São Paulo vai mesmo perder a sua esquina do cinema?

Raquel Rolnik*

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Manifesto em defesa do Cine Belas Artes, patrimônio cultural, artístico e afetivo de São Paulo e do Brasil

Amparados na Constituição Federal, que inclui as “edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais” entre os bens que “constituem o patrimônio cultural brasileiro” (inciso IV do Artigo 126), defendemos o imediato tombamento do prédio da Rua da Consolação, 2.423, esquina com a avenida Paulista, onde funcionava o mítico Cine Belas Artes. Também demandamos das autoridades que lancem mão de todos os instrumentos necessários para reabrir o cinema, inaugurado em 1967 pela Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC) e Companhia Serrador no mesmo prédio que antes abrigara o Cine Trianon, aberto em 1952.

Desde sua inauguração, o Cine Belas Artes manteve as características que demarcaram sua singularidade no circuito exibidor e tornaram-no fundamental para a cultura cinematográfica no Brasil. Ao longo de 44 anos, operou mais como um centro cultural formador de público do que mera sala exibidora, como atestam dois de seus aclamados projetos, o Cineclube e o Noitão, que, diferentemente das salas de shopping, promoviam uma atmosfera propícia à interação. Contou para isso com a preciosa contribuição de Ancona López, reconhecido internacionalmente como um dos melhores programadores de cinema e que teve Leon Cakoff como seu assistente. Soube, também, adaptar-se à nova tendência de complexos com salas pequenas e médias ao transformar seu espaço no mais significativo multiplex de rua do país.

O Cine Belas Artes promovia a diversidade cultural e a reflexão sobre dramas humanos, história, política e arte por meio de uma programação com filmes de alto padrão, brasileiros e estrangeiros, inclusive com elevado número de obras-primas procedentes de países pouco presentes no nosso mercado exibidor. Desempenhava papel fundamental no circuito cultural das ruas da Consolação e Augusta e Avenida Paulista. Nos fins de semana e feriados, recebia, em média, 1.800 frequentadores por dia. As filas se repetiam e lotavam suas salas também às segundas e quartas-feiras nas tradicionais promoções com ingressos mais baratos. Esse sucesso era favorecido igualmente pela facilidade de acesso a pé e por transporte público.

Entretanto, pressões do mercado imobiliário provocaram a suspensão das atividades do cinema em março deste ano. O fato recebeu ampla divulgação na mídia. Frequentadores realizaram protestos na internet e na rua contra o fechamento e organizaram o Movimento pelo Cine Belas Artes (MBA). Centenas de depoimentos pró-Belas Artes, um abaixo-assinado com cerca de 20 mil assinaturas e adesões de quase 90 mil pessoas no aplicativo Causes no Facebook são apenas alguns exemplos do que é visto como uma das maiores mobilizações em defesa de um patrimônio cultural no Brasil. Destacamos que este uníssono de vozes em São Paulo coincide com o movimento de resgate histórico dos cinemas de rua em curso no Rio de Janeiro, que contempla a reabertura do igualmente mítico Cine Paissandú (tombado em 2008), anunciada para julho de 2012.

Garantir o cinema de rua é valorizar um modo de vivenciar a cidade com seus bares, restaurantes, livrarias, as pipocas e as pizzas e os encontros com amores, amigos e conhecidos. É, acima de tudo, um exercício de cidadania – lugar de comunhão entre memória, cultura e afeto – que deve ser protegido e fomentado pelo Poder Público.

Movimento pelo Cine Belas Artes (MBA)

Adesões ao manifesto devem ser enviadas para (copiar os três e-mails): [email protected], [email protected], [email protected]

Assinaturas:

Alberto Bandone – cineasta
Alexandre Stockler – cineasta
André F.G. Neves – cineasta
André Fischer – jornalista
Anna Marcondes – presidente do Via Cultural – Instituto de Pesquisa e Ação pela Cultura
Antônio Moura Reis – jornalista
Antônio Souza Neto – síndico da Galeria do Rock (São Paulo capital)
Antunes Filho – diretor do Centro de Pesquisa Teatral (CPT) do Sesc
Benjamin Seroussi – curador e produtor
Caio Plessmann – cineasta
Cândido Malta Campos Filho – arquiteto e urbanista e professor da FAU/USP
Cao Hamburger – cineasta
Carlos Guilherme Mota – historiador e professor emérito da FFLCH/USP
Caru Alves de Souza – cineasta
Celso Antonio Bandeira de Mello – jurista
Celso Gonçalves – cineasta e presidente da seção paulista da Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-Metragistas (ABD)
Célia Marcondes – presidente da Sociedade Amigos e Moradores do Bairro
Celso Luiz Lasarim – jornalista
Cleo de Paris – atriz do grupo “Os Satyros”
Cunha Júnior – apresentador de TV
Daniela Thomas – cenógrafa e cineasta
Danilo Miranda – diretor do Sesc/SP
Debora Duboc – atriz
Denise Carreira – coordenadora de educação da Ação Educativa e Relatora Nacional para o Direito Humano à Educação
Edgard Carvalho – professor titular do departamento de antropologia da PUC/SP e representante no Brasil da cátedra itinerante Unesco Edgard Morin
Eduardo Suplicy – senador (PT/SP)
Eliseu Gabriel – vereador (PSB/São Paulo capital)
Evaldo Mocarzel – cineasta e dramaturgo
Eva Wilma – atriz
Fábio Yamaji – diretor de animação
Fernando Alves Pinto – ator
Fernando Henrique Cardoso – ex-presidente da República e professor emérito da FFLCH/USP
Fred Ghedini – ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo e diretor da Associação de Proteção dos Direitos Autorais dos Jornalistas Brasileiros (Apijor)
Gerardo Fontenelle – cineasta
Gero Camilo – ator e dramaturgo
Gina Rizpah Besen – psicóloga, consultoria ambiental e doutora em saúde pública
Hélio Goldstejn – diretor de TV
Jeferson De – cineasta
João Federici – produtor
João Signorelli – ator
Jorge Rubies – presidente da Associação Preserva São Paulo
Jorge Mautner – cantor e compositor
José Osório de Azevedo – desembargador
Junia Sirqueira Soares – assistente de audio-visual
Kiko Goifman – cineasta
Laerte – cartunista
Laerte Késsimos – ator
Laís Bodanzky – cineasta
Laura Wie – apresentadora de TV
Leandro Marques – radialista e cineasta
Lee Taylor – ator
Lucia Helena Vitalli Rangel – diretora adjunta da Faculdade de Ciências Sociais da PUC/SP
Lucila Lacreta – diretora do Movimento Defenda São Paulo
Luiz Carlos Merten – jornalista
Luiz Thunderbird – VJ, apresentador de TV, radialista e vocalista da banda Devotos de Nossa Senhora
Márcio Debellian – documentarista
Maria Margarida Cavalcanti Limena – diretora da Faculdade de Ciências Sociais da PUC/SP
Mouzar Benedito – escritor e jornalista
Nabil Bonduki – arquiteto e urbanista e professor da FAU/USP
Newton Moreno – dramaturgo
Olgária Matos – professora do Departamento de Filosofia da FFLCH/USP
Paul Heritage –  produtor cultural e diretor de teatro.
Paula C. Ferraz – assessora de imprensa
Paulo Cannabrava – Associação de Proteção dos Direitos Autorais dos Jornalistas Brasileiros (Apijor)
Paulo de Tarso Chamon Schmidt – publicitário e jornalista
Pedro Roberto Jacobi – sociólogo e presidente do Procam/USP
Raquel Rolnik – arquiteta e urbanista, professora da FAU/USP e relatora da ONU para o direito à moradia
Raul Teixeira – sonoplasta e coordenador do curso de Sonoplastia da SP Escola de Teatro
Regina Drummond – escritora
Regina Porto – sonoplasta, produtora e curadora de música contemporânea
Ricardo Ohtake – arquiteto
Rodrigo Faria – produtor cultural e cofundador do Movimento Ilha da Paulista (MIP)
Rubens Rewald – cineasta e vice-presidente da Associação Paulista de Cineastas (Apaci)
Sara Silveira – produtora de cinema
Sebastião Milaré – escritor
Sérgio Haddad – diretor-presidente do Fundo Brasil Direitos Humanos e socio-fundador da organização Ação Educativa
Sonia Barros – escritora infanto-juvenil
Soninha Francine, apresentadora e ex-vereadora em São Paulo capital
Tadeu Jungle – cineasta
Toni Venturi – cineasta
Vera Masagão – coordenadora geral da Ação Educativa e integrante da coordenação executiva da Abong – Associação Brasileira de ONGs
Vinícius Romanini – jornalista e professor de semiótica da ECA e FAU/USP
Zé Celso Martinez Corrêa – ator, autor, diretor e líder do Teatro Oficina
Zuenir Ventura – jornalista

*Urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada

São Paulo vai mesmo perder a sua esquina do cinema?

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