Acquário Ceará, objeto de 25 ações judiciais e processos, continua sendo construído

aquario1Cristina Fontenele, Adital

Nessa sexta-feira, 12 de dezembro, o Coletivo Urucum Direitos Humanos, Comunicação e Justiça lança o Relatório dos Processos Judiciais Sobre o Acquario Ceará, que está sendo construído em Fortaleza, Estado do Ceará. Realizado em parceria com o Fundo Brasil Direitos Humanos, o informe levanta as 25 ações judiciais e processos administrativos relativos aos impasses técnicos e legais relacionados à construção do oceanário, mais conhecido como “Aquário Ceará”, orçado inicialmente em R$ 250 milhões.

As ações, que tramitam ou tramitaram na justiça estadual, na Justiça Federal do Ceará e/ou no Tribunal de Contas do Estado, tratam de violações ambientais, falta de transparência sobre os impactos do empreendimento e do retorno do investimento público, além da ausência de licitação para contratação de empresas.

Em entrevista à Adital, a advogada e integrante do coletivo Urucum Patrícia Oliveira fala destaca os impactos do projeto e a postura do Governo do Estado do Ceará. De acordo com ela, o governo não tem demonstrado que o Aquário pode dar retorno ao investimento e que terá capacidade financeira de se sustentar. O relatório cita, por exemplo, o caso de Lisboa [Portugal], cujo oceanário, ano após ano, vem apresentando prejuízos.

Sob o argumento do Estado de que o Aquário irá fomentar o turismo na região, Patrícia comenta que “o Turismo não deve agredir a cidade, mas sim incluir a comunidade, o cidadão. A comunidade do Poço da Draga [localizada ao lado do empreendimento] é centenária e, por ser pobre, é vista como um problema para o turista.”, reforça Patrícia.

Há falta de comunicação, informação e transparência. A advogada comenta que é dito à comunidade que existe um projeto de requalificação, sob o argumento de que essas pessoas estão em área de risco. “Embora não concorde, a comunidade não sabe de mais nada, nem como será a remoção, quando e quantas famílias terão que sair”.

Uma das irregularidades apontadas no relatório é sobre a competência para licenciar a obra, que seria da União, portanto do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis] e não de funcionários terceirizados da Semace (Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Ceará). A legislação só permite terceirização do serviço público para atividades-meio e não atividades-fim do órgão. Patrícia cita o exemplo de um funcionário terceirizado que atuou tanto na fase de solicitação do licenciamento quanto na fase de autorização da licença. Um mesmo funcionário comprometido em fases de interesses convergentes.

Outro problema preocupante é a ausência de licitação para a contratação da empresa Imagic!, responsável pela elaboração do projeto do aquário, e da ICM Reynolds, que responde pela construção do oceanário. O governo teria utilizado a Secretaria Estadual de Turismo (Setur) para contratar, sem licitação, as empresas. Em processo, a Setur alega que a empresa contratada é a única com capacidade técnica para a construção do Aquário Ceará. O relatório destaca que governo realizou também, em condições irregulares, um empréstimo no banco internacional ExIm Bank/Export Import Bank, dos Estados Unidos.

O relatório aponta ainda que o oceanário deverá custar bem mais do que o inicialmente orçado, entre diversos fatores, devido ao atraso das obras e aos acréscimos não previstos, como a construção de uma termelétrica nas imediações para alimentar o funcionamento do empreendimento.

Estudos realizados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), autor em uma das ações judiciais, indicam a existência de estruturas arqueológicas na região do Aquário, sendo imprescindíveis pesquisas adequadas para não mutilar bens e prováveis sítios arqueológicos existentes na região.

Entre os graves impactos ambientais levantados, estão também os efeitos sobre a água e sobre a fauna. Segundo Patrícia, o projeto do Aquário não define, de forma clara, de onde virá a água e para onde irá. “A água não pode, simplesmente, voltar para o mar.” A convivência entre as espécies exóticas com a fauna nativa também é preocupante.

Ela reforça que o papel do Coletivo Urucum nesse contexto é ajudar a traduzir a linguagem jurídica das ações judiciais, esclarecendo as informações e fortalecendo um diálogo entre sociedade civil e o Ministério Público, para que a sociedade compreenda a situação, apoie e pressione a justiça.

O Aquário seria baseado em um modelo global de turismo, sem levar em consideração a realidade local e suas características. Para a advogada, pode-se considerar que é um empreendimento “além de segregador, imoral e um acinte à sociedade, quando não há água nem dentro da cidade o Estado vem com esse projeto”.

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