“Eu já sei que vou morrer. Sou a bola da vez. Mas não quero ir embora daqui”, disse o pescador Alexandre Anderson na sede da Associação Homens do Mar (Ahomar), uma casa simples na areia da Praia de Mauá, em Magé, no extremo norte da Baía de Guanabara. Ele preside o grupo que teve dois líderes assassinados há duas semanas. Outros dois foram executados em 2009 e 2010.
A reportagem é de Felipe Werneck e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 08-07-2012.
Enquanto Anderson conversa com o repórter, dois PMs ficam à espreita do lado de fora. O pescador vive sob escolta desde setembro de 2010. Ele foi incluído no Programa Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH). Mas não se sente protegido. “Recebo ameaças até pelo rádio da polícia.”
Segundo Anderson, a assistência social e o colete à prova de balas prometidos pelo governo federal desde 2009 ainda não chegaram. Ele está impedido de pescar, porque os PMs que o acompanham não têm autorização para trabalhar no mar. Anderson tem dois filhos, que moram afastados e não podem visitá-lo.
A associação luta contra a instalação de gasodutos e áreas industriais na baía. “Estão sitiando a baía.” Para ele, o pano de fundo das mortes é o loteamento com investimentos bilionários. “Sabemos quem são e de onde estão vindo. São pessoas que ganham muito dinheiro com esse processo de industrialização, que trabalham na segurança de instalações e fornecem serviços como água e embarcações de apoio”, afirmou o pescador.
Segundo ele, grupos armados dominam, além da segurança, o fornecimento de água e material de construção, além do transporte marítimo. “Estão interessados nos empreendimentos porque vão ganhar muita grana. Não querem a gente na água. Estamos sendo removidos. Os crimes são terceirizados.”
Após as mortes, a Anistia Internacional divulgou uma “ação urgente” pedindo que sejam encaminhados apelos para a Secretaria de Segurança (Seseg) e para a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, instando as autoridades a proporcionar proteção completa à família de Anderson, além de investigar as ameaças e os quatro homicídios.
A Seseg alegou ter requisitado à PM no dia 28 a manutenção da escolta do pescador. “Cabe ressaltar que a escolta foi uma iniciativa da secretaria, visto que o PPDDH ainda não está em pleno funcionamento”, disse.
“De fato existe um conflito ambiental permanente em relação à pesca artesanal”, diz o procurador da República Lauro Coelho. No entanto, ele não tem elementos para afirmar se existe uma relação direta entre os homicídios e o ativismo da Ahomar.
Milícias
Presidente da comissão de direitos humanos da Assembleia Legislativa do Rio, o deputado Marcelo Freixo (PSOL), que presidiu a CPI das Milícias, havia pedido ao secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, mais proteção para Anderson e outros líderes. “Não foi por falta de aviso às autoridades.”
Candidato a prefeito do Rio, Freixo afirmou ao Estado acreditar no envolvimento de milicianos. “São crimes encomendados. Cabe à investigação apontar os autores.” O titular da Delegacia de Homicídios, Rivaldo Barbosa, disse que a investigação corre sob sigilo. “Mas há conexão entre as duas mortes e já temos um rumo.
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