Polícia chilena reconhece que disparou no dia que assassinaram estudante

Indícios apontam que bala disparada por um carabineiro teria acabado com a vida do jovem Manuel Gutiérrez, na madrugada da última sexta-feira quando estava terminando a greve nacional de dois dias no Chile, convocada pelos estudantes e trabalhadores para protestar contra a baixa qualidade da educação pública e as condições de trabalho enfrentadas por milhares de chilenos

Christian Palma, Correspondente da Carta Maior em Santiago

Ainda não está comprovado, mas os indícios apontam que a versão da família de Manuel Gutiérrez – o jovem de 16 anos morto com um tiro – é a correta. Uma bala disparada por um carabineiro (policial chileno) teria acabado com a vida do jovem na madrugada da última sexta-feira quando estava terminando a greve nacional de dois dias no Chile, convocada pelos estudantes e trabalhadores para protestar contra a baixa qualidade da educação pública e as desastrosas condições de trabalho enfrentadas por milhares de chilenos.

No início, a chefia da polícia descartou que o disparou que atingiu “Manolito” no tórax partiu de um de seus agentes, mas não se passaram mais do que 72 horas para se saber que, efetivamente, um dos policiais que patrulhavam a zona de Macul, em Santiago, utilizou sua arma.

Um dia após o funeral do jovem, o chefe da zona metropolitana de carabineiros, general José Luis Ortega, afirmou que a afirmação inicial descartando a suposta participação de policiais na tragédia baseou-se nas primeiras declarações dos oficiais da área em questão. Questionado diretamente sobre se a instituição está hoje em condições de dizer à família Gutiérrez que os carabineiros não são responsáveis pela morte, o general Ortega respondeu:

“Isso não é nós que temos que dizer, mas sim a investigação; nós não podemos adiantar um resultado sobre algo que não estamos investigando judicialmente”.

Horas mais tarde, a direção dos Carabineiros informou que um suboficial da instituição, que operava no Comissariado da comunidade de Peñalolén (onde se encontra a vila Jaime Eyzaguirre) foi posto de licença por ter disparado com sua arma de serviço durante os protestos e em um horário que coincide com o da morte de Manuel Gutiérrez, com o que as suspeitas vão se transformando em certeza.

Novamente o general Ortega teve que vir a público, informando a medida adotada em relação a esse policial que foi posto à disposição da justiça. O agente policial foi identificado como Miguel Millacura Cárcamo, com 18 anos de serviço, que estava trabalhando perto do local do ocorrido. Ele admitiu que disparou para o ar, mas não contra as pessoas que estavam se manifestando na região.

No local da tragédia, segundo o agente, os policiais se deram conta de que um grupo de pessoas estava disparando contra os carabineiros desde o outro lado da rua, razão pela qual decidiu fazer uso – em duas ocasiões, de sua Uzi de 9 milímetros.

“Nós não estamos atribuindo a responsabilidade ao suboficial que fez uso de sua arma de serviço. A responsabilidade sobre os fatos terá que ser estabelecida cientificamente pela perícia que será feita o mais cedo possível pela polícia com a orientação do promotor que assumiu a causa”, disse o chefe policial, desvinculando a responsabilidade de seu ex-subalterno.

O advogado da família, Washington Lizama, logo após saber do afastamento do policial, sustentou que o testemunho de Miguel Millacura é chave para esclarecer a morte do jovem. “É muito importante como primeiro passo no descobrimento da verdade. Isso confirma que a versão da família não era uma imputação ou acusação precipitada”, afirmou.

Lizama acrescentou que “a versão se ajusta completamente aos primeiros testemunhos que conseguimos recolher na madrugada de sexta e no sábado. Os vizinhos e testemunhas vão numa só direção: a bala assassina saiu de um piquete de carabineiros”.

Isaac Gutiérrez, irmão da vítima, acrescentou que a família avalia apresentar ações legais em função do crime, pois “os carabineiros deveriam ter aberto uma investigação interna para tratar de esclarecer e demonstrar transparência quanto aos fatos”, informou.

O ministro do Interior, Rodrigo Hinzpeter, declarou de forma incisiva que “se algum carabineiro se afastou das normas profissionais com que deve atuar, deverá responder com todo o rigor da lei e não hesitarei em fazer isso”. Na tarde desta segunda, Hinzpeter pediu ao comando dos carabineiros a saída do general Sergio Gajardo, depois que a força de segurança afirmou que um agente havia realizado disparos para o ar e depois também de Gajardo ter descartado, semana passada, qualquer participação de policiais na morte de Manuel Gutiérrez.

Enquanto isso, outros policiais foram afastados do serviço: os cabos Patricio Bravo Muñoz e Francisco Vásquez Flores, o carabineiro William Rodríguez e a subtenente Claudia Iglesias.

Os dirigentes estudantis também opinaram sobre o assassinato. Giorgio Jackson, presidente da Federação de Estudantes da Universidade Católica, assinalou que “para nós é muito importante que as responsabilidades sobre a destruição desta família pelo assassinato de um jovem de 16 anos, sejam apuradas e não fiquem impunes”.

Camila Vallejo, da Universidade do Chile, sustentou que na conversa com o presidente Sebastián Piñera, no palácio La Moneda, para tentar destravar o conflito educacional, um tema central será pedir explicações “cara a cara” pela morte do jovem baleado.

Enquanto isso, na vila Jaime Eyzaguirre, segue a dor depois que, no domingo, centenas de pessoas foram à Igreja Pentecostal para se despedir de Manuel e acompanhá-lo até o cemitério onde ele agora descansa.

Tradução: Katarina Peixoto

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