Justiça Federal torna nulo processo de reconhecimento das terras de São Jorge

Justiça Federal dá ganho de causa a grandes proprietários do norte do ES. Segundo a matéria do Jornal Século Diário, o Movimento Paz no Campo (MPC) teria cooptado um casal quilombola para contestar a ação de regularização do território da Comunidade São Jorge. Os créditos da matéria estão no final.

26/1/2010

Flavia Bernardes

O processo que buscava reconhecer e legitimar o território quilombola de São Jorge, no norte do Estado, foi anulado pela Justiça Federal. A juíza da Vara Federal de São Mateus, Stelly Gomes Leal da Cruz Pacheco, acatou pedido de Agenor e Minimozina Silvares, que alegam não ter autorizado a inclusão dos nomes deles no processo administrativo em questão. Entretanto, o processo foi protocolado em 2007 e, desde então, Agenor e sua família voltaram atrás.

A medida é resultado das tentativas do Movimento Paz no Campo (MPC) de minar o cumprimento do Decreto 4887/2003, que assegura o princípio da autodefinição para fins de caracterização das comunidades quilombolas e a demarcação de seus territórios pelo Incra.

“Há famílias que se recusaram a participar do processo para titular as terras quilombolas porque são informadas de forma errônea. Por ficarem muitas vezes fora dos debates, elas não entendem o fato de que a titulação trará o status de terra coletiva para a região e temem perder suas propriedades, o que não é verdade”, ressaltou a Asseguradora do Programa de Regularização Quilombola, do Incra, Domingas Dealdina.

Segundo os quilombolas, o que se vê na região é um enorme processo de sedução do MPC, visando a convencer os quilombolas que já possuem suas escrituras particulares de que a titulação das terras quilombolas não será um bom negócio. Atentos aos conflitos internos das comunidades, eles denunciam que o movimento se aproveita do receio das famílias com pouca instrução para exercitar seu poder de sedução.

Foi neste contexto que se deu a ação ordinária nº2007.50.03.000287-6, dos autores Argenor Silvares e Minimorzina Silvares contra a União Federal e o Incra, que resultou na nulidade do processo de reconhecimento das terras quilombolas de São Jorge. A informação foi de que os quilombolas foram convencidos de que o título coletivo das terras seria negativo para a família. A ação movida pela advogada do MPC, Leslie Mesquita Saldanha Lima, em nome da família Silvares, diz que  eles não solicitaram a inclusão de seus nomes no processo de titulação das terras quilombolas, e que estes haviam sido incluídos sem autorização ou declaração de vontade. A ação diz ainda que a família alegou a inexistência de comunidade remanescente de quilombolas e que teria recebido terras de seus antigos patrões.

Entretanto, o Incra declara que a família Silvares foi consultada e inclusive aceitou sua inclusão no processo, conforme consta nos documentos e fotos,  que comprovam a visita dos agentes e suas entrevistas e que constam no processo administrativo para a titulação das terras.

“No fim, foram duas famílias que prejudicaram 70 famílias da região. Desde 2007 muita coisa mudou e estas famílias, inclusive, recuaram, concordando em fazer parte do processo de titulação novamente. Eles falam que estão entendendo melhor porque sabem que não vão ficar sem suas terras. Mas ainda assim o MPC está presente, rondando. Falta participação da comunidade nos debates para que não haja estas dúvidas”, ressaltou Dealdina.

A informação é de que, mesmo com a desistência das famílias em manter o processo no último ano, a advogada do MPC, Leslie Mesquita, manteve a ação. Conforme publicado pelo jornal “Tribuna do Cricaré”, ela alega que seus clientes são analfabetos funcionais e não se autointitulam remanescentes quilombolas.

Segundo o Incra, as famílias não perdem suas terras, o que ocorre após a titulação da área como terras tradicionalmente quilombolas é que elas passam a ser inalienável e de domínio coletivo daquela comunidade. A Superintendência do Incra no Espírito Santo aguarda notificação para recorrer da decisão da juíza.

Segundo a União, os autores da ação foram devidamente notificados, conforme comprovam documentos anexados ao processo. Declara ainda que o relatório técnico de identificação e delimitação juntado aos autos deixa claro que os autores foram visitados e se autointitularam remanescentes de quilombolas; que dessa forma foram respeitados os princípios do contraditório e da ampla defesa/ que os comentários acerca das cadeias dominiais feitos pela autarquia tinham como preocupação a complementação e origem dos títulos para fins de indenização no caso de desapropriação.

Ao todo, o Incra conduz sete processos de reconhecimento de territórios quilombolas no Espírito Santo, sendo quatro em São Mateus (Serraria, São Cristovão, São Jorge e São Domingos; dois em Conceição da Barra (Linharinho e São Domingos); outro em Santa Leopoldina; um em Cachoeiro de Itapemirim e o último em Ibiraçu.

Ao todo, a área em disputa entre os quilombolas e representantes do MPC possui 13 mil hectares.

MPC

O MPC é conhecido como o maior representante dos grandes proprietários de terras no norte do Estado, tendo sede no próprio Sindicato Patronal Rural de São Mateus. O MPC é acusado de atacar o reconhecimento e a titulação dos territórios quilombolas; de distorcer informações, incitar preconceito racista, promovendo tensão, violência e intimidação; de ameaçar membros das comunidades quilombolas e também técnicos do Incra, a exemplo do cerco realizado à equipe do órgão em julho de 2008.

A situação de conflito já foi denunciada pelos próprios quilombolas à Comissão Especial de Monitoramento das Violações do Direito Humano e a Alimentação Adequada, que visitou o Estado em meados de 2008, na presença de uma comissão da 6ª. Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF).

Fonte: Jornal Século Diário – http://www.seculodiario.com.br/exibir_not.asp?id=4952 em 27/01/2010

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.