Plínio Bortolotti
Moradores do Cercadão , em Caucaia, esperam que o reconhecimento como comunidade quilombola lhes permita acesso a serviços públicos e programas do Governo Federal, destinados aos remanescentes dos quilombos
Os moradores do Cercadão iniciaram uma luta para serem reconhecidos como comunidade quilombola. É uma das várias pelejas que a comunidade enfrentou no decorrer de sua existência. Uma das mais duras foi para garantir a posse da terra, na década de 1970.
O Cercadão, uma gleba com 20 hectares, onde moram 530 pessoas de 156 famílias, fica na praia do Icaraí, em Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza. Desde o princípio, vivem em sistema comunitário, em que a posse da terra é coletiva.
Dona Maria dos Prazeres, uma das líderes da comunidade, explica como funciona o sistema: “Quando alguém se casa, basta escolher o lugar e construir a sua moradia”. A lavoura funciona do mesmo modo. Normalmente, o roçado é usado para agricultura de subsistência.
Com a transformação em comunidade quilombola, dona Maria espera que eles possam desfrutar de alguns benefícios públicos. Ela diz que a maioria dos moradores, os jovens, frequenta, no máximo, até o ensino fundamental. As escolas de ensino médio ficam na sede do município, a 10 km de distância, o que dificulta o deslocamento.
Segundo ela, uma das poucas possibilidades para as mulheres é trabalhar “em casa de família” e que os homens “não têm o que fazer” – principalmente depois que o mar destruiu a maioria das barracas de praia, onde eles se empregavam como garçons.
Também educadora, Dona Maria preocupa-se com a situação dos jovens, com a falta de alternativa para moradores (“a maioria vive do Bolsa Família”) e com o uso de drogas, “que hoje estão em todo lugar”.
Quilombola
O despertar para a possibilidade de se transformarem em comunidade quilombola deu-se com o Mova Brasil, projeto de alfabetização de jovens e adultos financiado pela Petrobras. Dona Maria e a filha, Franciane, atuaram como facilitadoras, utilizando o método Paulo Freire.
Elas dizem que, como o método parte da realidade do educando, alunos e educadores foram pesquisar as próprias origens, falando com as pessoas mais velhas da comunidade. Uma dessas “memórias” é o pai de Dona Maria.
No aperto de mão, ele se apresenta de um só fôlego: “José Gomes dos Santos é o nome do homem, nasci em 23 de outubro de mil novecentos e vinte e nove”. Ele é o morador mais antigo da comunidade, com 83 anos de idade.
A memória falha um pouco. Mas, ajudado pelas netas, ele diz que sua avó contava que, “depois de uma grande enchente no Norte” (que ele não explica exatamente onde), algumas pessoas vieram em um navio e se instalaram na localidade.
Pela história que dona Maria dos Prazeres conseguiu levantar, retroagindo na árvore genealógica das famílias mais velhas, e anotando as histórias que estas já haviam escutado dos antigos, ela supõe que os primeiros habitantes – um casal de escravos fugidos – instalou-se no local por volta de 1710.
ENTENDA A NOTÍCIA
De acordo com o decreto federal 4887/2003, são quilombolas “os grupos étnico-raciais, segundo critérios de autoatribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”.
Fonte: http://www.opovo.com.br/
http://africas.com.br/site/index.php/archives/10907?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed%3A+com%2FZLVz+%28AFRICAS.com.br%29