UNIFEM – Entrevista com Sandra Maria da Silva, quilombola de Carrapatos da Tabatinga, MG

 A entrevista desta edição do informativo Gênero, Raça e Etnia é com a quilombola (afrorural) brasileira Sandra Maria da Silva, moradora da comunidade Carrapatos da Tabatinga, no município de Bom Despacho/MG. Ela nasceu na cidade de Juiz de Fora e, ainda criança, migrou para região de Bonsucesso após sua família perder o direito ao território. Incentivada pela militância da mãe, desde muito cedo Sandra compreendeu a situação de violação de direitos nas comunidades remanescentes de quilombos.

Ela saiu do quilombo e foi para a cidade, trabalhou em bufês como chefe de cozinha para pagar seus estudos e formou-se em Contabilidade. Ao retornar ao quilombo, deparou-se com a vulnerabilidade e a pobreza da população. A partir deste momento, Sandra intensificou sua militância para a conquista do direito ao território e a formulação de políticas públicas para as comunidades quilombolas. Participou da associação de moradores da comunidade de Carrapatos e integrou a Comissão Estadual da Mulher de Minas Gerais.

O tempo ajudou Sandra a fortalecer sua ligação com a cultura dos seus antepassados e sua auto-estima quilombola que até hoje lhe dão forças para continuar a busca por uma sociedade livre do racismo. Em 2004, durante o 1º Encontro de Comunidades Quilombola de Minas Gerais, Sandra percebeu que não estava sozinha na luta. Conheceu pessoas de outras comunidades quilombolas que se uniram e fundaram a N´golo – Federação Quilombola do Estado de Minas Gerais, a qual hoje preside.

Aos 51 anos, a trajetória política de Sandra da Silva fala por si. Confira nesta entrevista a luta desta quilombola brasileira em defesa dos direitos dos povos remanescentes de quilombos e sua busca por respeito para as comunidades, regularização dos territórios e promoção de políticas públicas inclusivas.

Qual é a realidade das mulheres nas comunidades quilombolas brasileiras?

As mulheres são maioria nas comunidades quilombolas. Elas têm pouco estudo, as que conseguiram, saíram da comunidade e foram estudar na cidade. Eu consegui porque fui pra cidade, trabalhava o dia todo e estudava à noite. Os homens saem dos quilombos para ir pra São Paulo em busca de emprego. Vão e não voltam. Então, as mulheres têm uma participação mais intensa nas comunidades. São elas que vão pro enfretamento da luta diária. São elas que plantam, cuidam dos filhos, trabalham e vão em busca dos seus direitos.

Como você avalia os avanços das políticas de atendimento às comunidades quilombolas. Em que pontos considera que devem melhorar?

As políticas são excelentes, mas seriam melhores se chegassem. Porque as políticas não chegam na ponta, no quilombo. Faltam conscientização e  capacitação dos gestores públicos para que as políticas de governo cheguem às comunidades.

Também tem a questão do racismo institucional que impera na maioria dos municípios. Então é preciso ter uma capacitação e uma conversa com os gestores públicos municipais. Nos órgãos estaduais já existem pessoas preparadas pra trabalhar com os quilombolas, mas no município isso não acontece. Eles estão totalmente despreparados.

Na sua opinião, quais os motivos da dificuldade do  reconhecimento das terras para as comunidades quilombolas?

O reconhecimento do território é difícil por causa dos ruralistas e também do racismo.

Eles querem nossas terras para expandir o agronegócio. E também por causa dos latifundiários que quanto mais têm, mais querem. Eles chegaram lá depois de nós.

Foram chegando e cercando a comunidade. Mas como são brancos e têm dinheiro, eles têm os documentos que comprovam que puderam comprar a terra, nós não.

Nosso documento é nossa história, onde nossos antepassados faziam os rituais, onde construímos o cemitério, onde lavávamos roupa, nosso documento é esse. Mas nós acreditamos que tendo o título da terra, vão haver ter menos conflitos. Menos mortes que ainda acontecem nas comunidades.

Pra você o que representa a união das comunidades quilombolas?

Essa união nos deu força e nós conseguimos muitas coisas, muitos benefícios em prol das comunidades. Não tínhamos água, luz, saneamento básico, saúde, educação.

Com essa união e a criação da Federação fomos buscando [esses direitos e serviços].

Hoje a maioria das comunidades tem luz elétrica. Algumas comunidades já têm postos de saúde. Antes as crianças andavam até três quilômetros pra poder estudar. A gente conseguiu implantar as escolas nas comunidades. Ainda falta muito, mas já conseguimos bastante. Nós fazemos mobilização pra poder conseguir o que a comunidade precisa.

Qual objetivo do seu trabalho?

Meu objetivo é que a gente consiga a regularização dos territórios das comunidades quilombolas, para que minha filha e meus netos não venham a passar o que nós estamos passando agora. Saúde e educação são nossos direitos. Nós sempre fomos excluídos. Estamos nessa luta para que nossos filhos e netos não passem pela mesma humilhação. Estamos nessa luta para que nós possamos deixar tudo regularizado para que eles tenham saúde e educação, todos os direitos, iguais aos outros. A nossa luta não é fácil, mas não vamos desistir!

http://www.unifem.org.br/sites/700/710/00001486.pdf

Comments (4)

  1. ESTAMOS JUNTAS SANDRA. VAMOS ELEGER VOCÊ PARA MELHOR NOS REPRESENTAR E DEFENDER NOSSOS DIREITOS.

  2. A N’Golo tem utilizado o espaço físico do CEDEFES para organização de suas lutas. Entre em contato com a N’Golo através:
    Endereço: Rua Demétrio Ribeiro, 195, Vera Cruz, Belo Horizonte/ MG Cep: 30.285-680
    Telefone: (31) 3224-7659/ (31) 3047-7801/ (31) 9312-9940
    Email: [email protected]

  3. Como entro em contato com a liderança da comunidade quilombo dos carrapatos? Telefone, mail, nome, etc.
    Obrigada
    Conceição

  4. Parabenizo ao imformativo,GÊNERO,RAÇA E ETNIA,pela entrevista com a companheira e guerreira de várias conferências plenárias Sandra Maria,à qual como nós indígenas urbanos,lutamos pelos mesmos direitos de todos os povos tradicionais brasileiros,para
    que,as políticas públicas saem do papel e contemplem na prática
    nossas comunidades.Saudações:Edson Adolfo Karcará-Urú/Arachás
    Cacique Presidente da Assoc.Indígena “ANDAIA”da região de Araxá
    MG,s(34)3662-1528 -9108-9958 [email protected]

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