Prisões, desaparecimento e tortura nas grandes obras do PAC

Raimundo Braga da Cruz Sousa, ex-operário da Hidrelétrica do Jirau, passou mais de 50 dias preso por crime que não cometeu. Fotos: Fernando Leite / Jornal Opção

Déborah Gouthier

A Usina Hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, é uma das principais obras em construção no país, conduzida com recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), do governo federal. Desde o início, a obra foi marcada por críticas em relação à políticas públicas, meio ambiente e, principalmente, aos direitos humanos. Os problemas foram intensificados em 2011, quando os quase 20 mil operários envolvidos na construção conduziram um forte movimento grevista, no qual reinvindicavam melhores condições de trabalho e aumento salarial. A greve desembocou em uma revolta dos operários, marcada por um incêndio no canteiro de obras.

Um ano depois, já em 2012, os trabalhadores contratados, em sua maioria, pela construtora Camargo Correa deram início a uma nova paralisação, diante do não cumprimento do acordo obtido e da continuidade nos problemas trabalhistas, que incluiam mortes, doenças e humilhações. Em 3 de abril, um novo incêndio tomou conta dos alojamentos dos operários e 24 mandados de prisão foram expedidos, denunciando alguns dos grevistas como responsáveis pelo atentado. Entre eles, dois continuam presos ainda sem julgamento e 12 estão desaparecidos.

Findada a greve e refeitos os alojamentos, a construção continua a todo vapor. Entretanto, com o apoio e respaldo da Liga Operária, uma entidade classista anti-partidária que luta pelos direitos da classe trabalhadora, alguns dos operários resolveram denunciar o que, segundo eles, ocorre por trás das notícias divulgadas pela mídia local e dos interesses das contrutoras e do governo federal. O Jornal Opçãorecebeu um deles, o piauiense Raimundo Braga da Cruz Sousa. Com 22 anos de idade, ele trabalhou por oito meses em Rondônia, nas obras da Hidrelétrica do Jirau, e acabou passando 54 dias preso como um dos responsáveis pelo incêndio. Sem direito a resposta, a condições básicas de higiene e sem nem saber do que se tratava. Confira a seguir a entrevista concedida por ele e por Gerson Lima, integrante da Liga Operária que o tem acompanhado em palestras e discussões por todo o Brasil.
Quantos anos você tem, Raimundo, e quanto tempo trabalhou na obra do Jirau?
Raimundo:
 Tenho 22 anos. Trabalhei lá por oito meses. Entrei em 17 de outubro de 2011, contratado direto pela Camargo Correa.

Como você conseguiu o emprego?
Raimundo: 
Ouvi na rádio da cidade onde moro, Luzilândia, no Piauí. O cara tava anunciando trabalho, fui até lá e perguntei como fazia. Ele falou que eu levava identidade, CPF, carteira de trabalho e ele levava. Ele tava cobrando R$ 500 e disse que encaminhava a gente direto para o escritório da Camargo Correa e já alojava no canteiro de obras. Botei meu nome, mas no dia marcado eu ainda não tinha conseguido o dinheiro para pagar e não pude viajar. Ele veio com a carrada, mas só depois de uns 15 dias eu arrumei o dinheiro e vim por minha conta. Quando cheguei na rodoviária, já encontrei alguns colegas meus, que já tavam voltando, rodado, sem dinheiro, sem hotel pra ficar. O cara tinha sumido, ninguém sabe pra onde ele está. A Camargo não estava contratando ninguém. Como eu ainda tinha um pouco de dinheiro, fiquei por lá também no hotel. Quase um mês depois eles começaram a chamar, o Sine de Porto Velho chamou e fomos alojados no canteiro de obras, onde eu fiquei oito meses.

Como eram as condições do alojamento que você ficava?
Raimundo:
 Era dentro do canteiro de obras mesmo. E as condições eram péssimas. Agora capaz que está tudo novo, porque queimou e capaz que eles ajeitaram. Mas era tudo podre, caindo. Quando apodrecia uma tábua, ele trocavam e colocavam outra no lugar, só. Dormíamos nesses quartos, tinha cama pra todo mundo, eram oito pessoas por quarto. Só que ainda antes da greve eu pedi pra sair. O encarregado preparou minha saída, dei parte no alojamento e tudo. Fui no médico para pegar resultados dos meus exames, mas não passei, porque a doutora disse que não podia me mandar embora porque eu estava com uma hérnia. Então ela fez o relato e me mandou para Porto Velho. Até então eu nem sabia que ia ter greve. Quando ela começou, faltava só um exame para fazer e o médico dizer qual dia eu ia operar. No dia do incêndio eu estava olhando isso na cidadezinha de Jaci-Paraná, lá próximo.

E como tudo aconteceu?
Raimundo: 
Cheguei no alojamento por volta de 1h30 da manhã, de longe eu já vi aquele fogão e saimos correndo. Fui direto pro meu alojamento, que não tinha pegado fogo ainda. Peguei minhas coisas e avisei que eu ia descer no outro pavilhão e já voltava, porque fui ver meus colegas que moram perto de casa pra gente ir embora junto. Nós tinhamos que sair de dentro do canteiro de obras, porque não tinha mais lugar pra ficar, tava só aquele fumacê. Passei pela viatura da polícia no meu pavilhão e fui lá no outro. Procurei pelo fulano de tal, rodiei o pavilhão, quando chego atrás encontrei meu colega e fiquei conversando com ele. Quando vejo, o policial chegou por trás de mim, me deu voz de prisão e veio perguntando:
– É tu, vagabundo, que tá tocando fogo?
Eu digo: – Eu não, senhor, acabei de chegar da cidade, vim aqui só buscar minhas coisas e atrás dos meus coelgas aqui porque quero ir embora.
– E esse isqueiro aí na sua mão?
– Esse isqueiro é meu, senhor, sou fumador desde os dez anos.
– Nada vagabundo, foi tu que tocou fogo.
– Fui eu não senhor, num tenho coragem de fazer uma coisa dessa. – Aí eles já me mandaram pra parede, começaram a me chutar, me algemaram e levaram pra viatura. E sairam mostrando a obra pra mim, dizendo:
– Olha o que tu fez, desgraçado!
E eu digo que não fui eu, num tenho coragem de fazer uma coisa dessa.
– Depois que tu acabou com tudo, diz que não foi tu. Quem são seus companheiros?
– Num sei de nada desse negócio de greve.
– Tu sabe e vai dizer. – E me levaram para o alojamento dos encarregados e das mulheres, me jogaram num quarto e começaram a bater. Isso era por volta de 2h30 e ficou até 6h30 da manhã para eu dizer quem eram os tocador de fogo, sem eu saber quem era. Todo esse tempo eu apanhei, de 2h30 até 6h30. Quando deu 6h30, mandaram eu olhar para eles e começaram a jogar gás de pimenta na minha cara. Aí num enxerguei mais nada. Cai no chão e começaram a me chutar. Ouvi que entrou mais um e falou:
– Para com isso, num pode fazer isso aqui não porque estamos dentro do canteiro de obras, pode alguém ver.
Aí parou de me bater, saiu e fechou a porta. Mais ou menos por volta de uma hora depois que eu comecei a enxergar de novo. Então eles me levaram para a delegacia, deu entrada e o pessoal da Camargo chegou com os papéis da demissão por justa causa para eu assinar. Eu disse que num ia assinar, porque não devia a eles. Depois me levaram direto para o presídio, o Pandinha. Cheguei lá 11h da noite e me jogaram numa cela de 1m por 3m. Eu e mais seis dentro da cela, num tinha área para tomar banho, nenhuma água ou produto para escovar a boca, passei 15 dias lá dentro, a água escorria na parede.

E essas outras seis pessoas estavam lá pelo mesmo motivo que você?
Raimundo:
 Não, eram da cidade mesmo, assunto deles. Passei esses 15 dias e depois da primeira triagem é que fui ter direito a uma escova e uma banda de sabonete. Lá nessa cela nova, era de uns 4m por 5m. Me jogou lá e tinham 84 presos, a água caía mais forte, mas era só por 10 minutos para 84 presos. Então não podia demorar, se não os outros achavam ruim. Depois de 10 dias fui para outra triagem, fiquei com mais 24 presos e passei sete dias, me jogaram noutra cela com mais 12, todo esse tempo dormindo no chão, nunca mais me deram nada, só esse que eles chamam de kit higiênico. E para manter as minhas coisas eu limpava o chão para os presos, lavava roupa, lençol, fazia tudo pra eles para ter minhas coisas e não criar bicho lá dentro. Até um remédio que você pede para eles, tudo lá é injeção, toda doença que tu tem. Só então fui ter direito de banho de sol e encontrei um colega lá, porque os outros presos estavam chamando ele de “incendiário”. Ouvi e perguntei de onde ele era, e ele disse que também era da Camargo e que estava com o advogado lá, doutor Ermógenes [advogado da Liga Operária]. Ele falou para eu dar meu nome pra ele, porque o advogado ia lá amanhã. Escrevi meu nome e dei para ele, pra conseguir chegar com meu nome lá fora.

Mas como você escreveu o nome, aonde?
Raimundo: 
Com sangue. Corta o dedo com uma giletezinha e escreve o nome no miolo do papel higiênico, porque lá dentro não tem papel nem caneta, nem nada. Depois de três dias o doutor Ermógenes me chamou, até achei que era meu alvará de soltura. O advogado disse que ninguém nem sabia que eu estava lá, nem sabia que tinham outros presos, e que o julgamento ia ser no dia 28, que ele ia me acompanhar. Ele até levou umas coisas para nós, mas o agente do presídio não aceitou, não deixou entrar com coisa de limpeza nem nada. Dia 28 de maio foi a minha audiência e fui absolvido.

E como foi a saída do presídio?
Raimundo: 
Sai e fui atrás das minhas coisas. Documento, carteira de trabalho, meu registro, roupas, mala, porque ficou tudo lá na obra, no meu quarto. A polícia, na hora, não me deixou pegar. Quando cheguei lá, fui no escritório central e perguntei qual o motivo da justa causa do Raimundo. Ele mexeu no computador, olhou pra mim e entrou para dentro. Poucas horas depois chegaram cinco guardas, me chamaram e falaram que no dia 3 eu tinha recusado assinar a justa causa, se agora eu ia assinar. Falei que não, porque não devia a eles. “Só quero que vocês acertem comigo direitinho, fui absolvido provando que não tenho nada a ver com o fogo, então quero que vocês me deem o que é meu por direito e me mandem embora. Então eles me despacharam, jogaram na portaria feito um cachorro, tipo: “Te vira”. Não me deram nada, nem passagem para eu sumir de lá, nem nada.

Nem as suas coisas?
Raimundo:
 Nem minhas coisas. Fiquei na rua. Aí fui na delegacia e expliquei o que estava acontecendo. O delegado puxou tudo, viu o que tinha acontecido e foi lá comigo. Fomos direto no meu quarto e ele me mandou pegar o que fosse meu. Mas já tinham outros moradores e num tinha nada meu lá, nem mala nem documento nem nada meu. Coisa que é da gente a gente conhece. Eles falaram que num sei quem devia ter guardado, mas ninguém nunca achou minhas coisas. Fiquei sem documento para viajar, sem nada, então voltei e fiz a ocorrência na delegacia para ter meus direitos. Só quero que eles me deem o que é meu, acertem tudo direitinho.

Quando você entrou na obra, quanto ficou combinado para receber?
Raimundo:
 Não tinha nada combinado. Era pelo tanto de tempo que eu quisesse trabalhar. Tirava uns R$ 800 na carteira, porque era R$ 3,63 a hora trabalhada. Para tirar um salário melhor, a gente trabalhava de segunda a segunda. Muita gente fazia um sábado, outro sábado. Queria trabalhar para ver se tirava mais. A pior coisa que tem em obra, quem trabalha mais, é sempre o ajudante. Sempre trabalhei como ajudante de obra, nunca tive outra profissão. Mas essa é a pior humilhação da gente, ninguém dá valor no serviço.

Que tipo de humilhação é essa?
Raimundo:
 Principalmente pelos encarregados. Eles ficam humilhando o trabalhador, não pode parar um pouquinho que diz que vai mandar empora por justa causa, eles caçam meio para fazer isso. Cadê o sindicato de lá? Diz que tem sindicato dos trabalhadores, prega lá nas paredes tudo, mas para quê? O sindicato entrou lá uma vez, durante a greve e falou: “Quem quer trabalhar? Quem não quiser, traz as carteiras que a gente manda embora.” Isso não é coisa para sindicato fazer não, se é dos trabalhadores! Aí a negada meteu pedra neles… Todo mundo só queria boas condições de trabalho e o sindicato faz essa proposta.

Como você, quantos outros foram presos na greve?
Raimundo: 
Lembro que eram 24 com mandado de prisão. Doze estavam presos lá e os outros doze sumiram. Agradeço a Liga Operária porque me encontrou, porque se não fossem eles, acho que eu teria ido para esse mesmo caminho do pessoal que sumiu. Pode estar morto ou num sei aonde.

Onde você acha que eles estão?
Raimundo:
 Só Deus pra saber. Se não tomar providência lá dentro… Em Porto Velho ninguém nem ouve falar, ninguém toma providência de nada pelos operários. Só algumas mães que vão atrás.

O que tem de resultado disso, têm suspeitas do que foi feito com o pessoal que sumiu?
Gerson:
 O advogado nos relatou que em conversa na Superintendência do Trabalho em Rondônia, ele ouviu falar, jocosamente: “Cuidado para esse pessoal não ter descido o Rio Madeira ou ter sido cimentado em Jirau”. Isso significa, na gíria de Rondônia, ser assassinado e jogado no rio. E isso foi uma pessoa do governo quem falou. Tem muitos boatos. Pode ter algum que está foragido ou pode ter ocorrido mesmo essas mortes, não descartamos nenhuma situação. O advogado está exigindo providências do juiz, porque o processo é contraditório. Em algumas peças do processo fala que eles estão presos no Pandinha, que é esse anexo do presídio Urso Branco; outras peças falam que eles estariam foragidos. E tem dois operários que estão, desde o dia 4, presos arbitrariamente, sem ter sido julgados. Os dois eram lideranças da greve: Jhonata Lima Carvalho e Carlos Moisés Maia da Silva. E estão há mais de 90 dias presos na mesma condições precárias que o Raimundo ficou.

Acusados pelo incêndio?
Gerson: 
Sim, acusados pelo incêndio. E nós temos razões para acreditar que o fogo tenha sido causado pela própria Camargo Correa. Porque ela está disputando judicialmente com as seguradoras por causa do incêndio de 2011. É um valor astronômico que varia de R$ 400 milhões a R$ 1 bilhão, que ela está pleiteando em fóruns internacionais, inclusive. E a Camargo precisa caracterizar isso como uma ação criminal para ter direito ao seguro. Se for caracterizado como um problema trabalhista, ela perde. Então, a greve desse ano, ao contrário do ano passado, tinha direção clara e orientação para ser um movimento pacífico, como correu durante 26 dias.

E a adesão dos trabalhadores a essa greve?
Gerson:
 Era total, todos os trabalhadores participavam.
Raimundo: Estava todo mundo parado, ninguém trabalhava no canteiro de obras não.
Gerson: O Raimundo não atuava direto na greve, mas a adesão era total. A greve foi de 8 de março a 25 de abril – nesse período houve repressão da companhia de operações especiais de Rondônia, da Força Nacional, Polícia Federal e outros órgãos. E os trabalhadores mantiveram a greve firme até que irrompeu esse incêndio na madrugada. Aí ouve mais repressão. Inclusive, no dia que a Força Nacional invadiu, um trabalhador morreu, um operário amazonense. A empresa e a polícia falam que ele teve um ataque cardíaco, mas a filha dele encontrou o corpo todo com marcas de ferimentos, nos braços e pernas. Nós também temos ainda imagens de uma cela que existe dentro do canteiro de obras.

Usada para quê?
Gerson:
 É uma cela de tortura. Os operários, da vez passada, levaram tiros, ficaram presos e agora também. Ficam lá, sem alimentação e depois são levados para os presídios. No ano passado, a explosão foi resultado de uma revolta generalizada. O canteiro foi praticamente todo queimado. Agora, estranhamente, foi só o alojamento dos trabalhadores. Em 2011, foram mais de 6 mil demissões na greve, mas houve um acordo assinado entre a Camargo e o sindicato, garantindo direitos, mas nada foi cumprido. E em 2012 foram mais de 2 mil demissões.

Como terminou a greve?
Gerson:
 Terminou com o incêndio. O sindicato teve essa postura patronal de falar que os operários eram bandidos, vândalos, incendiários; a Camargo Correa e órgãos de imprensa local publicaram isso e a foto dos operários colocados como criminosos; a Força Nacional ocupou o canteiro de obras com mais de 450 homens e também foi instalada uma delegacia lá dentro, com a intenção de reprimir os trabalhadores, como era feito no tempo da escravidão, com senhores de escravos e capitães do mato. Em contrapartida, as condições de trabalho continuam péssimas. Da greve para cá, foram, no mínimo, duas mortes de operários em acidentes de trabalho, devido às péssimas condições e à falta de medidas corretivas de segurança. Um deles, por exemplo, caiu de uma altura de 50 metros porque a madeira do andaime estava podre. Isso sem contar o crescimento populacional por conta das obras, a desocupação de famílias que vivem às margens dos rios, tribos indígenas atingidas pela inundação. A intenção do governo é fazer a obra o mais rápido possível e com o financiamento dessas empresas não há uma ação enérgica do Estado para coibir esse abuso. Ao contrário, há uma ação enérgica para reprimir os trabalhadores. Como eles são procedentes do interior, de regiões longíquas, de famílias pobres e sem condições de denunciar, tudo isso fica encoberto.

E qual o próximo passo da Liga Operária, nesse processo?
Gerson:
 A gente vai ter ações trabalhistas, exigindo indenização moral, ressarcimentos dos danos dos trabalhadores. A ideia é formar uma comissão com entidades, parlamentares, órgãos diversos, para ir até Rondônia e pressionar pela libertação dos presos, conclamando os operários dessas grandes obras do PAC para lutar contra essa situação, se unir contra esse massacre. Porque nossos trabalhos estão concentrados em Rondônia, que são as maiores obras, mas também temos acompanhado problemas em Belo Monte, no Pará; nas obras dos estádios, em Brasília, em Belo Horizonte; nas obras do Minha Casa, Minha Vida, onde foi encontrado trabalho escravo; e vários outros locais onde o governo não fiscaliza e deixa as empresas terceirizarem e usar todo o tipo de expediente para aumentar a lucratividade em detrimento das condições de trabalho e de vida dos operários.

Quais resultados já foram obtidos com esse trabalho?
Gerson:
 É um trabalho de denúncia. Então, de concreto, em termo de ação do governo e da Justica, não teve nenhum resultado. Tem a promessa de que vão agir, mas até os próprios órgão que querem defender o trabalhador encontram dificuldade. O próprio Ministério Público do Trabalho, em Rondônia, tem sua ação tolhida por ação de Brasília, por pressão do governo e das empreiteiras, que gozam de muita impunidade. Nosso trabalho então, é na resistência e na união dos trabalhadores para que a própria classe se levante para lutar pelos seus direitos.

E você, Raimundo, qual sua intenção ao contar essa história por todo o Brasil?
Raimundo:
 Acho que, além de ser bom para mim, é importante pro mundo todo ficar sabendo dos podres deles. Meus próprios colegas nordestinos, para não saírem da terra deles atrás da conversa de qualquer pessoal que chegar lá. Quando vier, vir assinando a carteira e com emprego já garantido. Com certeza, se tem essas pessoas, esses gatos que trazem o povo para as obras, é porque conhecem gente lá dentro, já trabalhou com a empresa e pode organizar essa máfia. E deixam a gente aí para os cachorros comerem. Isso só aumenta a quantidade de mendigo que anda por aí, é esse pesssoal que é jogado na rua, principalmente operários do Nordeste. Porque eles não dão valor para quem é de lá, principalmente do Piauí e do Maranhão. Pouca gente tem estudo, a maioria é trabalhador de roça. Eu mesmo, desde os meus 8 anos é só roça, só estudei até a 4ª série. Aí você chega para trabalhar, ganhar um dinheiro para ajudar a família e acaba sendo preso e humilhado pela polícia.

Qual seu plano agora?
Raimundo:
 É continuar minha vida e voltar pra minha terra. Dizem que lá o sofrimento é grande, mas não como nesses trabalhos. Onde eu moro é difícil, mas a gente não é humilhado por ninguém. Trabalha o dia que quer e ninguém humilha você, como fazem lá. Nessas obras aí, é a pior humilhação que tem no mundo. Na sua terra não, você tem conforto na sua casa.

Então, hoje, você não sairia da sua terra para ir para canto nenhum?
Raimundo:
 Acho que não, posso até sair, mas só se precisar muito. Antes ficar comendo meu feijãozinho, do que passar por tanta humilhação.

http://www.jornalopcao.com.br/posts/ultimas-noticias/prisoes-desaparecimento-e-tortura-nas-grandes-obras-do-pac. Enviada por Monica Lima.

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