Por Thalif Deen, da IPS
Nova York, Estados Unidos, 3/1/2011 – No final de 2010, os Estados Unidos e a Organização das Nações Unidas se voltaram para um dos setores mais esquecidos do mundo, os povos indígenas. No início deste ano, começa o trabalho de preparação da primeira Conferência Mundial sobre Povos Indígenas, que acontecerá em 2014, de acordo com a resolução adotada por unanimidade na semana retrasada pela Assembleia Geral da ONU, formada por 192 membros.
As tarefas prévias ao encontro, que durarão três anos, incluem a redação de uma elaborada proposta de Plano de Ação. O principal objetivo é proteger os esquecidos direitos das comunidades aborígines e preservar suas culturas, que desaparecem rapidamente. Há mais de 370 milhões de indígenas, que representam mais de 5% da população mundial e cerca de 15% dos pobres no mundo, segundo as Nações Unidas.
Em meados de dezembro, os Estados Unidos avançaram na matéria quando o presidente Barack Obama anunciou na Conferência de Nações Tribais, realizada na Casa Branca, que reconhece a Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas, adotada pela Assembleia Geral em setembro de 2007. O anúncio foi feito durante uma reunião de Obama com líderes das 565 tribos reconhecidas desse país.
Austrália, Canadá, Estados Unidos e Nova Zelândia são os únicos que votaram contra a Declaração. Este documento estabelece direitos coletivos e individuais sobre os povos indígenas, bem como sobre seu direito a cultura, identidade, língua, emprego, saúde e educação. “Os indígenas devem participar dos processos internacionais que possam afetá-los, mas seus problemas não serão solucionados em conferências”, disse Christina Chauvenet, do Survival International USA (Siusa), ao ser consultada pela IPS sobre o papel que as comunidades aborígines desempenharão no encontro de 2014.
O futuro dos povos indígenas estará assegurado quando os governos reconhecerem seu direito à terra e que este deve ser protegido, acrescentou Christina. “O problema é que acatem seus compromissos”, prosseguiu, referindo-se ao apoio universal à Declaração da ONU. “Só poderá ser cumprido se muitas pessoas apoiarem sua luta e fizerem os governos compreenderem que são necessárias ações reais, não palavras nem resoluções de conferências”, ressaltou.
O encontro previsto para 2014 é significativo por reconhecer a necessidade de atender os direitos dos indígenas em termos de padrões internacionais, disse à IPS a advogada e professora de direito Sarah H. Paoletti. “Seu verdadeiro significado será medido pelo resultado e pelas medidas concretas que forem tomadas para garantir que os direitos dos indígenas são atendidos de forma inclusiva e valiosa”, destacou Sarah, também diretora da Clinica Legal Transnacional, da Faculdade de Direito da Universidade da Pennsylvania.
As comunidades aborígines devem desempenhar um papel principal na preparação da conferência para que sua opinião seja incluída no planejamento e nos resultados buscados, afirmou a advogada, para quem é importante reconhecer que os indígenas não são uma unidade. “Não é uma população monolítica e não pode ser tratada como tal”, acrescentou Sarah, que também coordena o Projeto Universal de Revisão Periódica, da Rede de Direitos Humanos dos Estados Unidos. É necessário gerar os espaços para promover uma participação transparente e inclusiva das comunidades indígenas na fase preparatória, ressaltou.
Nos Estados Unidos, um indígena tem 62% mais possibilidades de suicidar-se do que qualquer outra pessoa e 600 vezes mais chances de contrair tuberculose, segundo dados das Nações Unidas. A decisão de Obama de aprovar a Declaração da ONU marca uma mudança importante em relação a posições anteriores de Washington e em sua vontade de colaborar com a comunidade internacional na defesa dos direitos humanos, disse Sarah.
“O que importa são as ações que o governo tomar para melhorar a situação dos acordos contidos na Declaração para os indígenas deste país e do mundo”, disse o próprio Obama. Washington somente poderá reclamar autoridade moral em matéria de direitos humanos se, primeiro, adotar medidas concretas e afirmativas para melhorar a situação interna, afirmou, por sua vez, Sarah.
A Declaração da ONU é um padrão de referência para avaliar o tratamento dado às comunidades indígenas e um instrumento importante para erradicar o abuso, afirmou Tess Thackara, coordenadora do Siusa. É um documento muito valioso, mas não é um tratado vinculante, recordou. O Siusa lançou uma campanha para que todos os países ratifiquem o Convênio 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, da Organização Internacional do Trabalho, que é obrigatório. Apenas 22 Estados o ratificaram.
ONU e EUA reconhecem indígenas no papel