Por Joceline Gomes
Dando prosseguimento aos debates iniciados no último dia 30, o seminário Racismo, Igualdade e Políticas Públicas retomou suas atividades ontem pela manhã com a mesa “Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Racial”. Coordenada pelo professor do departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB), Joaze Bernardino, a mesa reuniu pesquisadores de diferentes áreas.
Rosana Heringer, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apresentou algumas conclusões que evidenciam os avanços e dilemas que permeiam a implementação das políticas públicas na educação. Resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2008 revelam que, da proporção de jovens de 25 anos ou mais que concluíram o ensino superior naquele ano, menos da metade era de negros.
UNIVERSIDADES – Ainda conforme dados do PNAD, citados por Heringer, entre os anos 2000 e 2008, o número de jovens que cursavam o ensino superior dobrou. A proporção de estudantes negros acompanhou esse crescimento, assim como a de brancos. Entretanto, o número de estudantes negros permanece menor do que o de brancos tanto no ensino público quanto no privado. Para Heringer, este é um dos motivos que apontam a necessidade das cotas raciais.
“As cotas são um assunto polêmico porque tocam numa área sensível que foi, por muito tempo, predominantemente branca. Exatamente por isso precisamos debater mais”, disse.
Ainda segundo Heringer, dados de setembro de 2010 apontam que 87 instituições públicas adotaram ações afirmativas para negros, sendo que 33 adotaram o sistema de cotas e 3 adotaram pontuação adicional, onde são acrescentados 10% da nota tirada no vestibular ao resultado final. Em 2009, 32 mil estudantes ingressaram nas universidades públicas por reservas de vagas como as cotas raciais.
COLEÇÃO – O professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Valter Silvério, participou da tradução da Coleção História Geral da África, e apresentou um pouco da metodologia de trabalho adotada. Além disso, explicou o projeto Brasil-África – Histórias Cruzadas, que visa utilizar a Coleção como material didático de referência em escolas públicas.
A proposta surgiu em 2007, quando representantes da UNESCO, do Ministério da Educação (MEC) e da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) constataram que não havia recursos para a implementação da lei nº 10.639/2003, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de “História e Cultura Afro-Brasileira” na rede pública ou privada.
Desde então, Silvério e uma grande equipe trabalharam bastante e lançaram o trabalho no ano passado, com lançamentos regionais este ano. O Brasil é o único país que tem a coleção completa disponibilizada no site da UNESCO gratuitamente e já conforme o novo acordo ortográfico. Segundo ele, foram 80 mil downloads apenas no primeiro mês.
CULTURA – Liv Sovic, professora da Escola de Comunicação da UFRJ, trouxe o aspecto cultural para o debate e provocou: “Aqueles que se opõem às políticas de igualdade falam de defesa à sociedade como se alguém fosse quebrar alguma ordem natural das coisas. Precisamos pensar essa questão”.
Norte-americana, So vik vive no país há muitos anos e percebe as construções sociais feitas sobre o Brasil aos estrangeiros. Sovik costumava ouvir que o povo brasileiro é “muito carinhoso”, mas percebeu que, simultaneamente, é muito violento. Discussões mais aprofundadas sobre as questões raciais, segundo ela, levam mais tempo e esbarram no folclore em torno de construções como Carnaval carioca, por exemplo.
“Quem é estrangeira e branca, como eu, não percebe isso imediatamente. Apontar o racismo e o preconceito é matar o prazer do outro. O que seria do carnaval sem cantar aquela marchinha racista ‘o teu cabelo não nega’?”, questiona.
Para Sovik, parte da discriminação racial se deve também à memória que os negros trazem à sociedade, o que não justifica sua perpetuação. Para a sociedade, segundo a professora, é melhor não lembrar da escravidão porque trás dor para ambos os lados: brancos e negros. Mas, para ela, é preciso repensar essas questões:
“A presença do corpo negro é uma lembrança que nos remete à história do Brasil que precisa ser repensada, rediscutida por meio da memória e história da população”, disse.
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