Debate sobre Renascimento Africano mobiliza 60 nações

A economia está no centro dos debates dos intelectuais sobre a Renascença Africana - Foto: Suzana Varjão / Arquivo Palmares

Joceval Santana

Em que medida a diáspora negra pode contribuir para o Renascimento Africano e, numa via de mão dupla, o reposicionamento socioeconômico da África pode contribuir para a emancipação, promoção e integração dos afrodescendentes? A questão, colocada por Kabengele Munanga, antropólogo e professor congolês radicado há 35 anos no Brasil, tangenciou as falas dos conferencistas de vários países que participaram da mesa-redonda sobre as possíveis – e abrangentes – relações entre os países da África e da Diáspora Africana.

A conferência integra o Fórum sobe a Renascença Africana, uma dos pilares do III Festival Mundial das Artes Negras, que acontece no Senegal até dia 31 de dezembro. O evento promove a reunião de 60 países, com ênfase na programação artística, cuja produção lista quase 20 linguagens e campos de conhecimento, como musica, dança, teatro, cinema, literatura, arquitetura e moda. Tido como maior encontro global de artes e cultura negras, o Festival também promove ações de caráter reflexivo e formativo, como colóquios e oficinas, além do Fórum.

MESA – A mesa-redonda que colocou a Diáspora na pauta foi uma espécie de amostra da diversidade da programação, num espelhamento oportuno e caro ao tema central, a Renascença Africana. Estavam presentes pensadores ligados às ciências sociais do Canadá, Haiti, Guiana Francesa, Haiti, Ilha da Reunião, Senegal e Brasil, que participou com quatro conferencistas, entre eles o presidente da mesa, o antropólogo Júlio César Tavares.

Além do naturalizado Kabengele Munanga, estavam presente Petronilha Beatriz Gonçalves da Silva, que possui pós-doutoramento em Teoria da Educação, e Zélia Amador de Deus, doutora em Ciências Sociais e presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros. O Brasil foi saudado como o país que mais enviou intelectuais ao Fórum, cerca de 50, numa resposta maciça à proposta de discutir a atual situação da África e dos afro-descendentes.

INVISIBILIDADE NEGRA – “A áfrica que chegou ao continente americano através da Diáspora é um pedaço do continente negro marcado pela heterogeneidade e pela diversidade, lembrou a professora Zélia Amador, professora da Universidade Federal do Pará, numa fala encantadora que partiu da mitologia para, metaforicamente, abordar a questão da manutenção da memória e das marcas de identidade nos corpos afro-descentendes, bem como a afirmação da negritude no campo da performance.

Como um todo, a conferência foi marcada pela variedade de assuntos e camadas discursivas, que, nas palavras do presidente da mesa, formavam um painel, com elementos e pesquisas que ajudavam a diminuir “a invisibilidade negra no campo do saber das ciências sociais e educacionais”. Certamente, um viés importante entre os conceitos que compreendem o renascimento africano, cujas vedetes são o crescimento econômico, o reestabelecimento da democracia e a coesão social.

Júlio César Tavares também definiu como “arqueológico” o trabalho desses pesquisadores, “fundamental para resgatar o vínculo entre a África e a Diáspora, e fortalecer a presença da África fora do continente”. Nessa arqueologia, foram recuperados filhos pródigos e heróis anônimos, que contribuíram para processos históricos e episódios constitutivos da soberania e identidades dos povos da Diáspora, cruzando memória e África atual.

EDUCAÇÃO – A professora Petronilha falou da importância dos estudos afro-brasileiros, transmitidos nas escolas, para combater as estratégias que “tentaram e ainda tentam nos fazer esquecer das nossas origens”. E citou uma frase que leu numa peregrinação a Ilha de Gorée, no Senegal, e que foi decisiva para constituir o seu sentimento de pertencimento: “Eles partiram sem esperança de retorno e sem saber que iam criar um povo: os africanos da Diáspora”.

O que se coloca agora é como este povo pode participar da recolocação política da África, e quanto o continente-mãe está disposto a abraçar seus filhos, que carregam em si uma parte da sua história. O Brasil – que recebeu 40% dos negros capturados na África para fins escravagistas nas Américas entre os séculos 16 e 19; que foi último país a abolir a escravidão; cuja população é formada por 50% de negros; e que a partir do fim do século passado mergulhos na discussão de ações afirmativas – ocupa papel de destaque nessa geografia política e humana.

Fonte: Fundação Palamres
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