Segunda maior terra indígena do país, a Vale do Javari, no Amazonas, teve nos últimos 11 anos uma morte de índio a cada 12 dias, segundo levantamento da ONG Centro de Trabalho Indigenista. A reportagem é de Felipe Bächtold e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 16-01-2011.
O total de mortes no período soma 325, o equivalente a 8% da população da terra indígena, afirma a entidade.
Com área equivalente ao dobro do Estado do Rio de Janeiro, a Vale do Javari, na fronteira com o Peru, reúne uma das maiores concentrações de índios isolados do mundo. A população é estimada em 4.000.
Um dos povos que habitam a terra, o canamari, perdeu 16% de seus habitantes, diz a ONG. A maior parte dos mortos (64%) tem até 10 anos – são sobretudo bebês.
As principais causas são hepatite, pneumonia e doenças trazidas pelo contato com populações de fora da terra indígena. Também há relatos de alto índice de suicídios.
A ONG atribui a situação à má gestão de recursos por parte da Funasa (Fundação Nacional de Saúde). A responsabilidade sobre a saúde dos índios passou neste ano da Funasa para secretaria do governo federal ligada ao Ministério da Saúde.
Uma das dificuldades é a falta de pistas de pouso para aviões na região, uma das mais inacessíveis do país e rota do tráfico de drogas.
Para a coordenadora do Centro de Trabalho Indigenista, Maria Elisa Ladeira, a Vale do Javari precisa, por suas características, de uma estratégia diferente das demais terras indígenas.
O pico de mortes ocorreu em 2007, com 46 casos. A ONG diz que termos de ajustamento de conduta foram firmados na época pelo Ministério Público com os órgãos envolvidos, mas que não houve progresso.
Comparando com média de mortalidade da população brasileira apontada pelo IBGE, o índice de mortalidade indígena da terra Vale do Javari é 18% maior.
OUTRO LADO
A recém-criada Secretaria da Saúde Indígena, do Ministério da Saúde, afirma que o Vale do Javari é prioritário nas ações da pasta.
O secretário Antônio Alves de Souza diz que os problemas no local, como surtos de hepatite, já são conhecidos. Ele também menciona as dificuldades de transporte. “Há locais que se gasta mais de dez dias para chegar”. Segundo o secretário, o ministério prepara a contratação de profissionais e a compra de equipamentos, como barcos.
Uma equipe da secretaria já foi à terra indígena por 15 dias para fazer um “diagnóstico” e outras duas serão enviadas. O plano, afirma, é “reestruturar” as ações de assistência na área.
A Funai (Fundação Nacional do Índio) também fala em dificuldades por causa das grandes distâncias da terra. A fundação cita que as longas viagens de barco comprometem a remoção de doentes. Afirma, no entanto, que promoveu nos últimos dois meses ações de atendimento emergenciais. A Funasa não se manifestou.
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