tecnológico, empregos de qualidade, dignos, em indústrias que geram valor agregado a esse produto chamado energia”.

“Em Belo Monte, milhares de trabalhadores são deslocados para regiões remotas, retirados de seu convívio familiar e social, para viver uma realidade de trabalho pesado e sem grandes oportunidades de crescimento profissional”, afirmou a ex-ministra.

Marina, que nasceu no Acre, deixou o governo federal em 2008, muito por causa de seu embate de ideias sobre desenvolvimento com o então presidente Lula e com a então ministra Dilma Rousseff.

O assessor especial da Secretaria Geral da Presidência da República, José Lopez Feijóo, afirmou que “toda relação capital trabalho é sempre conflitante”, mas defendeu a atual política de investimentos do governo. “Quando o Brasil resolveu apostar em construção para valer, os trabalhadores ganharam um poder de barganha que não tinham antes, quando a lógica era a do desemprego”.

Enviada por Ricardo Álvares.

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