Tania Pacheco – Combate Racismo Ambiental
O Conselho Local de Saúde Indígena (CLSI) do Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe do Polo Base de Pau Brasil, sul da Bahia, protocolou solicitação em caráter de urgência junto ao MPF e à 6ª Câmara de Coordenação e Revisão (4ª CCR), pedindo providências em relação à questão “Saúde Indígena x Sesai”. Anexo, o CLSI encaminha importante relatório consolidado, no qual denuncia irregularidades e carências no atendimento à saúde, que acontecem enquanto a Secretaria gasta apenas 7,5% dos recursos para sua estruturação: “é inadmissível que 92,5% destinados à nossa saúde voltem aos cofres da União”.
Segundo o documento, isso está levando a um “caos proposital”, do qual querem tirar proveito “hienas que riem da desgraça alheia e brincam com a vida de milhares de pessoas”, insistindo na criação de um Instituto Nacional de Saúde Indígena (INSI). Quanto a isso, o Conselho rejeita a “terceirização da nossa saúde” e a proposta do INSI: “queremos o fortalecimento da Secretaria Especial de Saúde Indígena e seu pleno funcionamento, fruto de uma vitória significativa e importante de todas nossas comunidades indígenas do Brasil’. Detalhado, o relatório inclui até mesmo denúncias de racismo por parte de médicos, postos e hospitais da região.
Os documentos foram construídos durante oficina sobre controle social realizada na Aldeia Baheta, no município de Itajú do Colônia. O Ofício 002 CLSI 2015 está endereçado aos procuradores Gabriel Pimenta Alves, Tiago Modeste Rabelo e Cristina Nascimento de Melo, da Regional do MPF em Ilheus-BA, com cópia para a coordenadora da 6ª Câmara, Deborah Macedo Duprat de Brito Pereira, e a vice-procuradora geral da República, Ela Wiecko Volkmerde Castilho. A íntegra da solicitação segue abaixo, seguida do Relatório.
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Pau-Brasil (BA), 21 de maio de 2015
Senhores Procuradores e Senhoras Procuradoras,
Ao cumprimentá-los cordialmente, aproveitamos o ensejo para expressar os nossos sinceros votos de estima.
O Conselho Local de Saúde Indígena do Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe do Polo Base de Pau Brasil-Ba, na qualidade de conselho de controle social das políticas públicas de saúde indígena voltada para o Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe em conformidade ao que estabelece o estatuto social do referido conselho, especialmente no que tange a planejar e fiscalizar junto a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e outros órgão, o repasse de verbas, acompanhar, denunciar e reivindicar as atividades de saúde desenvolvida no âmbito das comunidades indígena do Pólo Base de Pau Brasil.
O Conselho Local de Saúde Indígena do Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe do Pólo Base de Pau Brasil (CLSI) vem por meio de esta solicitar uma reunião em Carter de URGENCIA, com vossas senhorias, Procuradores do Ministério Publico Federal, regional de Ilhéus-Ba., para tratarmos de assuntos de interesse da população indígena do Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe que se localiza nos município de Pau Brasil, Camacã e Itjau de Colônia, Estado da Bahia, No que diz respeito ao atendimento a saúde indígena por parte da SESAI. Na oportunidade queremos observa que no ano passado este conselho se reuniu com representante do MPF\ Ilheus-Ba, requerendo apoio na garantia dos nossos direitos e ate o momento não tivemos retorno das providências adotadas, e assim a situação só piorou, por este motivo gostaríamos de termos retorno o mais breve possível destas demandas pois o nosso povo esta sofrendo enquanto a SESAI devolve ao Ministério da Saúde recurso financeiro a ser gasto com a saúde dos nossos povos; e as aldeias continua assim com:
01 – A falta de água potável em algumas residências indígenas da aldeia
02 – A ausência de execução de realização dos procedimentos de exames que o SUS não cobre.
03 – A falta de estrutura do pólo base para o atendimento dos povos indígena Pataxó Hã-Hã-Hãe
03 – A falta de estrutura dos postos de saúde dentro das aldeias.
04 – A falta de estrutura para conserto das bombas, e sistema de abastecimento de água das comunidades indígenas
05 – A falta de construções de postos de saúde em algumas comunidades
06 – A falta de transporte para o atendimento a comunidade, ate mesmo em caráter de urgência e emergência.
07 – A falta de agente indígena de: saúde e de Saneamento em algumas comunidades.
08 – A falta de contratação de alguns profissionais de saúde para compor as equipes multidisciplinares de saúde indígena.
09 – Contratação demais equipe de saúde.
10 – A falta de medicamento básico na farmácia básica da SESAI.
11 – A falta de acompanhamento as programa de saúde preventiva inclusive a vacinação.
12 – A falta de atualização do cadastramento dos indígenas no sistema da SESAI.
Segue em anexo relatório consolidado da situação da saúde indígena.
Atenciosamente,
Zenólia de Souza Melo
Presidenta do CLSI\Pau Brasil-B
[Seguem assinaturas dos Conselheiros locais de saúde e de Caciques e lideranças]
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RELATÓRIO CONSOLIDADO DO CLSI PATAXÓ HÃ-HÃ-HÃE
O Conselho Local de Saúde Indígena do Povo Pataxó HãHãHãe, CLSI – Pau Brasil, em reunião dos seus conselheiros (as) no dia 18 de maio de 2015, na Aldeia Bahetá, município de Itajú do Colônia , constatou uma serie de irregularidades e demandas que vem prejudicando o atendimento adequado á saúde da nossa comunidade. Nesta oportunidade definimos por apresentar um pedido formal as autoridades responsáveis pela área de saúde e da defesa dos nossos direitos estes graves problemas neste relatório consolidado.
TRANSPORTE:
– Com as denúncias que as comunidades em 2013 fizeram sobre fraudes envolvendo a empresa San Marino Locação de Veículos e Transportes que cobrava quase R$ 13 milhões acima do valor médio de mercado à época da assinatura do contrato. Além do sobrepreço, as investigações também apontam que a locadora já tinha recebido mais de R$ 6,5 milhões além da quantia que já deveria ter recebido. A empresa e Órgão responsável pela saúde é que deveriam ser punidos, mas tem acontecido o contrário, após quase dois anos, as comunidades é que vem sofrendo com falta de transporte, transportes sucateados e o velho discurso da falta de recursos.
Com as demandas e necessidades que as comunidades Pataxó Hã-Hã-Hãe não podemos aceitar a nova forma que vem sendo gerenciada a utilização dos veículos que deveriam prestar um serviço de qualidade. Diminuição do numero de veículos para os atendimentos; Limitação de 3 mil quilômetros ao rodar; O não atendimentos por falta de plantões aos finais de semana, como se a doença tivesse dia para acontecer; Falta de carros para as equipes médicas.
ESTRUTURA:
– Existe uma demanda muito grande pelo aumento das estruturas para termos um atendimento de qualidade, mas temos vivenciado uma situação inversa: Diminuição e falta de profissionais qualificados para os atendimentos; Constantes faltas de medicamentos e matérias necessários para um bom atendimento; Reclamações de funcionários que tem utilizados recursos próprios para garantir alguns atendimentos, utilizando seus equipamentos pessoais para o trabalho, tudo isto com a desculpa de falta de recurso no Pólo Base e no DSEI. Isto não é mais possível ainda mais quando sabemos que do orçamento destinado a suade indígena no Brasil, e que a Sesai executou apenas 7.5% do orçamento de 2014 carimbado para a estruturação do setor, é inadmissível que 92,5% destinados a nossa saúde voltem aos cofres da União. Esta questão da falta de recursos não justifica mais, pois os números estão ai para denunciar o contrário, dos R$ 40 milhões destinados a Estruturação de Unidades de Saúde e Distritos Especiais de Saúde Indígena (DSEI), a Sesai gastou apenas R$ 3 milhões. O resultado não poderia ser outro, como o constatado pelo CLSI Pataxó HãHãHãe: Sem empenhar o orçamento, os DSEIs seguem sem estrutura e recursos humanos. Por sua vez, as licitações, quando realizadas, são mal conduzidas e não contemplam a demanda. Orçamento fica sem execução. Faltam medicamentos, serviços, gente para atender gente, logística, leitos, exames, formação, prevenção. Não há recursos humanos para dar conta das licitações, inclusive para qualificar o processo, e tampouco estrutura para o atendimento básico. A defasagem, como se vê, desmonta o sistema e o coloca em colapso. Outro dado preocupante e que sentimos na própria pele nas nossas aldeias e são dados do próprio governo através do balanço do Ministério do Planejamento, é possível constatar ainda que dos R$ 48 milhões destinados ao saneamento básico em aldeias, apenas R$ 1,6 milhão teve execução.
PRIVATIZAÇÃO DE NOSSA SAÚDE.
E ainda tem pessoas que querem tirar proveito desta situação de “caos proposital” da nossa saúde, são hienas que riem da desgraça alheia e brincam com a vida de milhares de pessoas. A exemplo daqueles que insistem na criação do paraestatal Instituto Nacional de Saúde Indígena (INSI). O Secretario da SESAI, Antônio Alves é um dos que insiste em nos empurrar goela a baixo a terceirização da nossa saúde com os argumentos que a Sesai não pode continuar do jeito que está. O que falta na verdade para a Sesai funcionar é gestão responsável e comprometida, planejamento qualificado e estratégico, administração licita, da de verdade autonomia para os Distritos, e a aplicação adequada e fiscalizada dos recursos destinados. NÃO QUEREMOS TERCERIZAR A NOSSA SAÚDE. NÃO ACEITAMOS O INSI, queremos o fortalecimento da Secretaria Especial de Saúde Indígena e seu pleno funcionamento, fruto de uma vitória significativa e importante de todas nossas comunidades indígenas do Brasil.
RACISMO
Aproveitamos para solicitar das autoridades apuração sobre alguns casos de racismos e preconceito contra membros da comunidade por parte de médicos da região, e também em atendimentos dos hospitais e postos médicos fora das aldeias. Ao saber que determinados pacientes são indígenas o atendimento é negligenciado e até mesmo agressões com palavras de caráter racista são feitas.
ESTRADAS VICINAIS
Em muitos casos que temos reclamado sobre o não atendimento adequado, em especial nas comunidades locais, tem sido justificada a situação de descaso e precariedade das estradas, que dificulta a locomoção dos veículos e até em alguns casos o impedimento de se chegar a determinado local, prejudicado tanto a chegada das equipes médicas e ou atendimento como o deslocamento dos pacientes para a cidade, solicitamos uma cobrança das autoridades para o devido cuidado com estas estradas, através das Prefeituras Municipais e do Governo do Estado.
ÁGUA
O nosso Povo recebeu recentemente carros pipas modernos e qualificados para o abastecimento de água em nossas comunidades, agradecemos e entendemos isto como uma vitória do Povo, em especial os lugares que sofriam bastante com a falta do valioso produto. Mas também entendemos que estes carros pipas não são a solução definitiva para este problema, continuamos exigindo que soluções mais estruturantes sejam efetivadas em nossa aldeias para se resolver de vez esta problemática de termos uma água em quantidade e de qualidade.
Estes são alguns dos desafios e das demandas que conseguimos constatar nesta nossa reunião, e sabemos que muitos deles se desdobram em outros problemas prejudicando de forma significativa a qualidade de vida de nossas comunidades. É neste sentido que pedimos o apoio das autoridades para que possamos ter este nosso direito a saúde diferenciada e qualidade, respeitada e cumprida integralmente pelos seus responsáveis.
Pau Brasil, 21 de maio de 2015.
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Documentos enviados a Combate Racismo Ambiental por Haroldo Heleno.
Destaque: Foto de Cido Costa, 2014, reproduzida da internet