Políticas habitacionais não conseguem evitar o agravamento de um problema que se espalha pela capital: os moradores de rua
Embora os avanços na construção de moradias e de políticas habitacionais desenvolvidas pelos governos municipal, estadual e federal, como o “Programa Minha Casa, Minha Vida”, morar debaixo de pontes e viadutos ainda é uma realidade para muitas famílias em Manaus. Na maioria dos casos, as questões financeiras e pessoais, como o desemprego e a depressão, são alguns dos vários motivos que levam essas famílias a viverem escondidas atrás de colunas, em condições precárias, sujeitas à violência.
O casal Amilton Vasconcelos, 49, e Roberta Costa, 26, que vive há quase três anos debaixo da ponte sobre o igarapé do 40 que liga os bairros Cachoeirinha e Educandos, na Zona Sul, é o retrato da falta de perspectiva e alternativa de uma vida melhor. Amilton, que chegou a atuar como carregador no porto da Panair, no Educandos, contou que morava numa casa alugada no igarapé do 40 e, com a chegada com Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (Prosamim), ele a mulher tiveram que deixar o local. Sem recursos e sem ter para onde ir, Amilton, não teve alternativa e foi morar debaixo da ponte.
Emocionado, o ex-carredor lembrou que ainda tentou se cadastrar no Prosamim, a fim de obter um apartamento, o que foi vão por falta de titularidade do imóvel. “Foi desesperador, sem ter para onde ir e com pouco dinheiro, mal dava para uma semana de refeição”, lamentou.
Enfrentando fortes chuvas e vencendo um dia por vez, Amilton almeja um futuro para ele, a mulher e a filha de apenas dois anos, que hoje vive na casa de amigos, para que não ficasse sob a responsabilidade do Conselho Tutelar. “Não quero que minha filha leve uma vida como esta, ela é a promessa de uma vida melhor”.
Amilton fez questão de mostrar à reportagem de A CRÍTICA o abrigo, improvisado com lonas e pedaços de madeira, e poucos os detalhes que fazem dali um “lar”. As pilastras de concreto substituem as paredes e permitem que ele a mulher emoldurem a “casa”.
Improviso
Numa outra área debaixo da ponte, outras quatro famílias dividem espaço. O local um dia serviu de endereço fixo para o eletricista e técnico em mecânica Rodney Santos, 30, que atualmente mora de aluguel num pequeno cômodo no Centro. Ele contou que um desentendimento com a mulher o levou a conviver, por quatro anos, com o barulho dos carros e com a solidão, que trouxe para a vida dele o vício das drogas.
Rodney, que chegou a trabalhar na construção da Ponte Rio Negro, reconheceu que as drogas contribuíram para os momentos de aflição. Na segunda-feira, ele esteve no abrigo de Amilton, a quem ajuda como pode. Segundo ele, a prefeitura nunca se importou com a situação deles. A única ajuda vem de doações.
Prefeitura sem controle sobre problema
A Secretaria Municipal e Assistência Social e Direitos Humanos (Semasdh) informou que não existe uma contagem absoluta de moradores de rua em Manaus. Por mais que se tenha um serviço de busca ativa, órgão explica que há que se levar em consideração que os moradores de rua têm seus diretos respeitados: eles não podem ser retirados à força, pois têm a liberdade de ir e vir garantida constitucionalmente.
Segundo a Semasdh o trabalho feito é de convencimento, de ressocialização, oferecendo alternativas, como o Centro Especializado de Referência da Assistência Social voltado ao atendimento psicossocial a essa parcela da população, o (Creas-Pop), na rua Silva Ramos, no Centro.
O local é a porta de entrada para os moradores de rua acessarem a rede de assistência social, assim como o Serviço de Atendimento Institucional Emergencial (Saie) Amine Daou Lindoso, que funciona no mesmo prédio. Neste último, os moradores de rua vão para terem acesso a serviços básicos como alimentação e higienização, atendimento psicossocial e retirada de documentos e, em um segundo momento, são dirigidos a cursos profissionalizantes, tentativas de reinserção familiar e no mercado de trabalho formal.
Crianças, adolescentes e drogas
Outro ponto da cidade, embaixo da ponte que liga a avenida Senador Álvaro Maia, Centro, Zona Sul, à avenida Brasil, no bairro da Compensa, Zona Oeste, é “dominado” por crianças e adolescentes. Lá, a presença de adultos é pequena.
Nos abrigos improvisados, eles forram o chão com papelão ou colchões surrados, que exalam urina. Garrafas pet são encontradas aos montes, sempre amassadas – o que indica o uso da cola de sapateiro, vício comum entre as crianças e adolescentes que vivem ali.
Quem entra embaixo da ponte, próximo ao rio, pode avistar alguns móveis espalhados pelo local. Sofás, mesas e armários são alguns dos objetos. Elisangela Lima, 26, que estava no local para rever amigos do passado, morou ali por quatro anos e contou que todos têm histórias de abandono das famílias e de entrega às drogas.
“Eu passei por isso, mas há quase dois anos encontrei um homem, com quem casei e fui morar no interior do Estado. Mudei, em parte, a minha vida, porque o vício é difícil de deixar”, contou, se referindo a uma garrafa com cola que cheirava enquanto era entrevistada. “Quando acabar de cheirar isso vou me despedir dos colegas, porque vou retornar para minha cidade”.
Pontos Levantamento para mapear desabrigados
A pedido da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) e do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome (MDS), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) fará um levantamento detalhado sobre as populações de rua no País.
Segundo levantamento feito em 2012 pelo Departamento de Proteção Social Especial (DPSE) da Semasdh, pelo menos 150 pessoas ainda moram nas ruas de Manaus. De acordo com a pesquisa, eles tem entre 18 e 72 anos.
Em reunião do Conselho Deliberativo do Fundo de Promoção Social, em 2012, o Estado liberou R$ 1,4 milhão para projetos de instituições consolidadas no interior.
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