Por Biaggio Talento, em A Tarde
Uma campanha pela canonização daquele que pode vir a ser São Tibira do Maranhão será aberta pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) na próxima terça-feira, 9, véspera do Dia Internacional de Direitos Humanos. A entidade alega que o índio tupinambá Tibira seria o “primeiro mártir gay das Américas”.
A iniciativa é do antropólogo e historiador Luiz Mott, fundador do GGB, que vai lançar na terça, o livro São Tibira do Maranhão, 1614-2014, Índio Gay Mártir, junto com o cordel Tibira do Maranhão: Santo Homossexual, da cordelista e doutora da Ufba Salete Maria. O lançamento será às 18h, na Biblioteca Central dos Barris.
O martírio do índio é descrito pelo frei capuchinho francês Yves d’Evreux no seu livro História das Coisas Mais Memoráveis Acontecidas no Maranhão nos Anos de 1613 e 1614. Após se instalarem no Maranhão, os franceses, liderados pelo frade capuchinho, foram informados da existência de um famoso Tibira, termo da língua tupi que designa índios homossexuais. Mott lembra que na época a sodomia era considerada pela cristandade “o mais torpe, sujo e desonesto pecado”.
Para evitar um temido castigo divino e aterrorizar eventuais futuros amantes do mesmo sexo, diz o antropólogo, ordenaram os capuchinhos a captura e prisão do índio gay, “que foi sumariamente julgado, batizado e condenado à morte”.
A execução
“Estouraram o Tibira, amarrado na boca de um canhão, ao pé do Forte de São Luís, caindo seu corpo estraçalhado na baía de São Marcos, para limpar a nova conquista do abominável e nefando pecado de sodomia”, diz Mott, definindo a execução: “Arbitrária e sem autorização do papa ou da Inquisição”, sendo descrita e justificada pelo missionário em seu livro.
Antes da ordem de sua morte, Yves d’Evreux batizou o índio com São Dimas, “o ‘bom ladrão’, perdoado por Jesus no Calvário”. O GGB resolveu lembrar o 4º centenário da execução com o lançamento da campanha pela canonização. Como estratégia, está “exigindo” o pedido de perdão público, pelo superior geral da Ordem dos Capuchinhos de Roma, por esse “abuso fundamentalista, já que os missionários não tinham autoridade para condenar à morte os sodomitas (gays)”.
O grupo requer, igualmente, que o governo do Maranhão e a prefeitura de São Luís “construam um monumento em homenagem ao mártir gay tupinambá no local da execução: na confluência da atual Rampa do Palácio com a Avenida Beira Mar”.
Por fim, “visando resgatar a heroicidade do primeiro mártir gay indígena brasileiro, vítima da homofobia religiosa”, o GGB enviou ofício à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil solicitando que interceda junto ao Vaticano pela abertura de processo de canonização de Tibira do Maranhão.
O grupo alega o precedente do “bom ladrão”, que, “apesar de seu passado pecaminoso, Jesus o perdoou garantindo-lhe um lugar, como santo, no céu. O mesmo ocorreu com esse índio gay maranhense, que, ao ser executado, como garantiu seu juiz e executor, o capuchinho Yves Évreux, ‘sua alma imortal foi levada pelos anjos ao céu, pois morreu logo depois do batismo, certeza infalível da salvação daquele a quem Deus concedeu tal graça, tão rara como o arrependimento do “bom ladrão” na cruz, a quem Jesus prometeu: Hoje estarás comigo no Paraíso!'”.
Os gays baianos conclamam a Fundação Nacional do Índio e associações de povos indígenas do Brasil “para que encampem essa campanha, para que a Igreja Católica eleve Tibira aos altares, como mártir, já que foi executado devido à homofobia e ao etnocentrismo europeu-cristão, considerando que a homossexualidade masculina e feminina era fartamente praticada e respeitada entre todos nossos povos nativos, embora contemporaneamente seja discriminada, sobretudo nas aldeias e culturas que foram convertidas ao fundamentalismo cristão”.
A iniciativa do GGB procura também chamar a atenção para as execuções que continuam a vitimar os homossexuais no Brasil contemporâneo: “50% dos assassinatos de LGBT do mundo ocorrem no nosso país, um “homocídio” a cada 28 horas. Um total de 284 crimes homofóbicos somente neste ano”, informa o GGB.
Fato relevante, sobre o qual eu nunca antes tivera notícia. deve ser divulgado e se efetivamente houver comprovação histórica para este fato tão estarrecedor, mesmo levando-se em conta a mentalidade da época em que foi praticado, deve realmente a Ordem dos Franciscanos uma retratação pública sobre o ato, não só perante a comunidade LGBT, mas perante toda a cristandade.