Para debater desigualdade racial, ONU institui 2011 como ano dos afrodescendentes

Por Desirée Luíse, do Aprendiz

Afim de combater o racismo e as desigualdades econômicas e sociais dos negros, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu 2011 como o Ano Internacional dos Afrodescendentes. Eles estão entre os que mais sofrem com discriminação e dificuldade de acesso a serviços básicos,
como educação, segundo o órgão.

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), lançou, no final do ano passado, a campanha “Por uma infância sem racismo”.

A responsável pela campanha e pelo programa de proteção à infância do Unicef, Helena Oliveira, destaca que existem dois níveis de discriminação racial. “O primeiro é aquele conhecido pelos números. Os dados mostram a disparidade no acesso às políticas publicas. Nesse sentido, o negro acaba com menos direitos do que o branco”, diz.

A taxa de analfabetismo entre a população branca de 15 anos ou mais é de 6,1%, enquanto que para os negros e pardos é de 14,1 % – diferença de 131,1%. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e constam no 4º Relatório Nacional sobre os
Direitos Humanos no Brasil, lançado em dezembro no último ano.

Entre os que estudaram, considerando a população com 25 anos ou mais, a média de escolaridade da população negra e parda é de 5,8 anos, contra 7,8 anos para a população branca.

“Um segundo nível de discriminação é o do cotidiano, que é mais simbólico. Quando uma criança escuta um comentário racista no espaço escolar, o que foi dito passa a compor a formação dela. Isso pode causar efeitos danosos”, completa Helena.

A campanha do Unicef tem o objetivo de mobilizar a sociedade brasileira para assegurar a igualdade étnico-racial desde a infância. “Quando os pais e professores promovem a interação e o conhecimento sobre o diverso, estão incentivando à igualdade”, ressalta. “A criança
que pode estar em diferentes espaços cresce aprendendo a respeitar o outro.”

Pior entre mulheres

“As discriminações raciais somadas às de gênero são eixos estruturantes das desigualdades sociais no país e América Latina”, afirma a gerente de programas da ONU Mulheres Brasil e Cone Sul, Júnia Puglia. “As mulheres negras sofrem com a dupla desigualdade.”

Segundo a análise de Júnia, o papel tradicional da mulher na sociedade e a forma como os negros foram inseridos no Brasil colocam barreiras para que as negras aproveitem oportunidades educacionais e no mercado de trabalho.

Os dados da Relação Anual de Informação Social (Rais), órgão do Ministério do Trabalho, revelam que as mulheres negras recebem menos que a metade do salário dos homens brancos em trabalhos formais.

“Uma das piores formas de inserção é o trabalho doméstico remunerado, por meio do qual as mulheres negras mais participam das atividades econômicas do país. Este tipo de trabalho tem um percentual de formalização muito baixo”, lembra Júnia.

Solução

Para garantir equidade racial é necessário investir em ações inclusivas, de acordo com a ONU. “Quando uma parcela da população não está matriculada na escola, as estratégias para buscá-la deverão ser diferentes. São crianças de comunidades quilombolas e indígenas, para
as quais a escola não chega”, exemplifica Helena.

Na opinião de Júnia, os debates sobre igualdade racial e de gênero tem avançado, embora haja reações contrárias à inclusão. “Há 15 anos não poderíamos vislumbrar esse cenário institucional, mas ainda tem muito trabalho a ser feito, porque é preciso desconstruir o racismo e o sexismo”, conclui.

Mais da metade de população brasileira tem ascendência africana. De acordo com dados do IBGE de 2009, 51,1% dos brasileiros se reconhecem como pretos ou pardos.

Com a segunda maior população negra do planeta (e primeira fora do continente africano), a missão do Brasil no ano temático da ONU é “chamar atenção para as persistentes desigualdades que ainda afetam esta parte importante da população brasileira”, segundo um comunicado da instituição.

(Envolverde/Aprendiz)

Enviada Por Edmilson Pinheiro.

Comments (1)

  1. Praticado pelas estruturas públicas e privadas do país, o racismo institucional é o responsável pelo tratamento diferenciado entre negros e brancos em políticas públicas como a de saúde, educação e trabalho, imprescindíveis para a produção da qualidade de vida de populações. Um bom exemplo desta institucionalização foi a de imigração, que beneficiou a chegada de grupos estrangeiros não negros no país sem dar o mesmo auxílio àqueles que aqui estavam 300 anos antes. Desta forma, a população negra está submetida a desvantagens cumulativas tanto sócio-econômicas como biológicas, que, juntas, concretizam uma série de agravos à saúde. Em razão disso, a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra do Ministério da Saúde não tem obtido o desfecho esperado. O Pacto pela Saúde, que compreende o pacto pela vida, em defesa do SUS e de Gestão é um conjunto de reformas institucionais pactuado entre as três esferas de gestão, (União, estados e municípios) com o objetivo de promover inovações nos processos e instrumentos de gestão do sistema. Sua implementação se dá por meio da adesão de municípios, estados e União ao Termo de Compromisso de Gestão (TCG), que, renovado anualmente, estabelece metas e compromissos para cada ente da federação. Seria o caso, incluir entre os seus eixos a responsabilização sanitária com a população negra pois já é reconhecida por este ministério suas especificidades. Isso seria a forma de garantir ações de equidade para a Saúde da População Negra. Outra iniciativa importante e ainda por implementar é a implantação do quesito cor em todos os registros de saúde. Sua ausência/negligência não permite estatísticas confiáveis ou garantidoras de políticas mais focadas na realidade epidemiológica que dê conta do cuidado e prevenção que atendam de forma resolutiva mais de 51% da população brasileira. Sua inclusão seria também um mobilizador de ações afirmativas em saúde da população negra, pois assinalaria como adoece e morre esta parcela populacional. Apesar da inclusão da Anemia Falciforme, o Pacto pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, precisa garantir ações relacionadas à população negra e ações específicas com relação à mortalidade infantil de crianças negras. Entre os filhos de mulheres brancas, morrem 22,9 bebês a cada mil; o índice aumenta para 33,7 em relação a mães negras e pardas. Os filhos de mulheres negras e pardas têm 47% mais chances de morrer do que as crianças de mulheres brancas, segundo o demógrafo Celso Cardoso Simões, pesquisador do IBGE. Mesmo com a constatação de tamanha vulnerabilidade desta parcela da população, as ações em Saúde da População Negra foram retiradas do Plano Plurianual (PPA) 2008-2011 do MS. Nos oito anos do governo democrático e popular do ex-presidente Lula, seus gestores ainda não conseguiram romper com o racismo institucional.

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