Por Nuno Nunes
A Constituição Federal de 1988 define bem: no Brasil, o Estado de Defesa é decretado pelo Presidente da República, que deverá submeter o decreto à apreciação do Congresso Nacional, que a fará em 24 horas. É o que rege o Artigo 136 da Carta Magna.
Estado de Defesa é a situação emergencial prevista na Constituição, caso o país viesse a sofrer agressão efetiva por forças estrangeiras, grave ameaça à ordem constitucional democrática ou calamidade pública. Este seria o Estado de Exceção.
Porém, no dia 16 de julho de 2012, o Brasil esqueceu disso quando LUÍS INÁCIO LUCENA ADAMS, Advogado Geral da União, assinou a Portaria n° 303, que ataca diretamente os Povos Indígenas, suas terras e a Fundação Nacional do Índio.
A Portaria segue as Condicionantes do Supremo Tribunal Federal no processo da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Apesar do próprio STF já ter negado qualquer ligação entre este processo e as demais Terras Indígenas do Brasil, algo levou a AGU a fundi-los.
Em 23 de maio de 2012, o ministro do STF Ricardo Lewandowski negou seguimento à Reclamação (RCL) 13769, na qual o Município de Amarante do Maranhão alegou que a sentença proferida pelo Juízo da 20ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, em mandado de segurança impetrado pelo município maranhense, teria desrespeitado a decisão do STF no processo envolvendo a Terra Indígena Raposa Serra do Sol (PET 3388/RR). Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, no caso Raposa Serra do Sol, o Plenário do STF declarou especificamente a constitucionalidade da demarcação contínua da Terra Indígena e de seu respectivo procedimento administrativo-demarcatório, desde que observadas 19 condições ou salvaguardas institucionais para conferir maior teor de operacionalidade ao acórdão. Tal decisão não tem efeito vinculante, segundo esclareceu.
“Observo, portanto, que o acórdão invocado nas razões desta Reclamação apreciou, especificamente, o procedimento de demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, não podendo, por isso mesmo, ter sua autoridade afrontada por atos e decisões que digam respeito a qualquer outra área indígena demarcada, como é o caso narrado nos autos. Isso porque não houve no acórdão que se alega descumprido o expresso estabelecimento de enunciado vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário, atributo próprio dos procedimentos de controle abstrato de constitucionalidade das normas, bem como das súmulas vinculantes”, concluiu o relator. (Leia a íntegra aqui).
Assim, a ação da AGU ao tentar reverter o já arquivado processo do STF com a publicação de uma Portaria que, por força, obriga todos os Advogados da União a seguir as instruções, transparece a saliência de um Estado democrático de direito sendo transformado em Estado de Exceção, porém, sem o devido decreto presidencial previsto no artigo 136 da CF.
O que ocorre com o Brasil neste momento? Já ouvimos argumentos de que o Brasil precisa crescer economicamente e, por isso, necessita de desenvolvimento: hidrelétricas, rodovias, ferrovias, linhas de transmissão. O incômodo declarado pelo Governo Federal, por meio da imprensa, é a presença indígena nos locais de obras do PAC e PAC2, apontando as Terras Indígenas, como a Funai, alvos de tentativas de aceleração do processo de licenciamento de obras.
Os primeiros ataques foram as Portarias Interministeriais 420 a 424, que estabelecem prazos para a Funai se posicionar frente aos Estudos de Impactos, sendo automaticamente aprovados, caso a Funai não responda no prazo. Mas ninguém lembrou que a Funai possui apenas 16 servidores assoberbados de processos para trabalhar em todo Brasil com licenciamentos de todas as obras de significativo impacto, quando precisaria de 350, no mínimo para equiparar-se ao Ibama.
Agora, com esta Portaria 303 da AGU, ficou estabelecido mais um ponto delicado para os indígenas. A AGU passa por cima de muitos estudos antropológicos, complexidades acadêmicas, e define o que é “usufruto” indígena de suas terras.
A quem interessa esta Portaria? Foi feita as pressas? Somente os meandros do Governo Federal pode responder. Mas por ora, leiamos o texto na íntegra e percebamos já a falta de atenção ao texto publicado: o caput fala de Petição 3.388-Roraima enquanto o Artigo 1° fala de Petição 3.888-Roraima. Cuidado!
Enviada por Pablo Camargo.
AGU e Portaria 303: Estamos vivendo Estado de Exceção no Brasil Indígena?